Nada se perde, tudo se transforma

Siga @radiopiranhas

Encontrar soluções criativas e conscientes para diminuir o desperdício de alimentos é uma das maneiras de reduzir o lixo orgânico, além de trazer vários benefícios nutricionais. Dados divulgados pela Organização das Nações Unidas (ONU), colocam o Brasil em 6o lugar no ranking mundial de países que mais desperdiçam alimentos, com 20 milhões de toneladas de comida jogada no lixo.

Esse cenário contrasta fortemente com a realidade de uma grande parcela da populaçao que enfrenta a fome diariamente. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), cerca de 64 milhões de brasileiros vivem em situação de insegurança alimentar, com acesso restrito a uma alimentação adequada.

Casca de banana em bolos ou doces, talos de couve refogados, sementes de abóbora assadas. As possibilidades são muitas. Para entender melhor como incluir esses ingredientes na rotina alimentar, a reportagem do Jornal A União conversou com a nutricionista Alba Inêz, que traz orientações sobre o tema.

Segundo Alba, as cascas de frutas e legumes costumam oferecer alguns benefícios nutricionais maiores que as polpas desses alimentos, como o significativo teor das fibras, vitaminas e minerais. “Isso ajuda diretamente no funcionamento do intestino e na imunidade”, enfatiza. Além disso, as cascas são ricas em antioxidantes e fitoquímicos que podem contribuir para a saúde cardiovascular e a prevenção de doenças.

A nutricionista reconhece que muitas pessoas não têm o hábito de utilizar integralmente frutas e hortaliças, mas reforça a importância de conhecer os nutrientes presentes nessas partes, geralmente descartadas. “Fazer o aproveitamento integral contribui para a redução do desperdício e o impacto ambiental” explica a especialista. Entre as cascas mais versáteis, ela cita as de laranja, banana, abóbora e batata. “Um bom exemplo seria com o bolo de laranja que pode ser feito utilizando a casca também”.

A nutricionista complementa chamando atenção para os impactos ambientais positivos dessa prática, tendo em vista que, ao evitar o desperdício, reduz-se a produção de resíduos, diminuindo os recursos naturais utilizados na produção e transporte dos alimentos.

A prática 

Um exemplo de quem colocou essas ideias em prática é o de Criselda Maria, agricultora da Zona Rural de Pitimbu. Ela conta que iniciou o reaproveitamento alimentar durante a pandemia da Covid-19, quando, por causa do isolamento social, ficou sem poder vender sua mercadoria. “Comecei a assistir a vídeos de receitas na internet e vi que dava para aproveitar, de outra forma, os produtos que estavam sobrando”, lembra.

A partir daí, Criselda passou a produzir bolos com casca de banana, salgados com recheios feitos de carne de caju e jaca, além de chips de macaxeira e inhame. Com o apoio das redes sociais, ela divulgou suas criações e conquistou novos clientes, conseguindo comercializar seus produtos mesmo em tempos difíceis.

Para a agricultora, a banana e a macaxeira são os ingredientes mais utilizados. “A macaxeira é super versátil, com ela, consigo preparar diversas massas e ainda combinar com outros sabores”. Quando Criselda coloca a fruta e o tubérculo juntos, por exemplo, consegue fazer uma massa encorpada, ideal para bolos e salgados. A macaxeira, em suas receitas, dá a estrutura necessária, principalmente porque não é utilizado glúten nas produções. “Por isso, a gente precisa ser criativo e encontrar combinações que funcionem bem”.

A dica da cozinheira é reaproveitar os alimentos e entender que eles são uma matéria-prima. A casca da banana, por exemplo, após ser devidamente higienizada e bem temperada, pode se tornar uma carne desfiada, para quem é vegano ou não. “Então, para quem começar com essa prática, a ideia é colocar a mão na massa, testar e aprender para chegar no sabor que você quer”, explica.

 “A casca da banana é rica em fibras e proteínas que ajudam o intestino, fortalecem a saúde e equilibram as bactérias do nosso corpo. É um alimento funcional, e muita gente nem imagina”, informa a nutricionista Alba Inêz. Quanto à higienização e ao preparo das cascas de frutas e vegetais, ela explica que é importante fazer antes de consumi-las. Para frutas e legumes com casca que não serão cozidas, a nutricionista recomenda higienizar com hipoclorito de sódio (água sanitária) diluído em água na proporção de uma colher de sopa para um litro de água, por 10 minutos e em seguida enxaguar bem. “Ao comprar a água sanitária é importante também observar o rótulo e conferir se, a que você está comprando, também pode ser utilizada para higienizar alimentos”.

Outra experiência marcante para Criselda foi a produção de farinha com banana verde. Durante a pandemia, a venda da banana não estava boa e começou a sobrar. Uma cliente sugeriu fazer farinha, mas ela não sabia como. Conta que no início errou bastante. “Tentei até assar no forno, mas depois aprendi o jeito certo: secar ao sol por três dias, depois triturar. O resultado é uma farinha cheia de benefícios”.

Com o tempo, percebeu que a mudança que começou na pandemia, agregou valores em sua vida. “Hoje, nossa associação de agricultores trabalha com o foco em combater o desperdício e transformar o que muitos descartariam em algo útil e nutritivo”, conclui a agricultora.

Nas cozinhas comunitárias de JP, o lema é aproveitamento

As cozinhas comunitárias da Prefeitura de João Pessoa, geridas pela Secretaria de Desenvolvimento Social (Sedes), também são exemplos, nas práticas sustentáveis, para minimizar o desperdício de alimentos.

Os equipamentos do município contam com doações provenientes de agricultores locais. Lá, os alimentos são aproveitados integralmente, gerando a produção de brigadeiros, pães e bolo com a casca de banana, doce da casca da laranja, compota de mamão, além da geleia de frutas.

A capital pessoense conta com seis cozinhas comunitárias, localizadas nos bairros Gervásio Maia, Bairro dos Novais, Taipa, Timbó, Bela Vista e Jardim Veneza. Essas unidades atendem, gratuitamente, famílias em situação de vulnerabilidade social, oferecendo almoço e jantar.

Cada cozinha tem capacidade para fornecer até 600 refeições por dia, totalizando aproximadamente 1.700 atendimentos diários. O acesso é realizado por meio de cadastro nas unidades ou nos Centros de Referência de Assistência Social (CRAS), com visitas sociais para confirmação da vulnerabilidade.

Segundo dados informados por representantes da Sedes, em 2024, as cozinhas comunitárias distribuíram 737.659 refeições, ou seja, cerca de 61.470 refeições por mês. Considerando que cada refeição pesa em média 300g, mensalmente é produzido, pelas cozinhas comunitárias, cerca de 18.441 kg de alimentos para a população em situação de vulnerabilidade de João Pessoa. 

*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 18 de maio de 2025.

source
Fonte

A União

Adicionar aos favoritos o Link permanente.