Inflação mais elevada entra no radar de 2025 e desafia rumo dos juros

O cenário desafiador que já se desenhava para os preços no Brasil em 2025 acentuou-se na reta final de 2024. Entre o início e o fim de dezembro de 2024, aumentou a chance de o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), inflação oficial do país, acelerar de um ano para outro, reforçando a percepção entre economistas de que a taxa de juros deve ficar mais alta por mais tempo. O começo de 2025 pode até enganar, com uma rara deflação em janeiro, mas o alívio deve ser pontual.

A mediana das projeções de 74 instituições financeiras e consultorias ouvidas pelo Valor até 20 de dezembro indicava um IPCA de 4,9% em 2024 e de 4,7% em 2025. Com dados até 27 de dezembro, o boletim Focus, pesquisa do Banco Central com agentes financeiros, apontou medianas de 4,9% para 2024 e de 4,96% para 2025. Apenas com as informações colhidas nos últimos cinco dias até a divulgação, a mediana do Focus para 2025 já estava perto de 5,1%. Os dados oficiais de 2024 serão divulgados pelo IBGE no próximo dia 10.

A ARX Investimentos, por exemplo, revisou sua projeção para o IPCA em 2025 de 5,4% para 5,7%, após a divulgação da prévia de dezembro. “Apesar de o índice cheio não ter vindo muito diferente do esperado, a composição não foi boa, com piora na inflação de serviços. Os bens industriais deixaram de ajudar e a alimentação também mostrou inflação forte. Qualitativamente, perdemos o vetor baixista na inflação”, diz Gabriel Leal de Barros, economista-chefe da ARX.

Câmbio

Boa parte da esticada adicional nas projeções de inflação é explicada pela forte desvalorização cambial, fruto da combinação desfavorável de fatores externos e, sobretudo, da elevada incerteza fiscal doméstica. No início de dezembro, o dólar comercial já era cotado a quase R$ 6,10, mas a moeda americana fechou 2024 perto de R$ 6,20.

“O Brasil tinha tudo para ter uma inflação mais baixa em 2025, em torno de 3,9%. Mas o mercado está desancorando as expectativas, parte importante disso pelo receio em relação ao câmbio. Se o dólar ficar em R$ 6,30, R$ 6,20 ou R$ 6, que seja, vai trazer impacto na inflação”, diz André Galhardo, economista-chefe da consultoria Análise Econômica. Sua projeção de IPCA para 2025, em 4,1% no início de dezembro de 2024, foi revisada para 4,7%, com a perspectiva de um dólar em R$ 7 ao fim de 2025.

“A principal variável que vai com o risco Brasil é o câmbio, e o câmbio arrasta todo mundo”, afirma Leonardo Costa, economista do ASA, que projeta inflação de 4,9% em 2024 e de 5,5% em 2025.

Segundo ele, os itens comercializáveis são os primeiros a sofrerem com a desvalorização do câmbio. Até a prévia da inflação de dezembro de 2024, o IPCA-15, os itens comercializáveis apresentavam uma alta de preços acumulada em 12 meses de 5,74%, ante 0,89% em 2023, segundo a MCM Consultores.

Perspectivas de nflação — Foto: Valor Data

Fonte: Valor/Data

“Isso é fruto da inflação de bens, que em 2023 foi muito baixa. Em 2024, além de normalizar, ela foi impactada para cima pelo dólar”, diz João Fernandes, economista da Quantitas. Ele pondera que esse efeito altista do câmbio ainda foi pequeno diante de toda a desvalorização observa ao longo de 2024. “Tem muito para 2025 por vir”, diz. Ele projeta IPCA de 4,8% ao fim de 2024 e de 5,7% em 2025.

João Savignon, economista para Brasil da Kínitro Capital e que tem uma estimativa de IPCA bem elevada para 2025, de 6,5%, diz que os próximos dois a três meses serão “muito importantes, tanto pela dinâmica do repasse cambial, quanto dos alimentos”.

O BTG Pactual prevê que o repasse cambial à inflação de bens industriais, por exemplo, atinja o pico no segundo semestre de 2025, com a alta em 12 meses chegando a 4,3% em outubro e fechando 2025 em 4,2%, ante os 2,8% esperados para 2024.

Energia

Os números do início de 2025 até podem enganar. O pagamento do “bônus de Itaipu” nas faturas de energia elétrica em janeiro pode levar o IPCA do mês a registrar deflação. A MCM, por exemplo, projeta queda de 0,25%.

Se confirmada a expectativa de deflação, será a primeira vez da série do IBGE, iniciada em 1994, com um IPCA negativo em janeiro, época do ano que costuma ser desfavorável para a inflação, sobretudo por causa do clima chuvoso e da consequente pressão sobre os preços dos alimentos “in natura”.

“São dois anos de situação com inflação acima da meta”, diz Flávio Serrano.

Rebote

O efeito, no entanto, é pontual e não afeta as estimativas para o IPCA fechado de 2025. A LCA Consultores espera deflação menor em janeiro, de 0,05%, e nota que, logo em fevereiro, o “rebote” do desconto de Itaipu ajudará a empurrar a inflação no mês para 1,42%.

“Teremos um janeiro com inflação baixinha em razão do bônus de Itaipu, mas depois virá um estouro”, diz Galhardo, da Análise Econômica. “Quando falamos de inflação e olhamos o câmbio, temos dias difíceis pela frente”, afirma.

As estimativas da ARX mostram que, após fevereiro, a inflação deve rodar de 0,4% a 0,5% ao mês e, só no segundo semestre, reduzir um pouco, para 0,2% a 0,3% ao mês. “Existe uma dificuldade de essa inflação cair para um nível mais baixo, porque temos uma tempestade meio que perfeita no cenário inflacionário”, afirma Leal de Barros.

Segundo semestre

A projeção de desaceleração da inflação no segundo semestre, no mês a mês, diz, está condicionada a não haver nenhuma surpresa fiscal nos gastos. “Se houver, haverá viés de alta na inflação de 2025. Será preciso ver a desaceleração econômica se materializando em 2025.”

Com a desaceleração econômica prevista para o segundo semestre de 2025 e a expectativa de uma valorização do real ante o dólar no mesmo período, Flávio Serrano, economista-chefe do Bmg, diz pensar que será possível observar “uma descompressão da inflação mais relevante nesse período”.

Ainda assim, ele revisou sua estimativa de IPCA em 2025 de 4,5% para 4,8%, por causa de efeitos inerciais de choques repassados, por exemplo, à inflação de serviços, que sente o mercado de trabalho apertado.

“O IPCA de 2025 fica parecido com o de 2024, entre 4,5% e 5%, mas acima dos 4,5%. Então, são dois anos de situação com inflação acima da meta”, diz Serrano. A meta de inflação em 2024 e 2025 é de 3%, com tolerância de até 4,5%. O cenário do economista do Bmg considera um câmbio com dólar a R$ 5,70 ao fim de 2025, mais otimista que os R$ 5,96 da mediana do Focus. Isso, porém, ressalta, depende do cenário externo e do quadro fiscal doméstico.

A inflação de serviços também não deve dar alívio em 2025. O BTG Pactual vê a inflação de serviços passando de 5% em 2024 para 6,2% em 2025. Os serviços subjacentes – mais sensíveis ao ciclo econômico e à política monetária e, portanto, acompanhados de perto pelo BC – devem ir de 5,8% para 5,9%, após atingir pico de 6,6% em 12 meses até setembro.

 

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