Assassinato sem corpo: Especialistas explicam como Justiça trata desaparecimento de adolescente grávida no Paraná como homicídio


Isis Victoria Mizerski, de 17 anos, sumiu há três meses. Marcos Vagner de Souza, apontado como pai do bebê, responde por assassinato e outros crimes ligados ao desaparecimento. Especialista explica como Justiça trata desaparecimento como homicídio
O desaparecimento de Isis Victoria Mizerski completa 90 dias nesta quarta-feira (4). A adolescente de 17 anos estava grávida quando sumiu em Tibagi, nos Campos Gerais do Paraná, após sair para encontrar Marcos Vagner de Souza, apontado como pai do bebê.
Apesar de o corpo dela não ter sido encontrado, a Polícia Civil acredita que ela foi assassinada. Marcos está preso e é réu por homicídio triplamente qualificado, ocultação de cadáver e aborto provocado sem o consentimento de Isis. Ele diz ser inocente. Saiba detalhes a seguir.
Mas como alguém responde por homicídio sem a localização do corpo da vítima? Ao g1, especialistas explicam que a situação é possível conforme as provas do crime e indícios apresentados.
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Marion Bach, advogada criminalista e diretora da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção do Paraná (OAB-PR), explica que a lei permite que isso ocorra para impedir a impunidade.
“Sempre que tem um corpo, é evidente que é a melhor opção, é a prova mais inequívoca de que o homicídio aconteceu. Mas eu não posso ir para o outro extremo de dizer que quando eu não tiver corpo não posso processar ninguém, sob pena de eu homenagear a impunidade todas as vezes que alguém tiver sucesso em destruir e sumir com um corpo”, ressalta.
O advogado Fernando Madureira tem mais de 35 de experiência na área criminal e afirma que, se as provas forem consideradas mais fortes do que uma “dúvida razoável”, um réu pode ser condenado por um homicídio, mesmo sem a vítima ser achada.
“É possível, desde que as provas indiretas sejam firmes, sejam conclusivas para demonstrar, além de uma dúvida razoável, de que ocorreu o crime e o acusado seja o seu autor. Essas provas indiciárias indiretas, seriam, por exemplo, manchas de sangue da vítima, imagens de texto, interceptação telefônica, depoimentos de testemunhas, motivação do crime…”, explica.
Um exemplo concreto é o de Eliza Samudio. Ela desapareceu em 2010 e nunca teve o corpo encontrado. Apesar disso, acusados de envolvimento no crime foram condenados – incluindo o ex-goleiro Bruno Fernandes.
O caso foi lembrado pelo delegado Matheus Campos Duarte, responsável pelas investigações do desaparecimento de Isis, no dia em que a Polícia Civil indiciou o suspeito.
“Embora o corpo de Isis não tenha sido encontrado, as investigações indicam que o indivíduo é suspeito de cometer o homicídio e a ocultação de cadáver. Desde o início das diligências, foram empregados todos os recursos técnicos para localizar o corpo. A situação pode ser comparada ao caso de Eliza Samudio, ocorrido em Minas Gerais, em 2010. O corpo dela nunca foi localizado, mas o óbito foi atestado e o principal suspeito indiciado por homicídio e ocultação”, disse na ocasião.
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Falta de corpo dificulta acusação, mas não a invalida
Falta de corpo enfraquece acusação de homicídio, mas não a invalida, diz advogado
O advogado Fernando Madureira destaca que, em julgamentos de homicídio em que a vítima não foi encontrada, a defesa geralmente tenta invalidar provas e laudos, destacando as lacunas que geram dúvidas.
“Fica mais difícil, evidentemente, para acusação, quando não tem o corpo. Mas em certos casos que nós vemos na mídia há muitos indícios da ocorrência do fato. […] Geralmente a materialidade através do corpo aparece, mas existem vários casos em que o corpo não é localizado e as provas demonstram cabalmente que houve o fato, que houve homicídio, e que o acusado praticou o fato, tinha motivos para isso”, ressalta o advogado.
A diretora da OAB-PR também afirma que provas menos robustas dificultam os argumentos da acusação, mas não os invalidam. Marion lembra que o Código de Processo Penal trata sobre exames de corpo de delito e perícias em geral, abrindo possibilidades para a validação das provas.
“Se eu não achei o corpo, manchas de sangue e de sêmen ou cabelos, mas uma testemunha viu a vítima entrar em uma chácara e nunca mais sair, por exemplo, eu vou ter uma prova testemunhal. Perceba que eu vou fragilizando esse conjunto de provas e é cada vez mais difícil fazer a acusação, é cada vez mais difícil convencer os jurados”, observa a advogada.
A especialista destaca que, apesar da maior dificuldade, a soma de indícios e provas pode ser suficiente para uma condenação.
O caso Isis
Marcos Vagner de Souza e Isis Victória Mizerski
Reprodução
Marcos Vagner de Souza virou réu na Justiça por três crimes, todos no âmbito da violência doméstica:
homicídio triplamente qualificado (por feminicídio, dissimulação e motivo torpe);
ocultação de cadáver;
aborto provocado sem o consentimento da vítima.
Desde o início das investigações, a defesa de Marcos nega que ele tenha envolvimento em algum crime relacionado ao desaparecimento de Isis.
“A defesa reafirma a inocência do Marcos. O processo está na fase de apresentação de resposta à acusação. Ressaltamos que a defesa refuta a denúncia em todos os seus termos, e que durante o processo será demonstrada a inocência do Marcos, e que ele não teve nenhuma participação no desaparecimento da Isis”, afirma o advogado Tainan Felix Laskos.
CRONOLOGIA DO CASO: Suspeito de matar e ocultar corpo de adolescente grávida desaparecida no Paraná vira réu na Justiça
Buscas pela adolescente continuam, diz polícia
Nesta terça-feira (3) a Polícia Civil afirmou ao g1 que as buscas pelo corpo de da adolescente continuam, “utilizando todos os recursos técnicos disponíveis”.
“A equipe mantém o compromisso com a Justiça e busca fornecer respostas definitivas à família. Todas as denúncias e informações que chegam na delegacia da PCPR estão sendo apuradas. A população pode contribuir com denúncias através dos telefones 197 da PCPR ou 181 do Disque-Denúncia”, informa.
O g1 questionou a Polícia Civil, o Corpo de Bombeiros e a Secretaria de Estado de Segurança Pública sobre qual a área total já percorrida pelas buscas e em quais regiões, mas não obteve resposta.
Claudio Dalledone, advogado que representa a família de Isis, afirma que o escritório está procurando por informações relativas ao paradeiro da adolescente paralelamente ao trabalho da polícia.
“O núcleo de inteligência da equipe Dalledone está estruturando com profissionais, equipamentos, um plano de ação para buscar Isis viva ou morta”, diz.
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