{"id":334,"date":"2024-02-14T07:56:08","date_gmt":"2024-02-14T10:56:08","guid":{"rendered":"https:\/\/agencia4.jornalfloripa.com.br\/leragencia4\/334"},"modified":"2024-02-14T07:56:08","modified_gmt":"2024-02-14T10:56:08","slug":"sociedade-e-resistente-a-presenca-de-mulheres-em-espacos-de-destaque-diz-secretaria-da-sbpc","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/agencia4.jornalfloripa.com.br\/leragencia4\/334","title":{"rendered":"\u201cSociedade \u00e9 resistente \u00e0 presen\u00e7a de mulheres em espa\u00e7os de destaque\u201d, diz secret\u00e1ria da SBPC"},"content":{"rendered":"
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Professora Maria Elisa M\u00e1ximo \u00e9 secretaria regional da SBPC, mulher, m\u00e3e e cientista. Foto: Arquivo Pessoal<\/p>\n<\/div>\n

A secret\u00e1ria regional em Santa Catarina da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ci\u00eancia (SBPC), Maria Elisa M\u00e1ximo, considera o fator estrutural como uma das principais causas de distor\u00e7\u00f5es entre os espa\u00e7os e os pap\u00e9is ocupados por homens e mulheres na produ\u00e7\u00e3o do conhecimento. \u201cA desigualdade no meio cient\u00edfico \u00e9, antes e acima de tudo, consequ\u00eancia de uma sociedade desigual, excludente e violenta para meninas e mulheres\u201d, pontua.<\/p>\n

A ado\u00e7\u00e3o de linhas de financiamento e editais espec\u00edficos para mulheres cientistas em diferentes est\u00e1gios da carreira, os incentivos para a forma\u00e7\u00e3o de grupos de pesquisa voltados aos estudos de g\u00eanero e diversidade e os programas de forma\u00e7\u00e3o que incluam o letramento em g\u00eanero s\u00e3o citados por ela como algumas das possibilidades para acelerar o processo de equidade.<\/p>\n

Em entrevista sobre o Dia Internacional das Mulheres e Meninas nas Ci\u00eancias<\/strong>, celebrado neste domingo,\u00a011 de fevereiro<\/strong>, ela, que tamb\u00e9m \u00e9 professora do Departamento de Antropologia da UFSC, m\u00e3e e cientista, citou aqueles que considera os maiores desafios para as carreiras cient\u00edficas das mulheres: a maternidade e a hostilidade do meio acad\u00eamico\u00a0associado ao machismo institucional.<\/p>\n

Leia a entrevista completa
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\"\"<\/a>1 \u2013 Segundo o relat\u00f3rio da Unesco sobre mulheres na ci\u00eancia de 2023, 33,3% \u00e9 a porcentagem m\u00e9dia global de pesquisadoras e apenas 35% de todos os estudantes das \u00e1reas de Ci\u00eancia, Tecnologia, Engenharia e Matem\u00e1tica s\u00e3o mulheres. O que explicaria esses percentuais?<\/strong><\/p>\n

O que mais chama a aten\u00e7\u00e3o nesses dados \u00e9 que, embora muito sutil, a presen\u00e7a de mulheres nas chamadas \u201cci\u00eancias exatas\u201d \u00e9 maior do que nas ci\u00eancias de modo geral. Se j\u00e1 tiv\u00e9ssemos alcan\u00e7ado mais equidade na m\u00e9dia global, mas ainda estiv\u00e9ssemos em minoria nas ci\u00eancias exatas, poder\u00edamos tratar como um problema mais pontual e localizado de um campo cient\u00edfico tradicionalmente ocupado e dominado por homens.<\/p>\n

Mas os n\u00fameros gerais ainda apontam uma grande desigualdade e isso n\u00e3o deixa d\u00favidas de que estamos tratando de um problema estrutural, que transcende o meio acad\u00eamico-cient\u00edfico e diz respeito \u00e0 estrutura da sociedade, ainda patriarcal, machista e resistente \u00e0 presen\u00e7a das mulheres em espa\u00e7os de destaque, de produ\u00e7\u00e3o de status, de exerc\u00edcio de poder, de constru\u00e7\u00e3o de conhecimento, etc. Ou seja, a desigualdade no meio cient\u00edfico \u00e9, antes e acima de tudo, consequ\u00eancia de uma sociedade desigual, excludente e violenta para meninas e mulheres.<\/p>\n

2 \u2013 Em um dos pontos mais altos da carreira de uma mulher cientista no Brasil, que seriam as bolsas de produtividade, dados de 2022 registram que apenas 27% das benefici\u00e1rias s\u00e3o mulheres. Quais seriam as principais barreiras para mulheres ascenderem ao topo da carreira na mesma propor\u00e7\u00e3o que homens?<\/strong><\/p>\n

\"\"<\/a>S\u00e3o muitas as barreiras, mas eu citaria duas que considero centrais e que j\u00e1 passou da hora de termos estrat\u00e9gias e pol\u00edticas p\u00fablicas efetivas para enfrent\u00e1-las. A primeira delas est\u00e1 relacionada \u00e0 maternidade, que efetivamente \u201catrasa\u201d ou desacelera a produ\u00e7\u00e3o cient\u00edfica das mulheres em um mundo acad\u00eamico cada vez mais regido pela l\u00f3gica produtivista. E, nesse ponto, nossa aten\u00e7\u00e3o e cr\u00edtica devem recair sobre a falta de acolhimento e de estrat\u00e9gias de promo\u00e7\u00e3o da equidade para cientistas m\u00e3es, mas tamb\u00e9m temos que ser cr\u00edticos ao produtivismo acad\u00eamico que, de forma geral, vem adoecendo e precarizando a vida daqueles e daquelas que produzem ci\u00eancia no pa\u00eds.<\/p>\n

Nesse contexto, mulheres \u2013 e mulheres m\u00e3es \u2013 s\u00e3o triplamente atingidas pois elas acumulam todas aquelas tarefas e obriga\u00e7\u00f5es inerentes ao trabalho de reprodu\u00e7\u00e3o social, seja dos pr\u00f3prios filhos e filhas, seja de outras pessoas da fam\u00edlia (idosos, doentes etc).<\/p>\n

A outra barreira, mais subjetiva, \u00e9 a persistente hostilidade do meio acad\u00eamico para as mulheres em face do machismo institucional que, infelizmente, ainda \u00e9 uma realidade. S\u00e3o casos de ass\u00e9dio, de tentativas de tutela, de deslegitima\u00e7\u00e3o e de pouca valoriza\u00e7\u00e3o que, muitas vezes, afastam jovens mulheres dos espa\u00e7os de produ\u00e7\u00e3o da ci\u00eancia.<\/p>\n

A imagem do \u201ccientista universal\u201d \u00e9, ainda hoje, a do homem, branco, euroc\u00eantrico e isso faz da academia um lugar ainda regido por uma \u201cgram\u00e1tica\u201d masculina e heteronormativa, centrada no homem cisg\u00eanero. E isso cria, sem d\u00favida alguma, uma s\u00e9rie de barreiras para a ascens\u00e3o das mulheres nas carreiras acad\u00eamicas.<\/p>\n

O enfrentamento dessas barreiras depende, por isso, n\u00e3o apenas de quest\u00f5es objetivas (mais bolsas, editais espec\u00edficos, regras \u2013 e r\u00e9guas \u2013 distintas para mulheres m\u00e3es etc), mas depende tamb\u00e9m de uma vontade pol\u00edtica de todos \u2013 incluem-se a\u00ed os homens \u2013 de promover mudan\u00e7as na pr\u00f3pria cultura acad\u00eamica e cient\u00edfica.<\/p>\n

3 \u2013 Voc\u00ea observa alguma mudan\u00e7a de cultura nestas disparidades de g\u00eanero na Educa\u00e7\u00e3o B\u00e1sica e no Ensino M\u00e9dio? \u00c9 poss\u00edvel vislumbrar um futuro pr\u00f3ximo com mais equidade?<\/strong><\/p>\n

A resposta anterior j\u00e1 responde, de algum modo, essa pergunta. Estamos mudando e avan\u00e7ando devagarinho, mas eu n\u00e3o arrisco dizer que essas mudan\u00e7as j\u00e1 se refletem na estrutura. Isso n\u00e3o nos impede de vislumbrar um futuro pr\u00f3ximo com mais equidade. Pelo contr\u00e1rio, tem muita gente se movimentando e construindo esse futuro.<\/p>\n

Mas fatos recentes como o posicionamento do atual presidente do CNPq sobre movimentos como o Parent in Science<\/em> <\/a>nos mostram, de forma muito evidente, como ainda temos um caminho longo e \u00e1rduo pela frente at\u00e9 conquistarmos mudan\u00e7as estruturais.<\/p>\n

\"\"<\/a>Quando um homem em posi\u00e7\u00e3o de lideran\u00e7a e de poder decis\u00f3rio sobre bolsas, financiamentos de pesquisa etc, diz publicamente que movimentos como o Parent in Science<\/em> \u201catrapalha muito\u201d a gest\u00e3o de uma ag\u00eancia de fomento \u00e0 pesquisa, temos a materializa\u00e7\u00e3o dessa estrutura masculina e machista da ci\u00eancia no Brasil. Se \u201catrapalha\u201d \u00e9 porque exp\u00f5e e coloca em risco esse poder dominante. Se estamos atrapalhando, \u00e9 porque, de algum modo, estamos mudando o estado das coisas. Mas, por outro lado, quem est\u00e1 l\u00e1, com poder de decidir, de liderar, ainda \u00e9 um homem, um homem branco.<\/p>\n

4 \u2013 Do ponto de vista das pol\u00edticas p\u00fablicas, como os governos e suas institui\u00e7\u00f5es poderiam se comprometer com a equidade de g\u00eanero na ci\u00eancia?<\/strong><\/p>\n

Em primeiro lugar, colocando mais mulheres nos espa\u00e7os de lideran\u00e7a e de decis\u00e3o. Precisamos de mais ministras, secret\u00e1rias de estado, prefeitas, reitoras, pr\u00f3-reitoras nos espa\u00e7os e posi\u00e7\u00f5es onde as pol\u00edticas de ensino, pesquisa e extens\u00e3o s\u00e3o definidas, onde as estrat\u00e9gias de financiamento s\u00e3o elaboradas etc. De forma mais espec\u00edfica, crit\u00e9rios diferenciados para bolsas produtividade, considerando licen\u00e7as maternidade; linhas de financiamento e editais espec\u00edficos para mulheres cientistas (jovens e seniors<\/em>); incentivos para a forma\u00e7\u00e3o de grupos de pesquisa voltados aos estudos de g\u00eanero e diversidade nas diferentes \u00e1reas do conhecimento; programas de forma\u00e7\u00e3o de gestores e docentes que incluam o letramento em g\u00eanero, etc.<\/p>\n

5 \u2013 Como a sociedade, independente do g\u00eanero, pode se aliar \u00e0 busca da equidade de g\u00eanero nas ci\u00eancias?<\/strong><\/p>\n

\"\"<\/a>Na sociedade, a a\u00e7\u00e3o \u00e9 essencialmente pol\u00edtica. Precisamos de mais mulheres na pol\u00edtica sens\u00edveis \u00e0 promo\u00e7\u00e3o da igualdade de g\u00eanero. Todos esses aspectos que cercam nossas carreiras acad\u00eamicas s\u00e3o, antes de tudo, norteados por leis que tamb\u00e9m s\u00e3o majoritariamente elaboradas e votadas por homens. Ent\u00e3o, precisamos de mais vereadoras, deputadas, senadoras sens\u00edveis e comprometidas com a urg\u00eancia de se promover a igualdade e equidade de g\u00eanero nos diferentes n\u00edveis da educa\u00e7\u00e3o.<\/p>\n

Al\u00e9m disso, n\u00e3o podemos esquecer que precisamos de um enfrentamento cada vez mais ostensivo a toda e qualquer tentativa de retroceder nas conquistas j\u00e1 realizadas.<\/p>\n

Vivemos hoje um momento de ascens\u00e3o de grupos reacion\u00e1rios, conservadores e fundamentalistas religiosos que insistem nesse retrocesso e usam de todo um aparato midi\u00e1tico \u2013 favorecidos sobretudo pela infraestrutura das redes digitais \u2013 para gerar ades\u00e3o e engajamento. Por isso, concordo muito com quem defenda que, hoje, ci\u00eancia e pol\u00edtica s\u00e3o dimens\u00f5es insepar\u00e1veis e que precisamos atuar como cientistas engajados na luta por uma academia mais justa, igualit\u00e1ria e livre de preconceitos e discrimina\u00e7\u00e3o de g\u00eanero, de ra\u00e7a, de etnia.<\/p>\n

6 \u2013 Al\u00e9m dos desafios de paridade de g\u00eanero, a Ci\u00eancia ainda precisa lidar com os desafios de pensar nas v\u00e1rias especificidades\/identidades que atravessam as mulheres (maternidade, identidade de g\u00eanero, ra\u00e7a, classe, etc). Como lidar com esses recortes?<\/strong><\/p>\n

Sem d\u00favida, falar em g\u00eanero hoje significa considerar diferentes formas de exist\u00eancia. Portanto, quando falamos de equidade de g\u00eanero na ci\u00eancia, estamos tratando da presen\u00e7a de todas as mulheres, de todas as mulheridades: mulheres negras, mulheres ind\u00edgenas, mulheres trans, n\u00e3o-bin\u00e1rias, mulheres perif\u00e9ricas, dentre tantas outras.<\/p>\n

Isso significa dizer que a luta e a promo\u00e7\u00e3o da equidade de g\u00eanero nas ci\u00eancias deve se dar numa perspectiva anticolonial, decolonial, contra colonial, sem reproduzir padr\u00f5es \u00e9ticos e est\u00e9ticos do processo civilizat\u00f3rio que est\u00e1 nas bases da nossa sociedade e que respalda todo o patriarcalismo e o racismo estrutural que estamos, justamente, criticando e problematizando.<\/p>\n

Amanda Miranda, jornalista da Agecom\/UFSC<\/em><\/p>\n<\/div>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

Professora Maria Elisa M\u00e1ximo \u00e9 secretaria regional da SBPC, mulher, m\u00e3e e cientista. Foto: Arquivo Pessoal A secret\u00e1ria regional em Santa Catarina da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ci\u00eancia (SBPC), Maria Elisa M\u00e1ximo, considera o fator estrutural como uma das principais causas de distor\u00e7\u00f5es entre os espa\u00e7os e os… Continue lendo → <\/span><\/a><\/p>\n","protected":false},"author":1,"featured_media":0,"comment_status":"closed","ping_status":"closed","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":{"footnotes":""},"categories":[1],"tags":[],"class_list":["post-334","post","type-post","status-publish","format-standard","hentry","category-sem-categoria"],"_links":{"self":[{"href":"https:\/\/agencia4.jornalfloripa.com.br\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/334","targetHints":{"allow":["GET"]}}],"collection":[{"href":"https:\/\/agencia4.jornalfloripa.com.br\/wp-json\/wp\/v2\/posts"}],"about":[{"href":"https:\/\/agencia4.jornalfloripa.com.br\/wp-json\/wp\/v2\/types\/post"}],"author":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/agencia4.jornalfloripa.com.br\/wp-json\/wp\/v2\/users\/1"}],"replies":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/agencia4.jornalfloripa.com.br\/wp-json\/wp\/v2\/comments?post=334"}],"version-history":[{"count":0,"href":"https:\/\/agencia4.jornalfloripa.com.br\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/334\/revisions"}],"wp:attachment":[{"href":"https:\/\/agencia4.jornalfloripa.com.br\/wp-json\/wp\/v2\/media?parent=334"}],"wp:term":[{"taxonomy":"category","embeddable":true,"href":"https:\/\/agencia4.jornalfloripa.com.br\/wp-json\/wp\/v2\/categories?post=334"},{"taxonomy":"post_tag","embeddable":true,"href":"https:\/\/agencia4.jornalfloripa.com.br\/wp-json\/wp\/v2\/tags?post=334"}],"curies":[{"name":"wp","href":"https:\/\/api.w.org\/{rel}","templated":true}]}}