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Quando um artista sobe ao palco de um bar ou restaurante na Paraíba, o público raramente sabe com exatidão para onde vai o dinheiro pago no couvert artístico. Essa lacuna, entretanto, não pode mais existir, após a publicação da Lei Estadual no 13.652, que assegura o pagamento integral aos artistas. A iniciativa foi sancionada nesta semana e publicada no Diário Oficial do Estado (DOE) da última quarta-feira (7). O couvert artístico é uma taxa cobrada por bares, restaurantes e outros estabelecimentos que oferecem apresentações musicais ou artísticas ao vivo. Essa taxa visa a remunerar os artistas e cobrir os custos da apresentação.
A norma representa uma mudança significativa nas relações entre artistas e estabelecimentos comerciais, ao estabelecer que 100% do valor arrecadado com o couvert deverá ser repassado diretamente aos músicos. A única exceção é a retenção de até 20% do total, permitida somente quando houver acordo ou convenção coletiva da categoria, para custear encargos sociais, trabalhistas e autorais.
Para a autora da proposta, a deputada estadual Cida Ramos, a medida é uma resposta às dificuldades enfrentadas por músicos que, muitas vezes, não recebem integralmente pelo serviço prestado. “A valorização dos artistas é urgente. Há casas de shows que retêm parte dos valores pagos ou até oferecem desconto no couvert para atrair público. A lei vem para corrigir essas distorções, garantindo remuneração justa e respeito à classe artística”, afirmou a parlamentar.
O advogado empresarial Junior Fidelis destaca que, com a nova legislação, não há mais brechas para que os estabelecimentos descumpram o pagamento integral. “Antes, havia margem para repasses parciais. Agora, a lei é clara: o repasse deve ser integral”, pontuou.
Além de regulamentar o repasse financeiro, a Lei no 13.652 também estabelece regras de transparência. A cobrança do couvert artístico deverá ser informada de forma visível ao consumidor, e o contrato firmado com o artista deve estar afixado na entrada do local.
Repercussão
Nos bastidores dos bares e casas de show, a repercussão da nova legislação já movimenta o setor. Allan Siderall, promoter de eventos do Bessa Grill, um dos mais tradicionais espaços de música ao vivo em João Pessoa, avalia a norma com otimismo e ressalta a importância de um diálogo entre as partes.
“Sempre tratamos os músicos com respeito. São nossos amigos e parceiros. Vamos discutir a aplicação da lei em uma reunião no dia 12 de maio, com representantes do setor, do Governo e da Prefeitura. É importante que todos entendam como funciona a produção de um evento, para que possamos encontrar caminhos que valorizem a arte e, ao mesmo tempo, mantenham a sustentabilidade do empreendedorismo cultural”, afirmou Allan.
A Associação Brasileira de Bares e Restaurantes — Seccional Paraíba (Abrasel-PB), entretanto, posicionou-se contra a nova decisão. Segundo a instituição, faltou diálogo para chegar a um acordo que beneficie todas as partes, tanto o estabelecimento quanto os artistas. “A preocupação é como vai ficar essa relação, já que os músicos vão acabar perdendo espaço e o público vai perder aquela música ao vivo. Pretendemos judicializar essa decisão. O nosso jurídico já está montando o processo; vamos primeiro conversar para chegar a um entendimento que fique bom para todas as partes. Mas, caso não haja um consenso, iremos judicializar, sim”, alertou a presidente da entidade, Thâmara Cavalcanti.
Fiscalização compartilhada
A implementação da lei contará com um modelo de fiscalização compartilhada. A responsabilidade recai sobre diferentes entidades: a Ordem dos Músicos do Brasil (OMB), os órgãos municipais ligados à cultura, os próprios músicos e sindicatos, além dos estabelecimentos.
Segundo o presidente da OMB-PB, Marcos Rosa, a medida é um avanço para os profissionais da música, mas dependerá da união da categoria. “A lei permite que os músicos tenham respaldo legal para cobrar seus direitos. No entanto, é preciso que os profissionais se organizem, formalizem contratos e denunciem irregularidades. A OMB não atua com fiscais nas ruas, mas oferecemos suporte jurídico e modelos de contrato para os músicos”, destacou.
A superintendente do Procon Estadual, Késsia Liliana, reforça o papel do órgão na fiscalização do cumprimento da norma, principalmente sob o ponto de vista do consumidor. “A lei garante ao público a informação clara e antecipada sobre a cobrança do couvert. Além disso, assegura que o valor pago seja destinado diretamente ao músico, promovendo transparência na relação de consumo. É uma medida de valorização cultural e proteção ao consumidor”, afirmou.
Para o advogado Junior Fidelis, a fiscalização depende da atuação conjunta de todos os envolvidos. “Se for um consumidor que detectar a irregularidade, deve procurar o Procon. Se for o músico, deve acionar a Ordem dos Músicos ou o sindicato. A lei é ampla, mas sua efetividade depende da mobilização de todos”, reforçou.
Cobrança de couvert
A cobrança do couvert nos estabelecimentos que disponibilizam algum tipo de atração artística é uma atividade legal, mas o estabelecimento precisa seguir algumas normas, previstas na Lei Estadual no 9.904/2012. Entre elas a descrição clara do preço a ser pago a mais por essa atração, afixada em local de visível acesso ao consumidor.
O estabelecimento que oferecer o show como um serviço a mais pode cobrar por isso; porém, o consumidor precisa ser informado antes de iniciar o consumo no local, de que está pagando por isso. Essa informação, inclusive, precisa ser afixada de forma clara e visível, de preferência na entrada do estabelecimento, já com o preço exposto.
Entretanto, o estabelecimento não pode cobrar couvert artístico para música ambiente (aquelas que são gravadas) e nem para telões com vídeos musicais ou com transmissão de jogos.
*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 10 de maio de 2025.
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A União