Diretor do Deic afastado após ser citado em delação sobre corrupção policial e elo com PCC nega ter cobrado propina: ‘injustiçado’


Governo afastou os delegados Fábio Lopes, do Deic, e Murilo Roque, de São Bernardo. Vinicius Gritzbach os citou em denúncia. Empresário foi morto após delação ao MP. Político Antonio Olim, que é delegado, também foi mencionado. Citados negam irregularidade. Delegado do Deic, Fábio Pinheiro
Kleber Tomaz/g1
O delegado Fábio Pinheiro Lopes, afastado nesta sexta-feira (20) pelo governo estadual da direção do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic) de São Paulo após ser citado em uma delação ao Ministério Público (MP) sobre corrupção policial e elo de agentes com o Primeiro Comando da Capital (PCC), negou as acusações. Ele afirmou que vai entrar com uma ação por calúnia.
Em entrevista coletiva convocada por ele na Associação de Delegados do Estado de São Paulo (Adpesp), Fábio Caipira, como é conhecido, desmentiu a informação de que tenha cobrado propina de Vinicius Gritzbach para não responsabilizá-lo criminalmente por lavagem de dinheiro.
“Puto, injustiçado, eu tenho 32 anos de polícia, você pode ver minha carreira”, disse Caipira ao dizer aos jornalistas como estava se sentindo com o afastamento por causa da delação de Gritzbach. “O governador [Tarcísio de Freitas (Republicanos)] tem as razões dele, mas tenho certeza que na hora que tudo se esclarecer, ele vai ver que se antecipou e a gente vai voltar para o lugar da gente”.
Gritzbach denunciou o diretor do Deic e outros delegados antes de ser assassinado a tiros em 8 de novembro no Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos. O delator era empresário do ramo imobiliário e foi indiciado por lavagem de dinheiro pelo departamento.
Delegados Fábio Pinheiro Lopes e Rafael Cocito, do Deic em São Paulo
Kleber Tomaz/g1
Diretor do Deic e delegado da Polícia Civil são afastados das funções
Réu nesse crime, Gritzbach aceitou fazer uma delação premiada com o MP para ter a pena reduzida caso fosse condenado pela Justiça.
Em troca, contou que o seu então advogado, Ramsés Benjamin Samuel Costa Gonçalves, pediu R$ 5 milhões para ajudá-lo, sendo R$ 800 mil em honorários advocatícios.
E o restante, R$ 4,2 milhões seriam como repasse do pagamento de propina a Caipira e mais outros dois delegados: Murilo Fonseca Roque, atualmente lotado numa delegacia de São Bernardo do Campo, e Antonio Olim, que já era deputado estadual pelo PP à época.
O empresário falou ainda que pagou parte desse valor em dinheiro e que outro montante foi pago por meio de uma transferência bancária de R$ 300 mil em 2022. Ele também contou que deu dois apartamentos e cheques para quitar o acordo.
Escrituras dos imóveis mostram que eles foram vendidos para o advogado e uma parente dele.
Governo de São Paulo decide afastar dois delegados no caso Gritzbach
Mas essa versão apresentada por Gritzbach não se sustenta, segundo Caipira. Segundo o diretor afastado do Deic, foi Olim quem ligou para ele pedindo que conversasse com Ramsés sobre o caso de seu cliente. Mas que o deputado foi enganado pelo advogado.
“O advogado foi e contou uma história. E pra mim, o advogado enganou o Vinicius [Gritzbach] e usou o meu nome, usou o nome de um delegado que e não conheço e usou o nome de dois deputados honrados”, falou Caipira, que pretende entrar com uma ação por calúnia contra Ramsés.
Procurada pela equipe de reportagem, a defesa de Ramsés negou que tenha dito a Gritzbach que os delegados cobraram propina para não incriminá-lo por lavagem de dinheiro. Afirmou ainda que as denúncias não são verdadeiras e que seu cliente nunca contribuiu para corromper agentes públicos.
O delegado Murilo, que também foi afastado nesta sexta pelo governo por ter tido o nome citado na delação do empresário, não foi localizado para comentar o assunto.
O delegado Olim, que já estava licenciado da Polícia Civil pelo fato de ser deputado, negou as acusações que Gritzbach fez na delação. “Recebo, com veemente indignação, notícias acerca do meu nome e de outras honradas autoridades com fatos nebulosos, imprecisos e improvados, os quais não guardam qualquer relação com a realidade”, informa nota divulgada pelo político.
De acordo com fontes da equipe de reportagem, a força-tarefa criada pelo governo investiga se os três delegados cometeram alguma ilegalidade. Eles responderão em liberdade.
As denúncias contra delegados fizeram o governo do estado decidir por algumas mudanças nos principais departamentos da Polícia Civil.
Outros policiais foram delatados
Presos e procurado na operação da PF e do MP em São Paulo
Reprodução
Gritzbach também denunciou mais sete policiais que estavam ligados ou tinham contato com o Departamento Estadual de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP).
Eles foram delatados por Gritzbach ao Ministério Público por suspeitas de corrupção e envolvimento com o PCC. Seis deles estão presos, incluindo outro delegado, e um está foragido. As prisões foram feitas nos últimos dias pela Polícia Federal (PF) em ação conjunta com o MP.
São eles: o delegado Fábio Baena, os investigadores Eduardo Lopes Monteiro, o “Du”, Marcelo Roberto Ruggieri, o “Xará”, Marcelo Marques de Souza, o “Bombom”, Valmir Pinheiro, o “Bolsonaro” e o agente policial Valdenir Paulo de Almeida, o “Xixo”.
O agente da Polícia Civil, Rogério de Almeida Felício, o “Rogerinho Punisher” fugiu e não foi preso.
Também foram presos pela PF o advogado Ahmed Hassan Saleh, o “Doutor Mudi”, e os empresários Ademir Pereira de Andrade e Robinson Granger de Moura, o “Molly”. Assim como os policias, eles acabaram delatados por Gritzbach.
Eles são suspeitos de lavagem de dinheiro e elo com o Primeiro Comando da Capital. Ainda de acordo com a investigação, parte do grupo movimentou junto ao menos R$ 72 milhões de maneira ilegal nos últimos cinco anos.
Como funcionava o esquema
PF: investigados por elo com PCC movimentaram R$72 milhões
De acordo com a PF e o MP, para lavar o dinheiro os investigados investiam dinheiro da propina paga pelo PCC aos policiais e do tráfico de drogas da facção criminosa em negócios imobiliários e na abertura de contas de empresas-fantasma.
A investigação identificou essa movimentação financeira irregular dos oito investigados entre 2018 e 2022.
Gritzbach acusou policiais de cobrarem R$ 40 milhões de propina para não responsabilizá-lo pelos assassinatos de dois membros do PCC. O empresário era investigado pelo Departamento Estadual de Homicídios e Proteção à Pessoa por suspeita de ter mandado matar Anselmo Becheli Santa Fausta, o “Cara Preta”, e Antônio Corona Neto, o “Sem Sangue” em 2021.
Ele não pagou o dinheiro do suborno e foi indiciado pela polícia pelos homicídios.
Execução de Gritzbach
Caso Gritzbach: novas imagens mostram momento da execução do empresário
Câmeras de segurança gravaram o crime cometido por dois homens encapuzados e com fuzis que fugiram em seguida (veja vídeo acima). Um motorista por aplicativo foi atingido por um dos disparos e também morreu.
Dois suspeitos de participarem da execução dele foram presos dias depois pela força-tarefa criada pelo governo paulista para investigar o caso. Matheus Augusto de Castro Mota e Matheus Soares Brito teriam ligação com o Primeiro Comando da Capital.
O terceiro suspeito procurado como foragido pelo homicídio do empresário é Kauê do Amaral Coelho. Segundo a força-tarefa, mais pessoas podem estar envolvidas no crime.
Além de investigarem o possível envolvimento do PCC no assassinato de Gritzbach, as autoridades apuram a hipótese de que policiais possam ter participado da execução dele. Um áudio gravado pelo empresário mostra uma conversa entre um membro da facção oferecendo R$ 3 milhões a policiais para matá-lo.
A equipe de reportagem tenta localizar as defesas dos oito investigados para comentar o assunto.
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