Evento extremo que atingiu SC é de difícil previsibilidade, aponta pesquisadora da UFSC

Lestada é evento extremo local que precisa de mais pesquisa.
Foto: Pixabay/Divulgação

O evento extremo que atingiu parte do litoral de Santa Catarina nos últimos dias era de difícil previsibilidade, explica a professora Regina Rodrigues, da Coordenadoria Especial de Oceanografia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e referência nos estudos das mudanças climáticas no Brasil e no mundo. De acordo com ela, por se tratar de um fenômeno local – popularmente conhecido como lestada – existe também um gap no conhecimento científico de sua natureza.

“São nuvens que os satélites não captam. A gente usa muitos dados de satélites para alimentar os modelos. Radares meteorológicos, sozinhos, não fazem previsão”, pontua. Segundo Regina, o radar auxilia os profissionais que estão utilizando os modelos na previsão, mas é preciso investimento em capacitação e recursos humanos para que situações como essas possam ser gerenciadas.

A pesquisadora também lembra que as lestadas são fenômenos locais, característicos da região. “Todo conhecimento que a gente tem é mais do Hemisfério Norte e de pesquisadores de países como Estados Unidos, Europa. Então por isso a gente sabe mais de eventos extremos que ocorrem lá. Esse evento é super localizado e a gente não tem o conhecimento científico, porque não há investimento nisso”.

Presente alterado pelas mudanças climáticas

A intensidade das chuvas, entretanto, foi suficiente para conectá-la a causas que já vêm sendo mapeadas e registradas pela ciência: as mudanças climáticas e os eventos extremos são cada vez mais comuns. “Nos anos em que uma La Nina fraca está para se estabelecer existe uma pré-disposição a isso. Mas mesmo que esteja relacionado a La Nina, é um fenômeno difícil de prever e saber exatamente a localidade”, explica.

O volume de chuvas também leva a pesquisadora a analisar como, efetivamente, se pode usar a previsão. “A previsão é o nosso entendimento do fenômeno, mas os modelos melhoram as simulações usando dados do passado. Com as mudanças climáticas, o passado já não corresponde mais ao que está ocorrendo no presente, então isso dificulta muito a previsão”, comenta. Regina lembra que esse volume de chuva não ocorria no passado. “Duzentos milímetros em 12, 18 horas, não ocorria, ou era muito raro”.

Mesmo com previsão, cidades despreparadas

Mesmo se a previsão do tempo tivesse captado o volume da chuva que atingiu Santa Catarina nos últimos dias, a pesquisadora lembra que seria difícil mitigar os estragos sem planejamento anterior e de longo prazo em prevenção. Ela lembra que, ainda que o alerta antecipado levasse a avisos para que as pessoas ficassem em casa, seria difícil desmobilizar serviços e comércios. “Quando você faz uma previsão, existe uma probabilidade grande de a chuva ocorrer, mas pode ser que ela não ocorra. O que vai ser feito? Os trabalhadores vão ficar em casa e os empregadores vão aceitar essa situação? E se a chuva não ocorre?”.

Para Regina, o que realmente interessa e que poderia ter sido feito é um trabalho de longo prazo que não se vê nas cidades. “No caso de Florianópolis, o plano diretor vai de encontro a isso. O que foi aprovado em 2023 permite construção em áreas de perigo, áreas de encosta. Áreas que eram de preservação agora podem ter construção. Então você está colocando mais cimento, mais concreto, o que piora a situação das enxurradas”.

Cidades esponjas minimizam impactos

A professora da UFSC lembra que é necessário investir em previsão, defesa civil e em ciência para que estes fenômenos não levam localidades à destruição. “O planejamento urbano tem que começar a levar em consideração esses eventos extremos dessa magnitude, com preservação e restauração de áreas de mata nativa”, comenta.

Uma das soluções apontadas pela professora é o conceito de cidades esponjas. De acordo com ela, na China e em outros lugares da Ásia isso já está sendo implementado. “Com preservação, manejo e restauração de matas nativas, manguezais e investimento em mais áreas e parques ecológicos dentro da cidade, mais arborização, você minimiza esse impacto quando tem uma chuva forte”.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.