“Xiiiii, Andy Warhol!”: Paulo Bonfá está por trás da maior mostra do artista fora dos EUA

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“Andy Warhol era um artista renascentista”, afirma Paulo Bonfá, fundador da Totex, empresa por trás da maior exposição já realizada do artista fora dos Estados Unidos. “Eu me considero uma pessoa de espírito renascentista.” A comparação soa ousada. Afinal, Bonfá é mais conhecido por outra paisagem cultural: o humor.

Ele começou no rádio, com o grupo Sobrinhos do Ataíde, ao lado de Marco Bianchi e Felipe Xavier (talvez você se lembre do bordão “xiiiii, Marquinho!”), apresentou o Rockgol na MTV, cobriu Copas do Mundo e Olimpíadas pelo SporTV e preside o tradicional Salão Internacional de Humor de Piracicaba. Um currículo distante do universo de Warhol — mas Bonfá faz paralelos.

“No Renascimento, por falta de opção ou por excesso de incerteza, as pessoas se arriscavam em várias frentes”, diz Bonfá, ao NeoFeed. “Vejo o Warhol nesse mesmo espírito. Ele pintou, esculpiu, fotografou, lançou revista, disco. Eu comecei no rádio, passei pela TV, HQ, internet, teatro — e agora, uma exposição dedicada às artes visuais. Acho que nunca tive medo de tentar.”

A mostra Andy Warhol: Pop Art ocupa duas salas principais do Museu da Faap, em São Paulo, totalizando dois mil metros quadrados e mais de 600 obras originais — todas vindas do Andy Warhol Museum, de Pittsburgh, o maior museu dos Estados Unidos dedicado a um único artista.

Foram três anos de negociação. No início, a instituição norte-americana se dispôs a ceder apenas um pequeno conjunto. Aos poucos, Bonfá e seu sócio, Roberto Souza Leão, conquistaram a confiança dos curadores e expandiram a parceria.

O resultado é uma seleção abrangente que revela a diversidade da produção de Warhol: serigrafias, polaroides, vídeos, peças gráficas, um vestido e pinturas icônicas — como as latas de sopa Campbell e os retratos de Marilyn Monroe, Elvis Presley e Pelé.

Há também trabalhos que nunca foram expostos fora do Andy Warhol Museum, a exemplo de Oxidation (1978), feita com tinta metálica de cobre e urina humana — uma provocação que aproxima Warhol do expressionismo abstrato. Ou que raramente saem dos Estados Unidos, como A Última Ceia (1986), sua derradeira pintura, com quase nove metros de largura.

A logística para trazer o conjunto para o Brasil foi meticulosa. A tela precisou ser desmontada para o transporte e exigiu uma equipe de 17 pessoas para ser instalada. As obras viajaram em três aviões e três caminhões, partindo de diferentes cidades e em horários distintos — uma medida de segurança. Técnicos do museu acompanharam todo o trajeto, do embarque à instalação na parede da exposição.

“O museu foi superparceiro. Entenderam que a gente queria colocar o Warhol no patamar dos grandes mestres, trazendo obras de todas as fases da carreira — inclusive as menos conhecidas”, conta Bonfá.

Uma das últimas a ser confirmada na mostra foi Monte Vesúvio (1985), em uma versão em preto e branco. Nela, Warhol retorna ao gesto da pintura com pinceladas expressivas — uma exceção em sua produção bidimensional geralmente marcada pela repetição e pelo silkscreen. “Essa exposição é imperdível”, diz Bonfá. “Porque a única outra forma de ver tudo isso é ir até Pittsburgh.”

A curadoria de Priscyla Gomes foge da cronologia e aposta em agrupamentos por afinidades temáticas, criando novas conexões dentro da vasta produção do artista.

A mostra foge da cronologia e aposta em agrupamentos por afinidades temáticas (Foto: Divulgação)

“The Rolling Stones, Love You Live (1977)”, capa do álbum desenhada por Andy Warhol, 1977 Museu Andy Warhol, Pittsburgh; Coleção de fundação, contribuição Fundação Andy Warhol para as Artes Visuais, Inc.

Com 600 trabalhos do artista pop, a exposição na Faap é a maior de Warhol fora dos Estados Unidos (Foto: Divulgação)

Andy Warhol, “Marilyn Monroe (Marilyn)”, 1967 Museu Andy Warhol, Pittsburgh; Coleção de fundação, contribuição Fundação Andy Warhol para as Artes Visuais, Inc.

Com quase nove metros de largura, a obra “A Última Ceia” (à direita) exigiu uma equipe de 17 pessoas para ser instalada (Foto: Divulgação)

Andy Warhol, “Lata de Sopa Campbell (Arroz com Tomate)”, 1961 Museu Andy Warhol, Pittsburgh; Coleção Fundadora, Contribuição para o Dia Center for the Arts

Paulo Bonfá e Roberto Souza Leão se conheceram no Conselho Superior de Cultura da Fiesp. Souza Leão, com passagens pelo Instituto Tomie Ohtake, Museu do Amanhã e Paço do Frevo, viu em Bonfá um parceiro complementar, com um perfil criativo e versátil.

Juntos, fundaram o Instituto Totex — um neologismo de “Totalmente Excelente”. A missão: democratizar o acesso à cultura, valorizar a atividade artística profissional e integrar arte e educação formal. “Vivemos num mundo que disputa atenção o tempo todo. Os jovens não vão aos museus, não leem livros — estão nas telas. Então, como atrair novos públicos, sem perder os tradicionais, e ainda causar impacto real?”, questiona Bonfá.

A resposta da Totex veio em forma de grandes nomes. A primeira aposta foi a mostra imersiva Desafio Salvador Dalí, também realizada na Faap. Durante a pandemia, os sócios foram convidados a conhecer o novo projeto imersivo. Desenvolvido na Espanha, o projeto teve abertura mundial no Brasil — um feito que Bonfá e seu sócio atribuíram à própria ousadia.

A proposta deles foi direta: “Se não for a estreia mundial, nem precisa nos chamar”, lembra Bonfá. Souza Leão já tinha experiência com o universo de Dalí: em 2014, dirigia o Instituto Tomie Ohtake quando ali foi montada uma exposição com 218 peças do artista espanhol, incluindo obras, fotografias e convites. A mostra atraiu 537.754 pessoas. Em 2024, a exposição imersiva levou 200 mil visitantes à Faap.

Ainda assim, Bonfá evita comparar aquela montagem à atual mostra de Warhol. “As imersivas tiveram seu papel, mas, para mim, elas não são arte. São entretenimento audiovisual com fundo na área de arte”, afirma. Ele espera que a nova exposição supere os números da anterior. Quando a mostra de Dalí abriu ao público, as negociações com o Andy Warhol Museum já estavam avançadas — mas o plano inicial era outro.

Bonfá queria organizar uma grande exposição sobre os vikings. “Acho que o mundo viking é muito desconhecido para o brasileiro. Tem séries e filmes, tá? Mas fora isso, o que você sabe da Escandinávia? Muito pouco”, diz. “Morei durante um mês na Noruega quando era criança. Nunca mais esqueci disso.”

De repente, tudo faz sentido

Aos 11 anos, essa experiência foi decisiva. Bonfá acredita que ali se abriu a porta para o mundo das artes visuais ao qual hoje se dedica. Após o intercâmbio, viajou à Holanda e visitou o Museu Van Gogh. Embora as pinturas tenham impressionado, o que o tocou foram os desenhos. “O desenho era o que estava ao meu alcance, né? Papel e lápis”, lembra.

E repete como um mantra: “Depois que entrei no museu, ele nunca mais saiu de mim”. Para ele, muitas vezes, o impacto não é imediato. Passam dez, 15 anos e, de repente, tudo começa a fazer sentido. Hoje, aos 53 anos, ele espera que as crianças que visitem Andy Warhol: Pop Art sintam algo parecido.

Com formação tradicional — é graduado em Administração pela Fundação Getúlio Vargas, em Economia pela Universidade de São Paulo e tem pós-graduação em Marketing pela San Diego University —, Bonfá seguiu um caminho menos ortodoxo: rádio, TV e humor. “Acho que a formação acadêmica, independentemente da área de concentração, é imprescindível”, diz. “Ela me preparou para ser um empreendedor.”

Bonfá empreende desde os tempos dos Sobrinhos do Ataíde, quando criou, com os colegas, uma empresa para prestar serviços à rádio. A mesma lógica se repetiu na televisão. “Nunca tive agente. Talvez por causa da formação. Isso já fazia parte do meu dia a dia.”

À primeira vista, pode parecer contraditório alguém com sua trajetória estar hoje à frente de uma megaexposição de Andy Warhol. Mas ele enxerga esse movimento como natural.

Desde 2010, integra o Fórum Brasileiro pelos Direitos Culturais (FBDC), onde passou a dialogar com profissionais da economia criativa. Em 2019, assumiu a presidência do Salão Internacional de Humor de Piracicaba e começou a convidar artistas estrangeiros.

Para Bonfá, essa nova atuação não é uma transição de carreira, mas sim “um período sabático do humor”. “Eu não larguei o que fazia. Continuo com outros projetos. Mas, agora, meu tempo, minha atenção — os holofotes, né? — estão voltados para esse trabalho. Porque ele está tendo uma repercussão muito positiva e é importante. Sem modéstia: é uma baita realização.”

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Neofeed

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