Pacote de corte de gastos: analistas do mercado estimam efeito menor do que o projetado pelo governo

Pacote fiscal aprovado pelo Congresso Nacional sofreu alterações que desidrataram diversas medidas inicialmente propostas pelo governo. Segundo analistas, o governo não conseguirá, ou terá dificuldades, para entregar o déficit zero no próximo ano. O Ministério da Fazenda estimou nesta sexta-feira (20) que o pacote de corte de gastos proposto pelo governo, e aprovado pelo Congresso Nacional, terá um efeito de R$ 69,8 bilhões em 2025 e 2026, mas projeções de economistas do mercado financeiro apontam para um impacto bem menor.
Segundo estimativa da XP, após a “desidratação” das medidas promovida pelo Legislativo, o potencial de redução de despesas do pacote, nos próximos dois anos, será de R$ 44 bilhões.
“Adicionalmente, vemos que o provável ganho fiscal é insuficiente para garantir o atingimento das metas de resultado primário e, principalmente, a manutenção do limite de despesas do arcabouço fiscal nos próximos anos”, acrescentou a XP.
Pacote fiscal aprovado: Alívio ou pressão?
No próximo ano, o governo mira uma meta de déficit zero em suas contas, valor que consta na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). Entretanto, de acordo com as regras do arcabouço fiscal, norma para as contas públicas aprovada em 2023, há uma banda de 0,25 ponto percentual do PIB, para cima e para baixo, em torno da meta.
Com isso, o resultado pode ficar negativo em até R$ 31 bilhões. Além disso, o Supremo Tribunal Federal autorizou o abatimento, da meta fiscal, de precatórios atrasados – que estão estimados em cerca de R$ 44 bilhões. Outra regra do arcabouço é que as despesas não podem crescer, em termos reais, mais do que 2,5% ao ano.
De acordo com nota técnica da Warren Rena, o corte de despesa trazido pelo pacote será de R$ 19,2 bilhões e de R$ 26,2 bilhões para 2025 e 2026, ou seja, um total de R$ 45,4 bilhões.
“Com isso, no próximo ano, o déficit de 2025 será de R$ 75,1 bilhões, compatível com o cumprimento da meta fiscal, considerando-se o intervalo inferior da meta, déficit de R$ 31 bilhões, e os precatórios excedentes não computados, R$ 44,1 bilhões”, diz a Warren Rena.
Para a instituição, porém, o governo terá de efetuar um bloqueio de R$ 35,4 bilhões nas despesas dos ministérios, em relação ao nível de gastos livres que consta na proposta de orçamento, para atingir o déficit fiscal zero em 2025, algo considerado “politicamente desafiador”.
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Desidratações
O pacote fiscal aprovado pelo Congresso Nacional sofreu alterações significativas que desidrataram diversas medidas inicialmente propostas pelo governo.
No caso do Benefício de Prestação Continuada (BPC), o Congresso flexibilizou as regras inicialmente propostas, permitindo que mais pessoas continuem elegíveis ao benefício. A proposta original restringia o conceito de família e considerava a renda de outros idosos na composição do cálculo. Contudo, o texto final excluiu essa previsão, permitindo que duas pessoas da mesma família possam receber o benefício. Além disso, a definição de pessoa com deficiência manteve-se mais ampla, contrariando a intenção de endurecimento do governo.
A questão dos supersalários no funcionalismo público também sofreu ajustes. Enquanto a proposta original previa que exceções ao teto salarial fossem definidas por lei complementar, o texto final permite que sejam estabelecidas por lei comum, mais fácil de ser aprovada. Essa mudança mantém, na prática, a possibilidade de servidores públicos continuarem recebendo benefícios que ultrapassam o teto, até que uma legislação específica seja sancionada.
Outro ponto que foi desidratado foi a implementação obrigatória do cadastro biométrico para a manutenção de benefícios sociais. Embora a proposta ampliasse a exigência para programas como o Bolsa Família, o Congresso ampliou os prazos para regularização dos cadastros e criou exceções para áreas remotas e pessoas em condições de vulnerabilidade. Essa flexibilização pode retardar os resultados esperados com a medida.
A recriação do seguro obrigatório DPVAT, renomeado SPVAT, foi completamente derrubada pelo Congresso. Apesar de ser uma das propostas do governo, a resistência de governos estaduais em realizar a cobrança levou à extinção da medida. Essa alteração elimina uma potencial fonte de receita e foi alvo de intenso debate durante a tramitação.
Por fim, a desvinculação de receitas, que permitiria maior liberdade no uso de dividendos, royalties e verbas de concessões, foi aprovada, mas com ressalvas que limitam o impacto pretendido pelo governo. Além disso, a manutenção de regras que restringem o crescimento de despesas obrigatórias reflete o esforço do Congresso em equilibrar o controle fiscal sem prejudicar os interesses de grupos específicos. As desidratações indicam que, apesar de o pacote ter avançado, ele chega ao final com menos força do que o governo esperava.
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