PEC da Segurança Pública: o que é, quais mudanças propõe e por que está em debate no Congresso

PEC da Segurança Pública

Ministros, governadores e integrantes do Judiciário debatem a PEC – Foto: Ricardo Stuckert/PR

O governo federal encaminhou ao Congresso Nacional a PEC da Segurança Pública. O objetivo, segundo o texto, é desburocratizar processos e tornar mais eficiente o combate às organizações criminosas em todo o país.

A Proposta de Emenda à Constituição, no entanto, tem gerado polêmicas entre a oposição e as forças de segurança.

O que é a PEC e como ela surgiu

Apresentada inicialmente em outubro de 2024, durante um evento em Brasília que reuniu o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, governadores, ministros e representantes do Judiciário, a PEC busca atualizar a Constituição Federal de 1988 em relação à segurança pública no Brasil.

A proposta parte do entendimento de que a criminalidade deixou de ser local para assumir proporções interestaduais e até internacionais. Por isso, o governo considera revisar e modernizar o texto constitucional, modificando as capacidades do Estado no combate ao crime organizado.

PEC da Segurança Pública: o que é, quais mudanças propõe e por que está em debate no Congresso

Ministro Ricardo Lewandowski entregou o texto da PEC ao presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta – Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Embora a Constituição atual estabeleça, no artigo 144, que a segurança pública é dever do Estado e responsabilidade de todos, o governo avalia que há lacunas quanto às competências da União nesse tema.

No início do mês, o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, e a ministra-chefe da Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República, Gleisi Hoffmann, entregaram o texto ao presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta. O documento foi atualizado com a inclusão das sugestões dos governadores.

Principais alterações propostas na PEC

Entre os principais pontos da PEC da Segurança Pública está a elevação do Susp (Sistema Único de Segurança Pública), criado por lei em 2018, ao status constitucional.

Para isso, a ideia é colocar na Constituição Federal o Conselho Nacional de Segurança Pública e Defesa Social, composto por representantes do governo federal, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios.

A intenção é integrar os entes federativos na formulação e execução de políticas de segurança, além de padronizar procedimentos e dados. Segundo o governo, atualmente, há 27 sistemas distintos de antecedentes criminais, boletins de ocorrência e mandados de prisão, o que dificulta a atuação coordenada.

PEC da Segurança Pública

Sete policiais militares do Distrito Federal montados em cavalos em frente à Catedral Metropolitana Nossa Senhora Aparecida, em Brasília – Foto: Foto: José Cruz/Agência Brasil

O Ministério da Justiça defende, no entanto, que a padronização não significará centralização: ou seja, os Estados não serão obrigados a usar plataformas diferentes das que já são utilizadas por eles.

Tampouco vai modificar a atual competência dos Estados e municípios na gestão da segurança pública.

A PEC da Segurança Pública também diz que não haverá a criação de novos cargos públicos e afirma que a proposta segue o modelo de sistemas já consolidados na Constituição, como o SUS (Sistema Único de Saúde) e o Sistema Nacional de Educação.

PEC da Segurança Pública: impactos para polícias, guardas municipais e União

A nova versão da proposta, elaborada pelo ministro Lewandowski após as críticas de governadores e prefeitos, incluiu as guardas municipais no rol dos órgãos de segurança pública previstos na Constituição.

Guardas municipais

O texto da PEC da Segurança Pública reproduz a decisão do STF sobre dar poder de polícia às guardas municipais. Elas poderão atuar na segurança urbana, sem sobrepor funções das polícias Civil e Militar.

Por outro lado, a proposta proíbe que as guardas municipais exerçam funções de polícia judiciária, que tem como principal função apurar as infrações penais e sua autoria por meio da investigação policial. Além disso, elas ficarão sujeitas à fiscalização externa por parte do Ministério Público.

Polícia Rodoviária Federal

Inicialmente, a PRF (Polícia Rodoviária Federal) passaria a se chamar Polícia Viária Federal, pois além de rodovias ficaria responsável pelo patrulhamento ostensivo em hidrovias e ferrovias. No entanto, após pressão da própria instituição em defesa do atual nome, o ministro recuou.

Para desempenhar as atribuições, a PRF não exercerá funções próprias das polícias judiciárias nem procederá a apuração de infrações penais, cuja competência é exclusiva da Polícia Federal e das polícias civis.

Polícia Federal

No caso da PF (Polícia Federal), o texto diz que manterá a atribuição de combater crimes ambientais e os praticados por organizações criminosas ou milícias com repercussão nacional ou internacional.

Um dos pilares da PEC da Segurança Pública é dar status constitucional ao sistema de segurança

Um dos pilares da PEC da Segurança Pública é dar status constitucional ao sistema de segurança | Foto: PF/Divulgação

Fundos

A PEC prevê a criação do Fundo Nacional de Segurança Pública e do Fundo Penitenciário Nacional, destinados a financiar ações e projetos nas áreas de segurança e defesa social. A distribuição de recursos entre os entes federativos será definida em lei, e o texto proíbe o contingenciamento desses fundos.

Conselho de Segurança

Outro ponto previsto pela PEC da Segurança Pública é a inclusão de representantes da sociedade civil na composição do Conselho Nacional de Segurança Pública e Defesa Social, que terá também representantes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios.

Conselho Nacional de Segurança Pública e Defesa Social

A proposta inclui a participação da sociedade civil no Conselho Nacional de Segurança Pública e Defesa Social, que já terá representantes dos entes federativos. A intenção é ampliar o controle social e a transparência na formulação de políticas públicas de segurança.

Corregedorias e ouvidorias

Por fim, a PEC da Segurança Pública propõe a criação de corregedorias e ouvidorias com a finalidade de apurar a conduta dos profissionais das áreas de segurança pública e defesa social.

Caberá às corregedorias a investigação de possíveis responsabilidades funcionais, por meio da abertura de sindicâncias e da instauração de processos administrativos disciplinares.

Argumentos favoráveis e contrários da PEC da Segurança Pública

A PEC da Segurança Pública gerou divergências entre o governo federal e a oposição. Enquanto a base destaca avanços no setor, opositores falam em centralização e falta de autonomia dos entes federativos.

O que dizem os defensores da PEC

Os apoiadores da PEC defendem que a estrutura da segurança pública foi definida há mais de 30 anos, com poucas alterações ao longo do tempo. Apesar das 135 emendas constitucionais aprovadas desde 1988, apenas duas trataram diretamente do artigo 144.

Os defensores dizem que a violência se transformou e o crime se sofisticou, no entanto as leis de segurança pública brasileira permanecem praticamente intactas. Nesse contexto, a PEC da Segurança Pública representaria uma atualização inédita na segurança desde a redemocratização.

PEC da Segurança Pública

Ministro Ricardo Lewandowski defende constitucionalização do sistema de segurança – Foto: Lula Marques/ Agência Brasil

Além disso, é defendido que a proposta se inspira em modelos já consolidados na Constituição, como o SUS e o SUAS, e busca implementar uma política pública de segurança que seja coordenada, baseada em evidências e com abrangência nacional.

Outros pontos destacados pelos defensores da PEC da Segurança Pública incluem:

  • Autonomia das ouvidorias e corregedorias das forças de segurança, o que ampliaria a transparência e o controle democrático;
  • Ampliação das atribuições da Polícia Rodoviária Federal com atuação também em hidrovias e ferrovias. Em um país de dimensões continentais como o Brasil, a mudança é vista como forma de aumentar a presença do Estado em áreas hoje desassistidas.

Críticas da oposição

Por outro lado, a oposição expressou preocupações quanto à centralização de poder nas mãos da União. Para eles, a PEC da Segurança Pública comprometeria a autonomia dos estados na gestão da segurança.

Como contraponto, um grupo de 27 senadores, incluindo nomes da própria base do governo Lula, apresentou uma proposta alternativa, que busca garantir ao Congresso Nacional competência exclusiva para legislar sobre segurança pública. A proposta também reforça o papel dos entes federativos e a liberdade para atuar.

O senador Mecias de Jesus (Republicanos-RR), autor principal da proposta alternativa, afirma que os estados não podem sofrer “interferências indevidas” do governo federal.

Além disso, a proposta enfrenta resistência entre representantes das próprias forças de segurança. Entidades de classe de policiais federais, civis e militares publicaram um manifesto contrário ao texto do governo.

Delegados, peritos e militares argumentam que a PEC da Segurança Pública não foi amplamente debatida com os profissionais da área e que há soluções mais simples e eficazes a serem implementadas.

Entre as sugestões apresentadas por essas entidades estão:

  • Integração e unificação dos bancos de dados das forças de segurança;
  • Criação de protocolos de atuação conjunta, respeitando as atribuições constitucionais de cada órgão;
  • Investimento em capacitação e treinamento das forças previstas no artigo 144 da Constituição;
  • Aquisição de tecnologias avançadas para investigação e padronização de dados estatísticos sobre criminalidade.

A oposição também diz que a PEC da Segurança Pública é uma saída do governo para a baixa popularidade. Os deputados da oposição dizem que a PEC é uma forma de o governo federal acenar para a população em um momento em que pesquisas mostram que o tema é a maior preocupação dos brasileiros.

Na visão desses profissionais, tais medidas podem ser adotadas sem necessidade de uma mudança constitucional complexa e sem o alto custo político que uma PEC exige.

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