Unicamp repudia suposta participação de professor em relatório usado na trama golpista para questionar urnas


Universidade lamentou aparente participação do docente e reiterou ‘longa tradição de luta pela democracia’. Paulo Lício de Geus, do Instituto de Computação, não foi indiciado. Unicamp repudia suposta participação de professor em relatório usado na trama golpista para questionar urnas
Marcelo Gaudio/Reprodução
A reitoria da Unicamp repudiou, em nota, a suposta participação do professor Paulo Lício de Geus, do Instituto de Computação, na elaboração e revisão do relatório usado pelo Partido Liberal (PL), sigla do ex-presidente Jair Bolsonaro, para questionar a integridade das urnas eletrônicas.
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Em nota divulgada na quinta-feira (28), a universidade lamentou a aparente participação do docente e reiterou a “longa tradição de luta pela democracia e de alinhamento com os valores democráticos que remonta à década de 1970”. Veja, abaixo, a publicação na íntegra.
“Dessa forma reiteramos nosso profundo compromisso institucional com a defesa do Estado Democrático de Direito e repudiamos toda e qualquer tentativa de resolver a disputa de ideias na sociedade que não seja a expressão soberana de nosso povo nas urnas, de acordo com as regras estabelecidas pela Justiça Eleitoral de nosso país”, diz o texto.
Plano golpista era delirante, mostra relatório da PF
Sem provas
O relatório foi apresentado ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por Valdemar da Costa Neto, presidente do PL, em 22 novembro de 2022 e, segundo a PF, apresentava alegações falsas sobre possíveis fraudes nas urnas eletrônicas no segundo turno do pleito. À época, o TSE multou o partido em R$ 23 milhões por não apresentar provas de irregularidades no sistema eleitoral.
De acordo com a investigação, esse núcleo da organização criminosa, o “Núcleo de Desinformação e Ataques ao Sistema Eleitoral”, era responsável por incitar a população contra o resultado das eleições presidenciais de 2022 e, assim, abrir caminho para eventuais medidas antidemocráticas contra a Justiça Eleitoral.
Trocas de mensagens, contudo, mostram que, três dias antes do relatório do PL ser divulgado, o professor reconheceu que havia encontrado explicação para alegações sobre o suposto funcionamento irregular das urnas eletrônicas. E, além disso, Geus afirmou categoricamente que, após analisar um pedido de Costa Neto, não encontrou urnas com votação anormal no segundo turno de 2022.
“VCN (Valdemar Costa Neto) queria também relação de urnas com votação anormal em horários estranhos, mas no 2T (2ºturno) descobri que isso praticamente não existe (se tanto, algumas poucas urnas)”, mostra mensagem obtida pela PF.
O g1 conversou com o professor Paulo Geus por telefone, mas o docente se limitou a dizer que não tinha “nada a declarar” sobre as citações no inquérito da Polícia Federal.
Mensagens recuperadas pela PF mostram ligação do professor Paulo Geus e Eder Baldino na elaboração de relatório que questionava integridade das urnas
Reprodução
Abastecimento de influenciadores
Paulo Geus não foi indiciado. O relatório final da PF no entanto, aponta que o professor abasteceu influenciadores, como Fernando Cerimedo, blogueiro argentino indiciado no inquérito, com informações falsas sobre as urnas eletrônicas.
Além disso, o professor enviou a Éder Balbino, empresário que ajudou nos questionamentos do PL às urnas, apontamentos sobre o suposto funcionamento irregular dos logs (registro de dados) do sistema eletrônico de votação.
“O conteúdo das mensagens ratifica a atuação coordenada dos membros da organização criminosa, evidenciando que as pessoas que estavam trabalhando para o IVL e o PL, também abasteciam com informações falsas influenciadores, como o argentino Fernando Cerimedo, para propagarem fake news sobre as urnas eletrônicas, no sentido de incitar a população contra o resultado das eleições presidenciais de 2022”, aponta a PF.
Professor abasteceu blogueiro e interlocutor da PF de questionamentos falsos sobre as urnas eletrônicas
Reprodução
Quem é o professor?
Paulo Lício de Geus é professor titular do Instituto de Computação da Unicamp. Segundo a página da universidade, ele atua no Departamento de Ciências de Computação e é especialista em segurança computacional.
Em nota, a Unicamp afirma que tomou conhecimento dos fatos na quarta-feira (17) pela imprensa e que “segue acompanhando atentamente os desdobramentos da investigação conduzida pela Polícia Federal”.
Trama golpista
Lista de indiciados pela PF no inquérito sobre golpe
Reprodução
O relatório da Polícia Federal (PF), que teve sigilo retirado pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), descreve a participação de citados e indiciados no “inquérito do golpe” a partir de seis áreas de atuação.
O conteúdo da investigação foi enviado ao Supremo na última quinta-feira (21) e indicia 37 pessoas por envolvimento na suposta trama golpista, com o objetivo de impedir que o presidente Lula (PT) tomasse posse após ser eleito em 2022.
Segundo o documento, os envolvidos no suposto esquema de ataque ao sistema democrático atuaram nos seguintes núcleos:
Núcleo de Oficiais de Alta Patente com Influência e apoio a Outros Núcleos
Núcleo de Inteligência Paralela
Núcleo Operacional de Apoio às Ações Golpistas
Núcleo Jurídico
Núcleo Responsável por Incitar Militares a Aderirem ao Golpe de Estado
Núcleo de Desinformação e Ataques ao Sistema Eleitoral
Nota da Unicamp
“O Relatório n° 4546344/2024 da Polícia Federal indica a participação de um professor de nosso quadro docente nas atividades antidemocráticas que visaram à abolição do Estado Democrático de Direito em nosso país, em especial por meio da tentativa de embasar a contestação do resultado das eleições presidenciais de 2022. Lamentamos profundamente que um membro de nossa comunidade tenha, aparentemente, se associado a ações coordenadas a fim de disseminar informações falsas sobre o processo eletrônico de votação.
Nossa Universidade tem uma longa tradição de luta pela democracia e de alinhamento com os valores democráticos que remonta à década de 1970. Essa luta se materializou nas diversas batalhas que travamos, junto a setores da sociedade civil, para reconquistá-la, fortalecê-la e ampliá-la e para amplificar seu conteúdo de justiça social. Essa luta também se expressou por meio da atuação de grandes nomes de nosso quadro de docentes.
Dessa forma reiteramos nosso profundo compromisso institucional com a defesa do Estado Democrático de Direito e repudiamos toda e qualquer tentativa de resolver a disputa de ideias na sociedade que não seja a expressão soberana de nosso povo nas urnas, de acordo com as regras estabelecidas pela Justiça Eleitoral de nosso país.
Campinas, 28 de novembro de 2024
Reitoria da Universidade Estadual de Campinas”
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