MEC diz ignorar onde estão alunos do Pé-de-Meia, propagandeado por Lula

O MEC (Ministério da Educação) e a CEF (Caixa Econômica Federal) disseram à CGU (Controladoria-Geral da União) que não sabem onde estão os quase 4 milhões de alunos do programa Pé-de-Meia, propagandeado ontem (24) pelo presidente Lula (PT) em rede nacional.

O programa paga hoje (25) parcela de R$ 1.000 àqueles que concluíram o ensino médio no ano passado. A informação foi destacada no pronunciamento de Lula, numa tentativa de recuperar sua popularidade.

No entanto, o MEC e a Caixa afirmaram ignorar onde estão esses alunos ao responderem a questionamentos do UOL feitos por meio da LAI (Lei de Acesso à Informação).

Em 2024, foram gastos R$ 5,78 bilhões com o programa, feito sem transparência com uma espécie de “orçamento paralelo”, conforme mostrou reportagem do UOL.

Desse valor, a Caixa recebeu R$ 7,3 milhões para administrar o fundo do Pé-de-Meia e mais R$ 53,8 milhões para fazer as transferências às contas-correntes dos estudantes. No entanto, o banco admitiu que não tem o controle nem mesmo em seus cadastros do município onde os estudantes se encontram.

“A Caixa (…) Acrescenta que, os pagamentos do programa são realizados em conta Poupança Social Digital, (…) com vinculação a uma agência digital única na Caixa, de maneira que a informação presente na vinculação da conta não reflete o município pelo qual o estudante foi beneficiado pelo programa”, relatou a CGU em documento entregue ao UOL na quinta-feira passada (20).

O banco sugeriu que o MEC fosse procurado, mas ele também não possui a informação. “Entende-se pela inexistência destas informações, considerando que o recorrido [MEC] afirma que ainda está realizando gestões referentes a esses dados”, disse a CGU em documento entregue hoje.

Nos dois casos, o UOL solicitava a quantidade de alunos que receberam os valores separados por município. MEC e Caixa dizem não saber a quantia tampouco os nomes dos estudantes que recebem os valores em cada cidade do país. A CGU negou o recurso da reportagem para obter as informações.

Fora do orçamento

Lula defendeu os benefícios sociais do Pé-de-Meia em pronunciamento na TV.

O programa social precisa ser encaixado dentro do orçamento por ordem do TCU (Tribunal de Contas da União). Depois de reportagens do UOL, a corte de contas suspendeu os pagamentos inicialmente, liberou-os dias depois para não prejudicar os estudantes, mas exigiu que os valores fossem incluídos no orçamento.

Isso ainda não aconteceu porque a Fazenda e o MEC precisam cortar despesas para que o Pé-de- Meia deixe de ser operado num “orçamento paralelo”.

Neste mês, a secretária de Educação Básica do MEC, Kátia Helena Serafina Schweickardt, disse ao UOL que o Pé-de-Meia segue “firme e forte”.

“Todos os aportes feitos para o Pé-de-Meia foram aprovados pelo Congresso e cumpriram as normas orçamentárias vigentes”, disse o Ministério da Educação, na semana passada.

O ministro Fernando Haddad (Fazenda) disse que o governo vai enviar ao Congresso um projeto de crédito adicional para resolver o problema.

Os problemas do Pé de Meia

Os focos da investigação dos auditores do TCU são:

“Orçamento paralelo”. O Pé-de-Meia foi pago em 2024 sem passar pelo Orçamento. A lei que o criou determina que o Congresso avalize os gastos e quantidade de estudantes atendidos.

Uso de outros fundos. Houve uma injeção de dinheiro no fundo do programa (Fipem) a partir de outro fundo, o FG-Educ, do Fies. Isso reforçou o uso de um “orçamento paralelo”, anotaram técnicos do TCU.

Operação mais cara. Como o governo optou pelo fundo em vez de pagar diretamente pelo Orçamento, tem que gastar com emissão dos cartões e transferências bancárias, como já acontece com o Bolsa Família, e ainda paga um custo a mais. É a administração do fundo. A Caixa recebeu R$ 7,37 milhões para isso em 2024, valores que poderiam ir para o bolso dos alunos.

Rombo no Fies. A transferência dos R$ 6 bilhões do FG-Educ para o Pé-de-Meia foi feita mesmo com um rombo de R$ 33 bilhões em inadimplência do Fies. A lei ordena que os valores só sejam transferidos se houver disponibilidade. Uma norma da Caixa prevê uma análise técnica para fazer o cálculo do que poderia ou não ser transferido para o Pé-de-Meia, mas o banco se recusa até mesmo a informar se fez essa avaliação.

Redução de investimentos na educação. A área técnica do TCU diz que usar “orçamento paralelo” no Pé-de-Meia traz prejuízos à população por mudanças na contabilidade da União. O governo ficaria obrigado a investir menos dinheiro na educação e na saúde.

Dados apagados. A Caixa apagou de seu site as despesas mensais feitas no fundo do Fipem, como o quanto ela ganha apenas para administrar o fundo, depois das primeiras reportagens do UOL. Os valores só foram republicados depois de questionamentos da reportagem.

Falta de transparência. Ao contrário do que acontece com o Bolsa Família, os nomes dos alunos, com seus CPFs, cidades onde residem e valores pagos mês a mês, não estão no Portal da Transparência. Só depois de insistência do UOL, o MEC publicou uma lista parcial no seu site.

Dados defasados. Mas a lista do MEC está com cinco meses de defasagem e não mostra as cidades dos alunos. Além disso, para conseguir ler a lista, o cidadão precisaria copiar quase 20 arquivos num computador e usar aplicativos de análise de dados para fazer comparações.

Estatísticas ocultas. A Caixa e o MEC rejeitaram todos os pedidos da Lei de Acesso à Informação feitos pelo UOL para fornecer até mesmo as estatísticas de pagamentos por cidade. Alguns casos já estão na na Comissão Mista de Reavaliação de Informações. (UOL)

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