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A proposta do Ministério das Minas e Energia (MME) de liderar uma reforma do setor elétrico por meio de medida provisória – que prevê isenção da conta de luz para 60 milhões de pessoas, abertura do mercado livre e revisão de subsídios -, vazada há três semanas, já corre o risco de não sair do papel.
O motivo é a articulação em curso no Congresso Nacional para derrubar os vetos do presidente Luiz Inácio Lula da Silvia aos jabutis incluídos na Lei das Eólicas Offshore, aprovada no ano passado. A proposta pode ser votada na Câmara dos Deputados ainda este mês, seguindo depois para o Senado.
Se os vetos forem derrubados, o prejuízo para os consumidores deve chegar a R$ 545 bilhões nos próximos 25 anos, com aumento de 9% na conta de luz para famílias de baixa renda, consumidores residenciais, comerciais e indústria – o equivalente à aplicação da bandeira vermelha 2 na conta de luz até 2050.
Os cálculos são da Frente Nacional dos Consumidores de Energia (FNCE) – coalizão que congrega diversas organizações de todos os segmentos de consumo de energia no Brasil, sejam eles residenciais, comerciais e industriais -, com base em estudo da consultoria PSR e números da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).
Os jabutis vetados previam a contratação compulsória de térmicas a gás inflexíveis, de pequenas centrais hidrelétricas (PCHs) e de energia eólica no Sul do País, além da prorrogação de contratação de térmicas a carvão.
Os vetos também impediram a postergação do prazo para micro e minigeração distribuída (MMGD) entrarem em operação com subsídios e a construção de uma planta de hidrogênio.
Luiz Eduardo Barata, presidente da Frente, adverte que a derrubada dos vetos vai desorganizar ainda mais o setor elétrico, sendo o efeito mais imediato a inviabilização da reforma do setor prevista pelo governo.
“A proposta do MME, alvo de muitas críticas, previa redução do custo de energia para o consumidor de menor potencial econômico, que seria bancado pelo aumento desse custo para os grandes consumidores, principalmente a indústria”, afirma Barata. “Se os vetos forem derrubados, aumentam em 9% o custo de energia por 25 anos para todos, indistintamente, acabando com as expectativas de redução na conta de luz.”
Outro efeito direto causado pela contratação compulsória de 8 GW de térmicas a gás inflexíveis e pequenas centrais hidrelétricas (PCHs) prevista nos jabutis é a ampliação dos cortes de energia renovável – o chamado curtailment, um dos problemas mais graves que vem afetando o setor.
Isso porque setor elétrico brasileiro vive uma crise causada pela sobreoferta de energia injetada na rede de transmissão por parte das usinas eólicas e solares, problema que vem crescendo de forma desproporcional nos últimos anos graças aos subsídios a essas energias renováveis.
Para evitar a sobrecarga na rede, o Operador Nacional do Sistema (ONS) faz cortes de geração em determinadas horas do dia em 1.472 usinas solares, eólicas e hidrelétricas, causando prejuízos financeiros acima de R$ 1,6 bilhão aos ativos afetados, de acordo com levantamento da consultoria Volt Robotics.
“Esses 8GW a mais de energia jogada no sistema pelas térmicas a gás e a carvão e pelas PCHs, além de 300 megawatts de eólicas do Sul, vão aumentar o problema do curtailment numa escala gigantesca”, adverte Barata.
Como consequência, estão previstos mais prejuízos bilionários na geração solar, eólica e hidrelétrica, aumento da judicialização, custos extras para os consumidores e graves problemas operacionais no sistema elétrico, além de aumento da inflação.
Sobrecusto de energia
Donato Filho, diretor geral da Volt Robotics, afirma que o grande problema dos jabutis é o sobrecusto de energia que vai causar.
“O País será obrigado a comprar uma energia que não precisa, pois há sobreoferta, cara e ainda por cima por um longo período”, adverte, referindo-se às térmicas a gás e PCHs. Os sobrecustos são estimados em R$ 22 bilhões por ano, referente ao aumento do custo tarifário.
O especialista adverte ainda para o aumento de risco de apagão. Segundo ele, com a inclusão compulsória de usinas térmicas do Norte, por exemplo, o sistema de transmissão vai ficar mais ocupado – sobrando menos espaço para escoar a energia das renováveis.
“O corte das renováveis e das hídricas, o curtailment, vai aumentar, porque o sistema vai atender a carga de forma mandatória dessas térmicas a gás”, diz. Segundo cálculos ainda superficiais, a Volts estima um aumento de pelo menos 20% dos cortes de energia pelo ONS.
Isso porque a geração renovável – que joga excesso de energia na rede – está concentrada no Nordeste. Assim, a geração fica “sobrando” nessa região, causando os cortes pelo ONS.
E no Sudeste, por sua vez, haverá uma espécie de “desbalanço de energia”, pois estava recebendo um tanto de energia outro tanto de carga. O eventual aumento do corte de energia no Nordeste tende a desequilibrar o sistema, registrando mais carga do que geração.
“Assim, o aumento do curtailment decorrente da geração das térmicas a gás pode gerar uma perda de sincronia do sistema, ou seja, um apagão”, diz Donato.
Outro aspecto do curtailment deve se agravar. Isso porque o setor trabalhava com o aumento das linhas de transmissão a partir de 2028 para reduzir os cortes do ONS.
“Os investidores dessas renováveis faziam contas para segurar as dívidas por mais dois ou três anos, pois sabiam que a oferta de linhas de transmissão ia melhorar”, diz Donato. “Com os jabutis, o problema não vai resolver, pelo contrário, vai piorar o espaço para as renováveis atuarem, matando a possibilidade de ampliar a construção de novas usinas e agravando os prejuízos das que sofrem cortes do ONS.”
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