André Bonomini: De volta à Prainha (ou “de volta, a Prainha)

Praça Juscelino Kubistcheck de Oliveira.

A curva do rio.

A dita “Ponta Aguda” que dá nome ao bairro que a cerca.

A praça do Moinho do Vale. Lugar onde fica a concha e o Vapor Blumenau.

O lugar onde foi feito o Skol Rock.

Ou, para os mais antigos ainda, onde se pescava robalo nas competições de pesca das Lojas Prosdócimo.

Já faz tempo que falar da Prainha é assunto espinhoso, sobretudo para quem convive dentro da administração municipal e tem quase que uma pulga diária para coçar: quando vamos, definitivamente, entregar o espaço de volta a comunidade da forma como ele tem que ser: preservado e renovado?

Afinal, quatro anos de atraso são de se incomodar mesmo, mas sigamos…

Detalhes finais: novo prazo é para o primeiro semestre deste ano. Mas, será mesmo? (Maurício Cattani/Arquivo pessoal)

Pesquisando rapidinho nas bases de matérias publicadas aqui dentro de casa, somam-se por volta de 80 matérias que falam diretamente ou relacionam, nas suas linhas, o velho e mais conhecido espaço de convivência blumenauense desde que o portal se conhece por site. Em se tratando de projetos e obras, o número de postagens cai bem, mas ainda assim é uma urticária presente no cotidiano.

Eu sou da geração noventista, mas daquela que ainda ouviu falar do Skol Rock e que raramente pisava por lá. Outros, os mais antigos, talvez recordem com olhos brilhantes de saudade o tempo que a faixa de areia era propícia para um volei despreocupado ou até mesmo um banho calmo nas ainda límpidas águas do Itajaí-Açu, que só ficava nervoso em enchentes ocasionais.

Tempos dourados: quando virou praça, a Prainha consolidava-se como point da cidade, mas lentamente foi sendo esquecida no correr urbano, nas negligencias e nas águas que a invadiam vez ou outra (Antigamente em Blumenau)

A verdade é que a Prainha sempre foi uma espécie de testemunha silenciosa de várias vidas que por lá passaram. De um local simples de convívio e sem grandes estruturas urbana em volta, à pompa de uma praça com fonte e restaurante “conjugado” foram-se tempos e tempos, contados através dos elementos que a compõem e outros desaparecidos sob a pedra fria de hoje.

Alias, a Prainha, meio que sem querer, é o retrato de um desafio permanente que Blumenau sempre teve com as margens do Itajaí-Açu que cortam a região central. Dias foram e vieram, enchentes corroeram ambos os lados ocupados e soluções eram colocadas, vez em quando, na mesa dos vários prefeitos debruçados neste problema.

E não é mentira dizer, mas tudo isso teve sua demora. A Beira-Rio é um fruto disto.

Por muito tempo, quem tinha o comércio instalado na margem direita do rio tinha que respirar fundo cada vez que as águas subiam para que a mata ciliar tão depauperada aguentasse o tranco. Não raros os deslizamentos e desabamentos, e até que a primeira parte da avenida surgisse foram seguidos dilemas, sugestões e contestações até, em 1968, surgia uma pista, uma margem restaurada e, para quem não acredita, uma calçada as margens da calmaria do rio.

Primórdios: a faixa de areia, propicia a diversão e a pesca, ladeada pelo movimento portuário (Antigamente em Blumenau)
Antes da Beira-Rio: a maltratada margem direita, onde o risco de deslizamento era constante (Antigamente em Blumenau)
Anos 1960: Depois de muito tempo, as intervenções que levariam a Beira-Rio a nascer (Antigamente em Blumenau)

E se a Beira-Rio demorou para virar o que é hoje, mesmo com a dita “área de convivência” soterrada pela errática reurbanização de começo de século, a Prainha sofre do mesmo mal até hoje. Seu esquecimento e deterioração não é tão recente, e de testemunha a praça acabou virando uma peça incômoda até mesmo para quem entrava no clássico Moinho do Vale para horas gastronômicas alegres.

Entre os anos 1960 e 1990, estar na Prainha era corriqueiro para jovens e famílias na região central da cidade. O conturbado agito da ainda pueril metrópole ficava na outra margem e, despreocupadamente, este virava um pano de fundo em meio ao momento calmo do Itajaí-Açu, da estática ferragem do Vapor Blumenau (ferragem sim, dado ao tempo de “abandono” passado por ele) e a sombra da grande concha presenteada pela Artex em 1986.

Alias, a embarcação e o palco são os que melhor podem contar deste período entre o áureo e o abandono. O Vapor Blumenau, símbolo dos tempos navegáveis do rio e do comercio sobre as águas, encontrou lá a morada definitiva. No entanto, o descaso histórico de anos o levou a quase enferrujar ou ser tragado de vez pelo rio vizinho.

Enquanto a Beira-Rio nascia, um esquecido Vapor Blumenau jazia na Prainha, anos 1960 (Antigamente em Blumenau)
Em dias áureos, junto ao Moinho do Vale, o velho barco mantinha-se inteiro e salvo. Mas os anos passaram, e o abandono o habitou por ainda mais tempo (Antigamente em Blumenau)

Mesmo em bom estado nos dias de hoje, assusta e cria desconfiança por pensar que o velho barco não poderá estar neste mesmo estado no passar do tempo, dado o histórico recente. O mesmo se diz da concha acústica, um presente para a cidade dado pela tradicional marca do cavalo marinho no ano do cinquentenário da fábrica dos Zadrozny. Era a época de shows culturais ao ar livre e marcos como o outrora famoso “Projeto Aquarius”, que levava musica clássica às praças.

A concha que, silenciosamente, acompanhava resignada as batidas vigorosas do Rock quando este tomou a praça nos anos 1990. Não era ela o palco e dizem os entendidos que ela mal serve pra isso. Transfigurou-se num camarim improvisado que cumpria o papel, e os anos a deixaram a margem, habitada por inconvenientes do dia-a-dia para seus usos inconfessáveis.

A concha acústica em dia de concerto. Esta, no dia da entrega para a comunidade, presente da Artex em 1986 (Antigamente em Blumenau)
A Prainha nos tempos que a música clássica saía do teatro para a rua. No caso, a concha (Antigamente em Blumenau)
Atrás da apoteose dos Mamonas, a já velha concha acústica. No Skol Rock, feita de um simples camarim (Antigamente em Blumenau)

Agora, depois de tanto que o tempo viu e reviu na velha Prainha, ela enfim ganha a justa repaginação. Foi tempo demais largada ao capim, ao misto de barro, lama, pedras e tijolos urbanos soterrados de enchente em enchente. Alias, tem quem leia estas linhas e talvez se questione quanto tempo a praça durará firme e nova se, num acaso do clima, as águas subirem de novo. A velha e manjada lógica do desastre geradora de polêmicas nas nossas esquinas.

Certo é, e isto tem que ser celebrado de fato, é que agora a Margem Esquerda ganha a merecida valorização que tanto esperava. Pode não ser o projeto que algum professor ambiental imaginava, mas devolve à cidade um espaço novo e necessário nestes dias em que se procura convivência social muito mais do que o local instagramável, sede de muita gente virtual.

Logo logo (e espero não estar arrematando antes da hora demais), a Prainha volta de vez ao convívio. Cabe a cada um ser vigilante e cuidar do espaço e não dar as costas sempre que o momento de lazer acaba. é um recorte da vida social, recheado de memórias e momentos, que se vira novamente para o século em que está e espera, depois de tanta demora e omissão, que cada um também faça a sua parte.

(Antigamente em Blumenau)

História se preserva com cuidado e não com negligencia, e a Prainha, logo de volta, não aguenta mais o esquecimento crônico.

De volta à Prainha…

Ou: De volta, a Prainha.

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