Estudo da UFSC e universidade italiana traz novas descobertas para recuperação pós-AVC

Modelo de dinâmica cerebral utilizado na pesquisa (em cima) e curvas que representam diferentes aspectos dessa dinâmica. Imagem: Divulgação

Combinando física e neurociência, um estudo conduzido por um professor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), em colaboração com pesquisadores da Universidade de Pádua, na Itália, fez descobertas que podem contribuir para o desenvolvimento de tratamentos mais eficazes para distúrbios neurológicos e psiquiátricos, como AVC, epilepsia, Alzheimer e outros. A pesquisa demonstrou que, para promover a recuperação do cérebro após um AVC, é fundamental restaurar o equilíbrio entre a excitação e a inibição nas regiões cerebrais, o que está diretamente relacionado à melhora no desempenho comportamental dos pacientes.

O estudo utilizou dados de ressonância magnética de 120 participantes, entre pacientes pós-AVC e indivíduos saudáveis, recrutados entre 2010 e 2015 para um estudo prospectivo de AVC na Washington University. Esses dados foram processados para criar o conectoma de cada participante, uma representação matemática das conexões cerebrais, modelada na forma de uma rede neural. Além disso, o desempenho comportamental dos pacientes foi avaliado a partir de uma bateria neuropsicológica que mediu o desempenho em oito domínios comportamentais: motricidade (membros esquerdo e direito), linguagem, memória verbal e espacial, atenção no campo visual, desempenho médio de atenção e atenção seletiva.

O estudo Papel da plasticidade homeostática na dinâmica crítica do cérebro após lesões focais por AVC (do inglês, Role of homeostatic plasticity in critical brain dynamics following focal stroke lesions), elaborado pelo professor do Departamento de Física da UFSC Rodrigo Pereira Rocha, fornece uma compreensão profunda de como o cérebro responde às lesões e de como ele se adapta durante o processo de recuperação. Os resultados contribuem para o entendimento da recuperação cerebral, sugerindo que a reorganização das redes neurais e o restabelecimento do equilíbrio entre excitação e inibição são fundamentais para o processo de recuperação após uma lesão.

Plasticidade neuronal e criticalidade cerebral

O estudo aborda o conceito de plasticidade neuronal, a capacidade do cérebro de se adaptar e se reorganizar após danos, e a criticalidade cerebral, que é o estado dinâmico em que o cérebro funciona de forma ideal e flexível. Em um estado de criticalidade, o cérebro opera em um ponto intermediário, nem excessivamente caótico nem rigidamente ordenado, favorecendo a capacidade de responder a estímulos externos, conforme o professor. Exemplos de processos que dependem desse estado incluem a percepção sensorial, a memória e a aprendizagem.

Física e neurociência em conjunto

O professor explica que o cérebro é um sistema altamente interconectado, e uma lesão em uma área pode afetar tanto a região lesionada quanto suas conexões com outras partes do cérebro. Essa desorganização compromete a comunicação entre as regiões cerebrais da rede neural e desequilibra a excitação e inibição em toda a rede. Para investigar isso, a equipe utilizou modelos teóricos da física para simular a dinâmica cerebral de cada indivíduo, ou seja, um modelo virtual do cérebro que usa o conectoma como dado de entrada. O objetivo da pesquisa foi avaliar se a inclusão da plasticidade homeostática, que visa restaurar o equilíbrio entre excitação e inibição no cérebro, poderia recuperar a dinâmica crítica nos indivíduos.

O estudo mostrou que a plasticidade homeostática – ou seja, o equilíbrio entre excitação e inibição no cérebro – foi capaz de restaurar a criticalidade cerebral em alguns pacientes, conforme o professor. Esse retorno à dinâmica crítica foi diretamente relacionado à melhora nas funções cerebrais, sugerindo que a normalização desse equilíbrio pode ser fundamental para a recuperação de funções afetadas por lesões.

A pesquisa foi realizada em colaboração com os pesquisadores e professores Maurizio Corbetta e Marco Zorzi, da Universidade de Pádua, na Itália. O recrutamento foi conduzido pelo professor Maurizio Corbetta, neurologista da Universidade de Pádua e ex-Chefe da Divisão de Neuro-Reabilitação e Diretor de Reabilitação Neurológica da Washington University, de 2001 a 2016. O mapeamento é fruto de um investimento público em ciência básica, com o apoio de agências de fomento dos Estados Unidos.

O professor Rodrigo Pereira Rocha, que aplica conceitos da física para entender fenômenos como lesões cerebrais na neurociência e a condução de água nas plantas na ecologia, destaca a importância da colaboração interdisciplinar. Segundo ele, resolver problemas complexos, como as lesões cerebrais, exige uma abordagem multidisciplinar, pois a física oferece uma maneira única de identificar padrões que outras áreas podem não perceber. A pesquisa ilustra como a física pode trazer novas perspectivas à neurociência, quebrando barreiras entre diferentes campos do conhecimento e criando novas possibilidades no enfrentamento de desafios de relevância social.

Atualmente, Rocha dá continuidade a essa linha de pesquisa, investigando estratégias de estimulação neural que possam favorecer a recuperação da dinâmica crítica cerebral. Esse desdobramento visa explorar abordagens terapêuticas para promover a recuperação das funções cerebrais após lesões, com foco na restauração do equilíbrio entre excitação e inibição nas redes neurais.

Adicionar aos favoritos o Link permanente.