Evento celebra 100 anos de Elizabeth

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O Memorial das Ligas e Lutas Camponesas, localizado em Sapé, município da região da Mata paraibana, será palco, nos dias 13, 14 e 15 de fevereiro, do Festival Cultural da Memória Camponesa. O evento celebra o centenário da paraibana Elizabeth Teixeira, uma das maiores líderes camponesas do Brasil. O evento contará com exposições, apresentações culturais e homenagens.

Símbolo de luta e resistência, Elizabeth completará 100 anos no dia 13 de fevereiro. A homenageada é conhecida por sua atuação à frente das Ligas Camponesas, principalmente após a morte de seu marido, João Pedro Teixeira, assassinado a mando de grandes latifundiários da época.

Segundo a camponesa e presidenta do Memorial das Ligas e Lutas Camponesas, Alane Lima, o movimento surgiu como uma resposta à desigualdade na distribuição de terras e à exploração das famílias camponesas. Historicamente, ela conta que os camponeses eram os responsáveis por cultivar a terra, mas não tinham acesso à sua propriedade. “Essa situação os deixava em uma posição de vulnerabilidade e dependência, sem acesso a políticas básicas de moradia, alimentação, cultura e educação”, ressalta.

Alane relembra que, durante as décadas de 40 e 50, a realidade no campo era marcada por violência e exploração. Os proprietários de terra tratavam os camponeses como servos, negando-lhes autonomia e direitos básicos. “Muitas famílias viviam em condições precárias, sem sequer ter o direito de enterrar seus mortos com dignidade, pois não tinham acesso a caixões”.

Ela explica, ainda, que em 1960 a luta pela reforma agrária emergiu como uma chave para a libertação dos camponeses. Eles começaram a se organizar e a enfrentar tanto os proprietários de terra quanto o governo, que os mantinham em uma situação de exploração. “A mobilização das ligas camponesas foi fundamental para desafiar o modelo de concentração de terras e buscar uma sociedade mais justa, onde os camponeses pudessem ter acesso à terra e aos direitos básicos para uma vida digna”.

Por uma reforma agrária com a participação ativa dos camponeses

Elizabeth Teixeira desempenhou um papel fundamental nas Ligas Camponesas, destacando-se como mulher e companheira de João Pedro Teixeira, uma das principais lideranças do movimento. Ela assumiu um papel crucial no contexto educativo, na articulação e liderança das Ligas Camponesas, especialmente após a morte de João Pedro. Como líder, Elizabeth conseguiu atrair o maior número de camponeses associados às Ligas em Sapé, demonstrando uma capacidade excepcional de mobilização e articulação.

A presidenta da Liga, Alane Lima, ressalta que Elizabeth não apenas mobilizou os camponeses, mas também manteve firme a luta por uma reforma agrária popular, que permitisse a participação ativa dos camponeses em todo o processo, desde a reivindicação até a construção da política de reforma agrária. “Sua dedicação à causa foi tão profunda que abdicou de sua vida pessoal em prol de um ideal coletivo, acreditando na necessidade de garantir terra, teto e comida para as famílias camponesas”, explica Alane.

Elizabeth defende que, enquanto houver fome e miséria atingindo a classe trabalhadora, vai ter luta dos camponeses. Embora os homens tenham uma predominância nesses movimentos, ela teve o seu papel fundamental de luta. Alane relembra que, graças à luta dela, a Paraíba possui mais de 315 assentamentos de reforma agrária, uma conquista que teve origem na comunidade tradicional de Barra de Antas, em Sapé. “É o resultado da determinação de figuras como Elizabeth e outros líderes, como João Pedro Teixeira, Negro Fuba, Pedro Fazendeiro e Bilpa Catuba”.

Mesmo diante de tragédias pessoais, como o assassinato de seu marido e a perda de sua filha, Elizabeth continuou a lutar por justiça social e pelos direitos da classe camponesa, reforçando seu compromisso com a causa e sua resiliência frente à adversidade.

Classe agricultora foi educada para acreditar que a terra não lhe pertencia

Refletir sobre a memória de Elizabeth Teixeira e daqueles que tiveram suas vidas ceifadas na defesa da reforma agrária e de melhores condições de vida para camponeses é a missão do Memorial das Ligas e Lutas Camponesas, reforça Alane Lima. Ela conta que o espaço do memorial se dedica a homenagear todos os lutadores que dedicaram suas vidas a uma causa coletiva.

 Como produtores de alimentos, os camponeses têm o direito e o dever de garantir sua própria sobrevivência e a da população. Para ela, a luta não pode existir sem memória, e, por isso, é fundamental ter um lugar que trate a luta camponesa como parte da história oficial, desafiando as narrativas tradicionais que muitas vezes glorificam os opressores e ignoram os verdadeiros heróis.

Alane conta, também, que o acesso à terra é um desafio da disputa pela memória. De acordo com ela, historicamente, a classe camponesa foi educada a acreditar que não poderia ter seus próprios espaços de memória. “A criação de museus e lugares de memória desafia estruturas e instituições tradicionais, reafirmando a importância desses espaços como marcos políticos e de território”. O centenário das Ligas Camponesas reafirma a necessidade de centralizar a luta pela reforma agrária e unir organizações e movimentos sociais nessa causa. “A classe camponesa, que produz a alimentação do povo brasileiro, continua inspirada por figuras como Elisabeth Teixeira e tantos outros que dedicaram suas vidas à luta pela terra e pela justiça social”, destaca Alane Lima.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 04 de janeiro de 2025.

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A União

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