Debatedores defendem maior participação de famílias nas escolas

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O Dia Nacional da Família, celebrado nesta quinta-feira (24), foi marcado pela defesa de maior participação efetiva das famílias no ambiente escolar e o alerta para a necessidade de se estabelecer mais parcerias entre comunidade, poderes públicos e escolas na promoção da educação integral de crianças e adolescentes. Durante audiência pública na Comissão de Direitos Humanos (CDH), educadores e especialistas apontaram as dificuldades estruturais das famílias, o distanciamento delas com o ambiente escolar e a “síndrome do pensamento acelerado da sociedade moderna” entre os maiores desafios para a educação da nova geração. 

A audiência pública faz parte do ciclo de debates sugerido pela presidente da CDH, senadora Damares Alves (Republicanos-DF), sobre os direitos humanos das crianças, adolescentes e dos jovens. 

Participação das famílias

A chefe da assessoria especial da Cultura de Paz nas Escolas da Secretaria de Educação do Distrito Federal, Ana Beatriz Goldstein, advertiu que as crianças e adolescentes estão sendo “educadas” hoje por um “inimigo invisível”, num ambiente sem monitoramento e regras, onde crimes e o aliciamento de menores acontecem o tempo todo: as redes sociais. 

De acordo com Goldstein, não há trabalho de educação sem parceria e integração e sem o direcionamento de uma política pública efetiva, que pense a particularidade das famílias reais de hoje, que são, como explicou, compostas por mães solo ou pais que não conseguem sair do trabalho para participar de uma reunião na escola.

Para isso, continuou, os programas em parceria com os governos e poderes públicos são fundamentais para levar a família da escola pública para dentro da instituição, com o objetivo de incentivar sua participação na vida escolar dos filhos e reforçar o vínculo da escola com a comunidade. A secretária ressaltou que as políticas públicas devem levar em consideração a Lei da Gestão Democrática — Lei 4.751, de 2012, do Distrito Federal, que se soma à Lei 14.644, de 2023, que alterou a Lei de Diretrizes e Bases da Educação e trata da participação da comunidade junto à escola.

— Não é simplesmente querer que a família esteja na escola. Mas que meios estamos dando para que ela esteja lá? Essa família que sai para trabalhar, os pais e, muitas vezes, a mãe solo que não consegue folga para estar na escola — disse. 

Falhas do Estado

Secretário executivo de Segurança Pública do Distrito Federal, Alexandre Patury disse que a área de segurança pública é cobrada para resolver problemas relacionados a comportamentos de crianças e adolescentes que estariam ligados à ausência e falha do Estado em outras etapas da vida dessas pessoas, como a falta de uma família com condições de vida para se manter estruturada e presente. 

Diante desse cenário, ele afirmou que a questão possa ser trabalhada de forma integrada, buscando-se a verdadeira origem das causas da violência entre crianças e adolescentes com reflexo nas crescentes ocorrências no ambiente escolar.  

— Uma criança que tem um pai preso, que tem a mãe nas drogas, que tem um irmão morto. Como que você convence uma criança ou adolescente desse?[…]: ‘Meu filho, usar um canivete, levar uma faca, brigar na escola é errado’? Se a vida dela toda foi pautada numa estrutura de violência onde nós, por algum motivo, não conseguimos corrigir ao longo da história. Então a gente tem que atacar é a origem. E a origem principal é a família estruturada. 

Desenvolvimento emocional

Na avaliação do psiquiatra, professor e escritor Augusto Cury, a escola precisa deixar de ser apenas uma transmissora de dados para se tornar um espaço de desenvolvimento emocional, onde cada aluno é visto de forma única. Ele alertou que a educação mundial está doente e formando pessoas doentes, para uma sociedade igualmente adoecida. Segundo ele, pais e filhos vivem realidades diferentes, intoxicados pela “cocaína digital”, e é papel da escola reconectar esses mundos por meio de uma nova forma de ensinar e encantar.

Segundo ele, diante do “esgotamento mental” da sociedade atual, com sintomas da chamada “síndrome do pensamento acelerado” — como sofrimento antecipado, ruminação de perdas e inabilidade emocional —, o ambiente escolar precisa promover saúde mental e habilidades socioemocionais. 

  A escola deve deixar de ser uma expositora de dados para criar um clima onde cada aluno é observado de forma única e recebe uma carga de emocionalidade maior do que milhões de ‘likes’ em redes sociais. A escola precisa ser uma produtora das habilidades socieomocionais e uma promotora da saúde mental — disse Cury.

Ele afirmou que o excesso de informação, o uso abusivo de redes sociais, o atual formato de ensino e a pressão por desempenho têm impactado diretamente os estudantes, gerando altos índices de depressão e medo de se expressar. Para o psiquiatra, a educação precisa acolher e atrair alunos e suas famílias, promovendo empatia, interatividade e protagonismo.

Ainda para Augusto Cury, é necessário um modelo pedagógico centrado no “professor provocador”, capaz de engajar os alunos e resgatar o prazer de aprender. Em vez de apenas ensinar conteúdos técnicos, a escola deve ser um espaço rico em experiências emocionais, onde se previnem transtornos mentais e se criam conexões humanas significativas. 

Distanciamento  

O distanciamento entre família, escola e comunidade deve ser revertida com uma cultura que institucionalize a participação dos pais na gestão do ensino de seus filhos, disse Damares Alves.

— O que a gente tem visto cada vez mais são escolas e famílias distantes. E a gente vai ter que repensar isso. A escola tem que realmente ficar longe da família? O que está acontecendo nesse exato momento em que a família não está podendo opinar com a escola e a escola, cada vez mais, se intimidando em pedir ajuda à família? — declarou a senadora.

O conselheiro do Instituto Brasileiro de Direito e Religião (IBDR), Douglas Roberto de Almeida Baptista, disse que, entre os desafios que impedem o avanço educacional no país, estão o ativismo ideológico, a crise pedagógica, a falta de respeito à fé cristã das famílias e a desconexão entre a escola e a comunidade.

— A presença da doutrinação ideológica nas escolas é um desafio. Isso dificulta a participação da família na escola por conta da abordagem ideológica presente no conteúdo pedagógico. 

Segundo ele, na Conferência Nacional de Educação (Conae), ocorrida em 2024, quando delegados conservadores foram alvo de “hostilidade e censura”, enquanto bandeiras progressistas, “como pautas sindicais e de ideologia de gênero”, eram bem recebidas. 

A delegada representante da Confederação Nacional das Associações de Pais de Alunos, Adriana Marra, disse que o país não tem respeitado a Declaração Universal dos Direitos Humanos, do qual Brasil é signatário, ao não possibilitar que os pais tenham “a prioridade do direito de escolher o gênero de educação dos seus filhos”. Marra afirmou que o documento de referência encaminhado pela Conae, no ano passado, ao Ministério da Educação, orienta pela proibição de escolas confessionais, de escolas cívico-militares, do homeschooling e pela obrigatoriedade do ensino para crianças a partir de zero ano. 

— E o que a gente tem visto de fato é essa utilização do Estado no sentido de, cada vez mais, estar retirando das famílias, pouco a pouco, esse direito de participar da escolha de gênero da educação do seu filho. 

O padre Paulo Rogério, assessor da Pastoral da Educação da Arquidiocese de Brasília, afirmou que os valores morais e princípios éticos fazem parte do pilar para a educação integrada do aluno e, portanto, devem ser levados em consideração na elaboração dos projetos políticos pedagógicos. Essas diretrizes, segundo ele, devem representar os valores das famílias daquela comunidade, principalmente, como ele lembrou, diante de uma sociedade majoritariamente formada por aqueles que se definem como cristãos. 

— Toda escola tem o seu projeto pedagógico, o projeto pedagógico, dentre as coisas que o definem, define a identidade escolar. Define a sua missão, sua visão, seus valores. E isso deveria ser discutido com as famílias. Será que esses valores eles estão representando as famílias? Porque se não estiver representando as famílias a escola está se esforçando à toa. A não ser que ela tome, sequestre as crianças de suas famílias.

Parcerias 

No entendimento da representante da Ong Family Talks, Maria Eduarda Manso, a participação da família ainda é limitada e, muitas vezes, reduzida a momentos formais como reuniões escolares o que, de acordo com ela, não configura de fato uma corresponsabilidade no processo educacional das crianças e dos jovens. Para ela, falta uma institucionalização dessa participação. 

— Aqui no Brasil a Constituição Federal, a LDB, o ECA já preveem o direito e o dever da família na educação das crianças e dos adolescentes. Mas na prática a gente observa uma lacuna entre o que está previsto […] e a forma como a parceria é construída no cotidiano da escola. As estratégias de envolvimento, no dia a dia da prática na escola, raramente envolve o diálogo, o acolhimento ou o reconhecimento da diversidade cultural e social das famílias brasileiras. 

A gerente da Câmara de Educação Básica da Associação Nacional de Educação Católica do Brasil, Roberta Guedes, destacou a importância da formação integral e da memória afetiva no ambiente escolar, tendo os valores da evangelização, da valorização dos professores e da escuta como pilares da educação. 

— A gente está falando de uma coisa muito simples que se chama parceria. E a parceria fala de direitos, mas fala de deveres. A família tem seus deveres, a escola tem seus deveres, o Estado tem seu dever e juntos temos que garantir direitos. Direitos se pautam em deveres. É por isso que eu preciso falar de situações exitosas. As crianças, os adolescentes, não importa a condição social, precisam ter experiências afetivas, socioemocionais, acadêmicas. Toda criança tem que ter direito à escola, toda família tem que ter direito ao sustento, isso é básico. E aí a gente está falando de algo muito importante, por exemplo, como o esporte, lazer, cultura, acesso à boas bibliotecas públicas — declarou.

Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)

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Fonte: Senado Federal

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