‘Nem formiga, nem leão’: conheça inseto conhecido como engenheiro das areias


Larva de formiga-leão cria armadilhas em solos arenosos da Caatinga e Cerrado para caçar alimentos. Formiga-leão cria armadilhas engenhosas e letais que a tornam uma caçadora impressionante do mundo dos invertebrados
César Favacho
Na Caatinga e no Cerrado, sob o calor escaldante e os solos arenosos, um pequeno predador aguarda silenciosamente sua presa. Ela não é uma formiga, tampouco um leão, mas combina características que justificam o nome.
A formiga-leão é, na verdade, a larva de um inseto da família Myrmeleontidae, e seu talento está em criar armadilhas engenhosas e letais que a tornam uma caçadora impressionante do mundo dos invertebrados.
Apesar do nome, uma tradução do latim “Myrmeleon”, que significa “leão-das-formigas”, essas larvas não caçam apenas formigas. São predadores generalistas, capazes de capturar qualquer inseto ou até pequenos vertebrados que caiam em suas armadilhas, como explica o entomólogo Leon Tavares.
“As presas mais comuns são formigas devido à abundância delas no habitat, mas já foram registradas formigas-leão predando até lagartas, larvas de besouros e até outras formigas-leão. São extremamente adaptáveis”, destaca.
Apesar do nome, uma tradução do latim “Myrmeleon”, que significa “leão-das-formigas”, essas larvas não caçam apenas formigas
mr_t_explorer/iNaturalist
Armadilha perfeita
As formigas-leão constroem buracos cônicos na areia que funcionam como armadilhas mortais. Para isso, elas cavam “em marcha ré”, ou seja, andando de trás para frente, empurrando a areia com suas mandíbulas afiadas, como se fossem pás.
Essa engenhosidade não é mero acaso: estudos mostram que o tamanho do funil é proporcional ao tamanho da larva, maximizando sua eficácia como predadora.
Formigas-leão cavam “em marcha ré”, empurrando a areia com suas mandíbulas afiadas, como se fossem pás
César Favacho
“Quando um inseto escorrega para dentro do funil, a larva dispara areia para evitar a fuga. Se necessário, usa suas mandíbulas para atordoar a presa com movimentos rápidos, como um bate-estaca”.
“Outro segredo está em sua sensibilidade. As larvas possuem cerdas espalhadas pelo corpo que detectam vibrações no solo. Assim, conseguem perceber a aproximação de uma presa, mesmo quando estão enterradas”, completa Tavares.
Adaptações que impressionam
O corpo da formiga-leão é um exemplo de evolução adaptativa. Entre suas características mais notáveis estão:
Mandíbulas afiadas e dentadas, usadas para agarrar e imobilizar presas;
Cerdas especializadas (dolichasters), que auxiliam na escavação e percepção do ambiente arenoso;
Glândulas de peçonha, que ajudam a matar rapidamente as presas;
Uma articulação entre a cabeça e o tórax, que permite movimentos rápidos e precisos, facilitando o ataque.
Essas adaptações, somadas ao comportamento estratégico, fazem da formiga-leão uma predadora eficiente e objeto de estudo em ecologia.
E depois de crescer?
Quando adultas, as formigas-leão abandonam as armadilhas e se tornam insetos voadores, semelhantes a libélulas.
Quando adultas, as formigas-leão abandonam as armadilhas e se tornam insetos voadores, semelhantes a libélulas
César Favacho
Embora algumas espécies continuem predando, outras passam a se alimentar de néctar ou pólen, desempenhando um papel diferente no ecossistema. No entanto, como ressalta Tavares, “o comportamento e a dieta dos adultos ainda são pouco conhecidos pela ciência”.
Por que areia?
Ambientes arenosos, como a Caatinga e o Cerrado, são ideais para as formigas-leão. A textura solta da areia permite que elas cavem facilmente suas armadilhas e não impede seus movimentos.
“O substrato úmido ou compacto dificulta a escavação e pode até fazer com que morram de fome por não conseguirem caçar”, explica o pesquisador.
Ambientes arenosos são ideais para as formigas-leão, pois a textura solta da areia permite que elas cavem facilmente suas armadilhas
Doug Charlton/iNaturalist
Embora sejam mais abundantes em regiões áridas ou semiáridas, essas larvas também podem ser encontradas em ambientes florestais, adaptando-se a microhabitats como cavernas, buracos de árvores e até serragem deixada por cupins.
Equilíbrio ecológico em ação
Além de serem predadoras fascinantes, as formigas-leão ajudam a controlar populações de insetos e mantêm o equilíbrio de ecossistemas como a Caatinga e o Cerrado.
Lugares como a Serra das Almas, no Ceará, e outras regiões arenosas no Brasil são exemplos perfeitos de onde observar essas engenheiras naturais.
Pequenas no tamanho, mas gigantes no impacto, as formigas-leão são mais uma prova da incrível diversidade da natureza brasileira.
Da próxima vez que você andar por solos arenosos, fique atento aos pequenos funis no chão. Eles podem esconder um dos caçadores mais habilidosos e discretos do reino animal.
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