‘Precisamos mostrar a importância do oceano para o brasileiro’, diz professora da UFSC que copreside grupo da Unesco

Professora Marinez Scherer fala em evento no Senado Nacional em maio de 2024. Foto: Waldemir Barreto/Agência Senado

A professora Marinez Scherer, do Departamento de Oceanografia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), assumiu, em 6 de fevereiro, a copresidência  do Grupo de Trabalho em Planejamento e Gestão Sustentável do Oceano (WG SOPM em inglês) da Comissão Oceanográfica Intergovernamental da Organização das Nações Unidas para Educação, a Ciência e a Cultura (COI/Unesco). 

“A gente precisa dar o exemplo no nosso próprio quintal, que a gente chama de ‘Amazônia Azul’. Estamos como uma vitrine do mundo para as questões ambientais e precisamos realmente mostrar a importância do oceano para o Brasil e para o brasileiro”, avalia Marinez.

Com uma zona econômica exclusiva e uma plataforma continental com 5,7 milhões de km², a “Amazônia Azul” brasileira é uma grande área relevante para o mundo, se mantida saudável em termos de enfrentamento às mudanças do clima, de segurança alimentar e de equilíbrio de gênero nas atividades, defende a professora.

A Unesco, por meio da COI, é a principal organização das Nações Unidas que trabalha no campo de Planejamento Espacial Marinho (PEM), que tem como enfoque o processo público de análise, alocação espacial e distribuição temporal de atividades humanas nas áreas marinhas para alcançar objetivos ecológicos, econômicos e sociais determinados por meio de processos políticos.


Cada vez mais, estamos com uma série de usos e atividades no oceano. Muitas atividades econômicas estão se voltando para o oceano, como a geração de energia, a aquicultura, o turismo e a produção de petróleo. Precisamos fazer uma boa gestão nesse espaço, porque é um planeta só e é um oceano só.

Marinez Scherer, copresidente do Grupo
de Trabalho em Planejamento e Gestão
Sustentável do Oceano da Unesco


De acordo com a Unesco, o PEM não é um fim em si mesmo, mas um modo prático de criar e estabelecer uma utilização mais racional do espaço marinho, bem como as interações de seus usos, a fim de equilibrar as demandas do desenvolvimento e atender aos resultados sociais e econômicos, de forma aberta e planejada. As ações do PEM em território brasileiro são administradas pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima e pela Comissão Interministerial para os Recursos do Mar.

Nessa linha, o grupo de trabalho copresidido pela professora da UFSC tem como objetivo, entre outras coisas, identificar as atividades relacionadas ao planejamento e gestão dos oceanos em todos os programas da COI/Unesco, propondo um plano de implementação e garantindo a coordenação com as ações da Década da Ciência Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável (2021-2030)

Organizada pela Organização das Nações Unidas (ONU) e iniciada em 2021, a Década do Oceano, como é comumente referenciada, tem como foco conscientizar a população em todo o mundo sobre a importância dos oceanos e mobilizar atores públicos, privados e da sociedade civil organizada em ações que favoreçam a saúde e a sustentabilidade dos mares. No Brasil, o planejamento das ações para a década é liderado pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), representante científico da COI.

>> Ouça o poscast do UFSC Ciência sobre a Década dos Oceanos e a Ciência

A importância do debate sobre sustentabilidade no oceano

Com os atuais avanços da discussão energética e climática, a professora Marinez alerta que é imediata a necessidade de voltar-se o foco da sociedade à análise e gestão oceânica. “Precisamos urgentemente fazer essa gestão costeira e marinha em todo o mundo, porque nós dependemos, o planeta Terra depende da saúde do oceano. Cada vez mais, estamos com uma série de usos e atividades no oceano. A economia está se voltando muito para o oceano, a geração de energia, a mineração, a produção de petróleo. Precisamos fazer uma boa gestão nesse espaço, porque é um planeta só e é um oceano só”, destaca.

Segundo a Unesco, a Década do Oceano pretende mobilizar cientistas, gestores, políticos e sociedades de todo mundo a protegerem o oceano que, apesar de cobrir 71% da superfície do planeta Terra, é pouco conhecido e conservado. Conforme relatório publicado pela COI em 2019, apenas 1% dos orçamentos nacionais para pesquisas é direcionado para a ciência oceânica e estima-se que somente 25% do fundo do oceano já foi mapeado e catalogado.

A promoção de iniciativas para ampliação do reconhecimento e do estudo das áreas oceânicas é essencial para a aplicação da ecologia marítima, ressalta Marinez. “Só vamos poder fazer uma gestão sustentável quando conhecermos o ambiente que estamos fazendo a gestão. E conhecemos pouco do oceano. Agora, inclusive, existe a ideia de fazer um monitoramento bastante extensivo do mar. Estamos crescendo muito nisso.” O processo de monitoramento do oceano no Brasil é um dos objetivos do recém formado Instituto Nacional de Pesquisas Oceânicas (INPO), instituído em 2023 pelo MCTI.

“Amazônia Azul” tem uma plataforma continental com 5,7 milhões de km². Foto: Divulgação

Apesar do baixo investimento global de recursos científicos, o oceano é responsável pelo fornecimento de alimento e condições de vida para mais de 3 bilhões de pessoas no mundo. As atividades oceânicas mantém cerca 30 milhões de empregos diretos, gerando uma riqueza equivalente a US$ 3 trilhões por ano, de acordo com dados da Unesco. Isso significa que o oceano poderia ser classificado como umas das oito maiores economias do mundo, considerando o Produto Interno Bruto (PIB).

Propostas do grupo para o planejamento e gestão sustentável do oceano

Marinez atuou como coordenadora-geral do Gerenciamento Costeiro (Gerco) e do PEM no Departamento de Oceano e Gestão Costeira do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima entre 2023 e 2024. Por esta e todas outras experiências profissionais, foi designada pelo governo brasileiro como representante do país no Grupo de Trabalho da Unesco. No cargo de copresidente, a professora da UFSC é a única representante do Brasil na gestão e divide a coordenação com Gunnar Finke, consultor da Cooperação Alemã para o Desenvolvimento (GIZ).

Segundo Marinez, o grupo tem até junho para elaborar e apresentar uma proposta de plano de trabalho ao COI. A partir disso, serão definidas as estratégias e ações a serem direcionadas, assim como o tempo de gestão de acordo com o planejamento.

A professora aponta que a aplicação das atividades propostas pelo grupo estão em sintonia com o contexto da discussão ambiental brasileira, que, com a realização de eventos internacionais como o G20 e a COP 30 tem sido central no cenário internacional. “O Brasil, tendo sido presidente do G20 no ano passado, em que esses temas foram levantados e ratificados por todos os países e, agora presidente da COP 30 do clima, é muito importante que nós realmente desenvolvamos essas ações, porque o oceano, ele pode ser, e é, o nosso maior aliado contra o combate às mudanças do clima”, afirma.

Atualmente, estima-se que o Brasil seja responsável pelo descarte de 3,44 milhões de toneladas de plástico no oceano anualmente. No mundo, a soma de resíduos plásticos acumulados na água é de 80 a 156 milhões de toneladas. Os dados são de um estudo do projeto Blue Keepers divulgado em 2022, realizado pelo Pacto Global da ONU no Brasil.

Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) adverte que os oceanos recebem cerca de 13 milhões de toneladas de plástico anualmente, o seria equivalente a descarregar 2,5 caminhões com 10 toneladas de lixo por minuto no mar.

Participação da UFSC na preservação do oceano

Para além da expansão dos estudos internacionais acerca do oceano, Marinez aponta que a participação da UFSC no grupo de trabalho como representante do Brasil traz grande visibilidade ao conhecimento produzido pelos pesquisadores dentro da Universidade também em outras iniciativas voltadas à preservação ambiental, como Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) e os projetos do programa Horizonte 2020 (H2020)


A UFSC tem um potencial e um corpo docente e de pesquisadores muito forte e muito importante no cenário nacional e internacional.

Marinez Scherer, copresidente do Grupo
de Trabalho em Planejamento e Gestão
Sustentável do Oceano da Unesco


“Há pessoas de vários setores da UFSC, da aquicultura, da engenharia, da oceanografia, da biologia, que estão envolvidos nesses projetos internacionais. A UFSC tem um potencial e um corpo docente e de pesquisadores muito forte e muito importante no cenário nacional e internacional”, diz.

Vinícius Graton [email protected]
Estagiário da Agecom | UFSC
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