SP fecha 2024 com 65% mais mortos pela PM do que em 2023; média é de duas vítimas por dia


De 1º de janeiro a 31 de dezembro do ano passado, 760 pessoas foram mortas por policiais militares, contra 460 em 2023. Em 2022, com a ampliação das câmeras corporais, SP teve o menor número de mortes cometidas por PMs em serviço da história. Em dezembro, Tarcísio admitiu que tinha uma visão equivocada sobre as câmeras. Câmera corporal mostra abordagem de PM que matou estudante de medicina
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As mortes cometidas por policiais militares no estado de São Paulo aumentaram 65% em 2024, segundo ano da gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos), se comparado a 2023, de acordo com dados do Grupo de Atuação Especial da Segurança Pública e Controle Externo da Atividade Policial, do Ministério Público.
De 1º de janeiro a 31 de dezembro do ano passado, 760 pessoas foram mortas por policiais militares, contra 460 em 2023.
Dessas 760 mortes, 640 foram praticadas por policiais em serviço, ou seja, trabalhando, e 120, de folga. Uma média de duas pessoas mortas por dia.
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Em nota enviada anteriormente, a Secretaria da Segurança Pública afirmou que “todos os casos de morte decorrente de intervenção policial que ocorrem em São Paulo são rigorosamente investigados pelas forças de segurança, com acompanhamento das respectivas Corregedorias, Ministério Público e Poder Judiciário” (leia nota completa abaixo).
Se considerarmos todas as forças policiais, como a Polícia Civil e as Guardas Civis, as mortes aumentaram 54% em 2024 – passaram de 542 para 835.
É o segundo ano consecutivo de aumento de mortes praticadas por policiais militares. Tanto em 2024 quanto em 2023, a Polícia Militar realizou operações na Baixada Santista. Elas foram consideradas as mais letais desde o massacre do Carandiru, com 56 mortos, no ano passado, e 28, em 2023.
Um ano antes, em 2022, sob gestão do governador Rodrigo Garcia (DEM), com a ampliação do programa Olho Vivo, das câmeras acopladas nos uniformes dos PMs, o estado de São Paulo registrou o menor número de mortes por PMs em serviço na história (veja gráfico abaixo). A redução da mortalidade de adolescentes em intervenções policiais chegou a 80,1% naquele ano.
Ao alcançar 760 mortes em 2024, o estado voltou para o patamar anterior à introdução das câmeras corporais. Se comparado com 2022, antes do governo Tarcísio, o aumento no número de mortes praticadas por policiais militares aumentou 91%.

No início de dezembro, após uma série de casos de violência policial, o governador admitiu que “tinha uma visão equivocada” sobre o uso de câmeras corporais na farda dos policiais militares e disse que hoje está “completamente convencido de que é um instrumento de proteção da sociedade e do policial”. Ele acrescentou também que não apenas vai manter o programa como o ampliará.
Para a diretora-executiva do Instituto Sou da Paz, Carolina Ricardo, a mudança de discurso é fruto da pressão pública frente à revelação dos casos emblemáticos de violência e o recrudescimento das estatísticas criminais. “O eleitorado não está satisfeito com esse tipo de atuação”.
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“Então esse recuo é tático e acho que é importante, porque de fato o discurso do governador tem impacto na ponta da linha. Mas precisamos ver, ainda não foi feito nada de muito concreto para mostrar que há uma mudança de rumo”, pontuou Carolina.
Nos primeiros dias deste ano, 11 pessoas foram mortas por policiais militares, dentre elas uma adolescente de 16 anos, durante uma abordagem na Zona Leste da capital. A jovem morreu com um tiro disparado por um policial militar após ele dar uma coronhada no irmão dela.
Antes de assumir o governo, no entanto, Tarcísio já dava sinais de que não iria ampliar o programa das câmeras. Ao assumir o cargo, em 2023, confirmou que não adquiriu novas câmeras mesmo com orçamento disponível.
Em 2024, o governo de São Paulo lançou um edital para a contratação de 12 mil novas câmeras corporais para a Polícia Militar. A gravação de vídeos pelo equipamento vai ser realizada de forma intencional, ou seja, o policial será responsável pela escolha de gravar ou não uma ocorrência.
Na prática, a mudança pode dificultar investigações de atos de violência policial porque deixará a decisão sobre ligar ou não o equipamento a cargo dos agentes. Especialista ouvido pelo g1 aponta que a câmera não ser usada durante todo o turno policial pode:
aumentar o uso da força de forma indiscriminada e sem controle;
dificultar a produção de provas para investigações;
diminuir a proteção do próprio policial que possa estar numa situação de risco e/ou ter sua conduta questionada.
STF
Em 26 de dezembro, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luís Roberto Barroso, estabeleceu exigências para o uso obrigatório de câmeras corporais pelos policiais militares de São Paulo.
A decisão chega na esteira de uma série de episódios de violência policial praticados pelos agentes paulistas nas últimas semanas.
De acordo com Barroso, os PMs deverão usar as câmeras:
em operações de “grande envergadura” para restauração da ordem pública
operações que incluam entradas em comunidades vulneráveis
em operações que sejam deflagradas para responder a ataques praticados contra policiais militares
Barroso tomou a decisão em resposta a um pedido do estado de São Paulo, que queria uma definição clara de quando o acionamento das câmeras era obrigatório.
No mesmo dia 26, o governo de São Paulo publicou nota falando sobre a decisão do STF e reconhecendo que o uso obrigatório deverá ocorrer em operações “de grande envergadura para restauração da ordem pública; em operações que incluam incursões em comunidades vulneráveis para restaurar a ordem pública; e operações deflagradas para responder a ataques praticados contra policiais militares”.
“Este uso deve ocorrer desde que estas operações ocorram em regiões em que haja disponibilidade dos equipamentos”, acrescentou o governo.
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Reprodução/GloboNews
Em 9 de dezembro, o STF já havia estipulado a obrigatoriedade. O estado, em seguida, solicitou um detalhamento.
Na decisão, Barroso pondera o fato de que não há câmeras disponíveis em todo o estado. Por isso, ele determinou que os equipamentos devem ser estrategicamente distribuídas para regiões com maior índice de letalidade policial. Ele estabelece também que sejam contemplados os policiamentos ostensivo e preventivo, quando possível.
O estado possui cerca de 80 mil PMs (em todos os turnos), mas somente 10.125 equipamentos de gravação — sendo que apenas metade deles é utilizada por vez, enquanto a outra parcela passa por recargas de bateria e atualizações. O governo prevê que todas as atuais 10.125 câmeras sejam substituídas por um novo modelo, da Motorola, que não grava ininterruptamente, além de ter anunciado a compra de mais 2 mil câmeras, totalizando 12 mil.
No dia 26, o governo de São Paulo publicou nota falando sobre a decisão do STF e reconhecendo que o uso obrigatório deverá ocorrer em operações “de grande envergadura para restauração da ordem pública; em operações que incluam incursões em comunidades vulneráveis para restaurar a ordem pública; e operações deflagradas para responder a ataques praticados contra policiais militares”.
“Este uso deve ocorrer desde que estas operações ocorram em regiões em que haja disponibilidade dos equipamentos”, acrescentou o governo.
Câmeras de gravação ininterrupta
Barroso determinou ainda que sejam usadas câmeras de gravação ininterrupta. O governo Tarcísio de Freitas, no entanto, fez uma compra de câmeras que interrompem a gravação de tempos em tempos, o que o STF não quer.
O tribunal determina a “manutenção do modelo de câmeras de gravação ininterrupta até que seja comprovada, com base em evidências, a viabilidade técnica e a efetividade operacional dos métodos de acionamento das novas câmera”.
O que diz a SSP
“Todos os casos de morte decorrente de intervenção policial que ocorrem em São Paulo são rigorosamente investigados pelas forças de segurança, com acompanhamento das respectivas Corregedorias, Ministério Público e Poder Judiciário. Desde a formação e ao longo de toda carreira, os policiais paulistas passam por cursos de formação e atualização que contemplam disciplinas de direitos humanos, igualdade social, diversidade de gênero, ações antirracistas, entre outras. Além disso, os cursos ao efetivo são constantemente aprimorados e comissões direcionadas à análise dos procedimentos revisam e aprimoram os treinamentos, bem como as estruturas investigativas.”

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