MPF produz nota técnica sobre discriminação de gênero e violações de direitos humanos por empresas

O Ministério Público Federal (MPF), por meio da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), elaborou nota técnica na qual aborda questões de discriminação de gênero em violações de direitos humanos por empresas. O documento deve contribuir com a elaboração do Protocolo para Atuação do Ministério Público com Perspectiva de Gênero, atualmente em fase de discussão no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).

A NT foi elaborada pelo procurador Federal dos Direitos do Cidadão, Carlos Alberto Vilhena, pela procuradora Regional da República e coordenadora do Grupo de Trabalho Mulher, Criança, Adolescente e Idoso: Proteção de Direitos, Caroline Maciel da Costa, pelo procurador da República e coordenador do Grupo de Trabalho Direitos Humanos e Empresas, Thales Cavalcanti Coelho, e pela procuradora da República e membra do Grupo de Trabalho Direitos Humanos e Empresas, Renata Muniz Evangelista Jurema. O objetivo do documento é fornecer dados para que o CNMP possa avaliar a incorporação de diretrizes específicas no protocolo para a atuação ministerial em casos que envolvam violações de direitos humanos por empresas.

De acordo com a nota técnica, a PFDC tem como prioridade acompanhar as questões sobre direitos humanos, empresas e desastres com o fortalecimento da perspectiva de gênero e da proteção aos direitos das populações em situação de vulnerabilidade afetadas por atividades empresariais. Porém, o grande desafio nesse caso é a falta de legislação específica, de caráter vinculante, que estabeleça direitos e obrigações para a exploração de atividades econômicas pelo setor empresarial.

Os procuradores destacam, no documento, os seguintes casos: construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, no Rio Xingu, em Altamira (PA); rompimento da barragem de Fundão, operada pela Samarco Mineração, em Mariana (MG), em 2015; rompimento da barragem da mina do Córrego do Feijão, operada pela Vale, em Brumadinho (MG), em 2019; afundamento do solo e consequente inutilização de mais de 14 mil imóveis nos bairros Pinheiro, Mutange, Bebedouro, Bom Parto e Farol, em Maceió (AL), que ocasionou o desalojamento de mais de 60 mil pessoas em razão do colapso de minas de exploração de sal-gema em área urbana de responsabilidade da empresa petroquímica Braskem; funcionamento da ThyssenKrupp Companhia Siderúrgica do Atlântico no Rio de Janeiro, sem licença ambiental; expansão das fronteiras do agronegócio no cerrado com expulsão dos povos tradicionais de suas terras e grave prejuízo ao fornecimento de água às populações urbanas e rurais; danos ambientais e questões fundiárias relacionadas à ampliação do Porto de Suape, em Pernambuco; e vazamento de rejeitos da Hydro Alunorte, em Barcarena (PA).

“O estudo desses casos, sobretudo, os de mineração e de construção de hidrelétricas, tem revelado que os impactos negativos das transformações socioeconômicas e ambientais deles decorrentes afetam de maneira desproporcional as mulheres, em razão da opressão estrutural de gênero imposta por valores do patriarcado. O impacto ainda é maior quando considerada a interseccionalidade entre as múltiplas causas de discriminação baseada na sobreposição dos fatores de sexo, raça, etnia, classe social, orientação sexual e outros”, enfatizam os autores na NT.

De acordo com o apurado pela PFDC, a perda de renda, a falta de reconhecimento enquanto cidadãs produtivas, a sobrecarga doméstica, os problemas de saúde mental e o aumento da violência física e sexual são os danos mais comuns sofridos por mulheres nesse contexto. Na nota técnica, as causas dessas violações são analisadas a partir seis eixos, elencados em uma cartilha do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), publicada em 2011: trabalho; participação política; relação com as empresas; convivência familiar e comunitária; direitos sexuais e reprodutivos e acesso a políticas públicas.

Projeto de Lei – Os procuradores destacam ainda que, para fortalecer a atuação do MP nessa frente, foi fundamental a aprovação no Congresso Nacional do Projeto de Lei CD 2.788/2019, que instituiu a Política Nacional de Direitos das Populações Atingidas por Barragens (PNAB), discrimina os direitos das Populações Atingidas por Barragens (PAB), prevê o Programa de Direitos das Populações Atingidas por Barragens (PDPAB) e estabelece regras de responsabilidade social do empreendedor.

“Trata-se de marco normativo inédito no tema, que introduz o princípio da centralidade do sofrimento da vítima na legislação brasileira, com vistas à justa reparação dos atingidos e à prevenção ou redução de ocorrência de fatos danosos semelhantes”, consideram os autores na NT. “Além disso, o texto aprovado pelo Parlamento garante a presença e a participação do Ministério Público e da Defensoria Pública como convidados permanentes, com direito a voz nas reuniões dos órgãos colegiados que deverão ser criados para acompanhar, fiscalizar e avaliar a formulação e implementação do PDPAB. Trata-se de importante medida para equilibrar as forças nas negociações firmadas entre a população atingida, empresas e o poder público”, destaca o documento.

Avanços – A NT também cita alguns fatos considerados avanços e que podem espelhar ações ainda necessárias no campo da questão de gênero e violação de direitos. Um deles é a promulgação da Constituição de 1998, que “incorporou no ordenamento jurídico brasileiro os principais direitos reivindicados pela luta histórica dos movimentos feministas para a superação da desigualdade de gênero”. Outros bons exemplos de marcos legais citados são a Lei Maria da Penha (11.340/2006), a Lei 8.930/1994, que incluiu estupro no rol dos crimes hediondos, e a Lei 13.104/2015, que tipificou o crime de feminicídio.

A PFDC também faz referência às ações afirmativas para incentivar e aumentar a participação da mulher na política, entre as quais aquela que estipula percentual mínimo para candidatura de cada sexo. Também são citados tratados e convenções internacionais dos quais o Brasil é signatário. O documento será enviado ao CNMP para subsidiar as discussões sobre o Protocolo para Atuação do Ministério Público com Perspectiva de Gênero.

Fonte: Ascom MPF

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Fonte : Repórter PB

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