Brasil avança em data centers e caminha para se tornar a nova fronteira do setor

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No momento em que o mundo observa o crescimento acelerado da inteligência artificial (IA), com a previsão de que as big techs investirão, por ano, centenas de bilhões de dólares para estarem na liderança do tema, o Brasil tem sido apontado como a nova fronteira para um elemento importante nessa corrida: os data centers.

A crescente digitalização da população e das empresas e a questão da disponibilidade de terrenos e energia limpa abundante tornam o País um território fértil para investimentos em data centers, que podem crescer ainda mais com a IA.

Uma pesquisa feito pela consultoria imobiliária CBRE, cujos principais dados foram antecipados com exclusividade ao NeoFeed, mostram que o mercado latino-americano de data centers inicia 2025 com 877 megawatts (MW) de estoque total, alta de 7,7% ante 2024.

A expectativa é de que a região termine 2025 com mais 340 MW, o que representaria a segunda maior entrega da série histórica da CBRE, iniciada em 2018. A previsão para este ano só perde para 2021, quando a América Latina expandiu 31%.

“Esse número [340 MW] pode ser ainda maior dependendo de como andar a macroeconomia e o apetite das big techs para novos contratos na região”, diz Alison Takano, responsável pela área de data center da CBRE para América Latina, destacando que a capacidade instalada na América Latina deve alcançar 2,6 gigawatts (GW) em 2030.

Desses 340 MW de crescimento previstos para este ano, o levantamento projeta que 220 MW virão do Brasil, que atualmente possui um estoque total de 595 MW instalados, sendo o principal parque da região, que conta com grandes centros no Chile, na Colômbia e no México.

Com a IA nos estágios iniciais, o crescimento contratado para a indústria de data center no Brasil e na América Latina nos próximos anos ainda será puxado majoritariamente pelo avanço tardio da digitalização na região, apesar dos operadores já começarem a conversar com big techs e hyperscalers sobre suas necessidades.

As empresas seguem em ritmo acelerado de crescimento, construindo e adaptando data centers para que possam atender a demanda tanto do movimento de digitalização, quanto os primeiros movimentos de IA.

Com 24 data centers em operação na América Latina, sendo 20 no Brasil, a Ascenty, uma joint venture entre Brookfield e a Digital Realty, planeja para esse ano entregar uma nova unidade, no Chile, elevando a capacidade instalada de 333 MW para 349 MW.

A empresa conta com mais dez data centers em construção ou desenvolvimento, entre Brasil, Chile, México e Colômbia, investindo anualmente entre R$ 1,2 bilhão e R$ 1,5 bilhão para expandir suas operações. Fora os investimentos em data center, a companhia também investe em sua própria rede de fibra óptica, contando atual com cerca de 5 mil quilômetros de cabos, interconectando os diferentes parques.

No Brasil, a Equinix conta com três data centers no Rio de Janeiro, com o terceiro recém-inaugurado, investindo mais de R$ 500 milhões. Em São Paulo, são cinco unidades, com um sexto previsto para ser entregue no começo do ano que vem. No total, a companhia anunciou quase R$ 1,5 bilhão em investimentos desde 2011 no Brasil e quase US$ 3 bilhões na América Latina.

A Scala Data Centers possui 12 data centers em operação e 11 em construção. No total, a empresa informou ter R$ 27 bilhões de investimentos comprometidos no Brasil até o final de 2026, com um dos projetos sendo a construção de um distrito industrial de data centers em Eldorado do Sul, no Rio Grande do Sul. A empresa assinou um protocolo de intenções com o governo gaúcho, no ano passado, prevendo investir quase R$ 3 bilhões no empreendimento.

E a Elea Data Centers conta com nove data centers, com um total de aproximadamente 30 MW operacionais disponíveis para venda. A empresa está na fase final de planejamento para reaproveitamento de um dos data centers em Alphaville, município de Barueri, em São Paulo, previsto para ser entregue até o final do ano.

A companhia, que conta com o Goldman Sachs como investidor, também vem expandindo via aquisições, tendo adquirido dois data centers em São Paulo da americana DXC Technology, no ano passado. O valor da transação não foi revelado.

“O plano geral da companhia é chegar em 2030 com 400 MW de capacidade, o que significa investimentos superiores a US$ 3 bilhões com 100% das entregas”, diz Tito Costa, CRO da Elea. “É uma necessidade colossal de investimento que a indústria deve fazer para sair do lugar que está hoje para chegar a 2030 e atender a demanda projetada para o consumo de cloud mais a IA.”

A onda da IA

A onda IA representa um catalisador da expansão e dos investimentos na indústria de data center, puxados principalmente pela demanda das companhias de treinarem seus modelos, o tal machine learning.

Mas, segundo Victor Arnaud, presidente da Equinix no Brasil, a região ainda colhe os efeitos da “segunda onda estruturante” do mercado de data centers, marcada pela migração de dados para data centers e da adoção da computação em nuvem.

“Antes, o usuário brasileiro e da América Latina consumia o conteúdo vindo de Miami, que concentra a maioria dos cabos que vem para a região. Quando houve um aumento da demanda pela informação em tempo real, acelerada pela pandemia, todos os players internacionais sentiram a necessidade de estar próximo dos usuários”, diz Arnaud.

Takano, da CBRE, diz que, se não tivesse o tema da IA, a indústria continuaria apresentando um crescimento robusto neste ano e nos seguintes. “A demanda da IA ainda é uma parcela pequena comparado com o workload de cloud”, diz.

Na Scala Data Center, a demanda continua sendo maior por data centers voltados para computação em nuvem, ainda que IA comece a pipocar nas conversas com clientes. “Diria que nove de dez projetos que discutimos tem essa divisão, com um ambiente que possa servir essa duas frentes”, diz Cleber Braz, COO da empresa.

Vantagens competitivas do Brasil

O Brasil possui alguns pontos que jogam a seu favor, segundo especialistas ouvidos pelo NeoFeed. A começar pela parte de energia elétrica. Enquanto os data centers atuais possuem uma capacidade de 20 MW a 30 MW para serviços de cloud, quando se fala de IA, é preciso data centers de 150 MW a 200 MW, com alguns podendo alcançar a casa dos GW.

Nessa frente, a matriz energética do País é uma grande vantagem, capaz de atender a demanda com energia limpa. Segundo a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), quase 85% da energia produzida no País vem de fontes renováveis, um ponto que muitas empresas consideram no momento em que querem investir, considerando suas metas de sustentabilidade.

Isso se junta com o fato de o Brasil possuir um preço de energia relativamente baixo, segundo Costa. “Estamos falando de tarifas da ordem de US$ 0,05 a US$ 0,06 por quilowatt/hora, que são tarifas comparáveis com os Estados Unidos e abaixo da Europa em alguns países”, diz Tito Costa, da Elea Data Center.

Outro ponto que joga a favor do País é o fato de estar perto dos Estados Unidos, onde os principais desenvolvimentos estão acontecendo e os principais nomes da indústria estão instalados. “A questão da latência entre Brasil e Estados Unidos, o tempo de resposta, muitas vezes é de 150, 200 milissegundos”, afirma Marcos Siqueira, COO e vice-presidente de vendas da Ascenty.

Desafios

Se o Brasil tem pontos que podem estimular os investimentos, questões internas e externas podem fazer com que os investimentos não venham na escala que poderiam vir.

Um dos principais desafios é a carga tributária. O imposto de importação representa um dos principais entraves, uma vez que ele pode chegar a 60%. É um peso relevante considerando os números com que a indústria trabalha – o benchmark no mercado é que um operador de data center investe aproximadamente US$ 10 milhões por MW.

“Mas enquanto nós investimos US$ 10 milhões por MW, os hyperscalers, os clientes, gastam cinco vezes mais com equipamentos”, diz Costa, da Elea. “A empresa acaba questionando se vale a pena ir ao Brasil e não ao Uruguai, onde tem incentivos fiscais.”

A citação ao Uruguai não é à toa – em agosto, o Google anunciou um investimento de US$ 850 milhões para construir um data center no país vizinho. “O Google vai pagar US$ 0,20 o quilowatt/hora, mas o incentivo fiscal é monumental. A empresa teve uma taxa de imposto de importação de 2% a 3%, nulo quase”, afirma Costa.

Outro ponto é a questão da infraestrutura. Mesmo com disponibilidade de energia, o Brasil ainda sofre na parte de transmissão, com os parques geradores, em sua maioria no Nordeste, longe dos locais em que a vasta maioria dos data centers estão instalados, no Sudeste. Já construir data centers no Nordeste esbarra na questão de falta de cabos de fibra óptica para atender a demanda.

Mesmo se resolvidas todas essas questões, Takano, da CBRE, destaca que existem aspectos externos que podem coibir investimentos vultuosos no País. Ele explica que, quando se vê na mídia notícias sobre investimentos em data centers para IA, boa parte deles estão relacionados a machine learning.

Para este segmento, dois pontos geram dúvidas. Um deles é se os Estados Unidos permitirão que dados americanos sejam deslocados para outros países para a realização dos treinamentos. O segundo é sobre qual o futuro desses modelos após a chegada do DeepSeek, de custos supostamente menor.

“Existe uma perspectiva de redução do consumo de energia, reduzindo o pipeline para IA, gerando dificuldade de vislumbrar um grande movimento de vinda dos dados americanos para o Brasil para processamento de machine learning”, diz.

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Neofeed

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