“O IOF inviabilizaria o sistema inteiro de fundos de investimento no País”, diz gestor

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Assim que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciou os detalhes sobre o aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), as gestoras brasileiras entraram em pânico. Uma medida, especificamente, indicava que a indústria brasileira de fundos de investimento estava com os dias contados.

“Quando o decreto saiu, o pessoal entrou em pânico: ‘quebramos, quebramos’”, conta Glauco Cavalcanti, sócio-fundador e CEO da BLP Capital e OBY Capital, sobre a movimentação nos grupos de WhatsApp.

“Eu falei: ‘gente, calma. Vai voltar atrás. Isso não é possível. É tão absurdo que vão voltar atrás’. E, realmente, não durou nem 24 horas. Reverteram no mesmo dia, antes da meia-noite”, complementa ele, que detém cerca de R$ 2,2 bilhões sob gestão.

O entendimento de Cavalcanti era muito simples: o governo não pode cobrar IOF em fundos que investem no exterior porque o dinheiro fica disponível no Brasil.

“Foi um erro técnico”, diz o gestor. “Quando você investe no fundo, não está mandando dinheiro para o exterior. O fundo compra ativo no exterior, mas o dinheiro está aqui dentro. Você investe em reais e vai receber em reais.”

Na manhã de sexta-feira, 23 de maio, poucas horas depois de explicar em Brasília, no começo da noite de quinta, as medidas do IOF, Haddad convocou a imprensa na sede do Ministério da Fazenda em São Paulo para explicar os motivos da revogação.

“Dada a repercussão, tivemos que ser rápidos na revisão, porque ao contrário das outras decisões, que nós tivemos tempo maior para rever, nesse caso foi identificado essa questão técnica. A equipe técnica viu e julgou pertinentes as alterações”, disse o ministro.

O governo, que havia previsto um IOF de 3,5% para aplicação de investimentos de fundos nacionais no exterior, voltou atrás e manteve a alíquota em zero.

“A carteira de um fundo de investimento não pode ser tributada em nada, porque toda tributação é no cotista. Se o fundo paga imposto e o cotista também paga, é bitributação”, afirma Cavalcanti.

Para o sócio-fundador e CEO da BLP Capital e OBY Capital, há um outro equívoco do governo sobre o IOF, que é uma ferramenta para controlar o fluxo de capital. “A principal função não é arrecadatória, é regulatória”, diz ele.

Acompanhe, a seguir, os principais trechos da entrevista:

Por que tecnicamente não faz sentido cobrar IOF de aplicação de fundos de investimento nos exterior?
Por uma razão técnica muito simples. Se você investiu R$ 1.000 no meu fundo, eu pego esses R$ 1.000, fecho um câmbio, compro US$ 170 e invisto no exterior, digamos, em ações da Apple. O ponto crucial é: esse dinheiro não está disponível no exterior para o cotista. Você não pode chegar em Miami e falar “vende a minha ação da Apple e me dá o dinheiro”. Não há disponibilidade de câmbio no exterior para o cotista.

Esse resgate só acontece no Brasil?
Se ele quiser resgatar, vai me ligar e dizer “quero resgatar o dinheiro do meu fundo”. Eu, como gestor, vou vender as ações lá fora, resgatar do fundo master no exterior, fechar o câmbio e trazer o dinheiro pro Brasil. Ou seja, é um dinheiro que está no exterior, mas não está disponível no exterior. Ele, obrigatoriamente, vai voltar para o País.

Não há o envio do dinheiro para fora, então?
Exato! Quando você investe no fundo, não está mandando dinheiro para o exterior. O fundo compra ativo no exterior, mas o dinheiro está aqui dentro. Você investe em reais e vai receber em reais. É diferente de abrir uma conta internacional e mandar US$ 1.000 para lá. Isso, sim, é uma remessa de divisas.

Qual seria o impacto se o governo mantivesse essa cobrança?
Imagine um fundo que fica comprando e vendendo ativo no exterior. Na segunda-feira ele comprou Apple, pagou 3,5% de IOF. A Apple subiu ou caiu, o gestor não quer mais a Apple e quer vender. Tem que trazer o dinheiro de volta, pagou 3,5% para comprar um ativo que vai vender na semana seguinte? Você inviabilizaria o sistema de fundos inteiro no País.

Há também uma questão tributária envolvida?
Sim. A carteira de fundo não pode ser tributada em nada, porque toda tributação é no cotista. Se o fundo paga imposto e o cotista também paga, é bitributação. Fica confuso, além de tecnicamente errado.

E para que serve o IOF?
O IOF é um dispositivo regulador. Quando você coloca IOF no câmbio, o objetivo principal é controlar o fluxo de capital, ou seja, dificultar a entrada ou saída de dinheiro. No início do Plano Real era o contrário: você queria capital entrando, então colocava IOF para quem queria sair do País. O IOF serve para colocar atrito ou tirar atrito no controle de capitais. No crédito, é uma ferramenta para controlar a oferta de crédito no sistema financeiro. A principal função não é arrecadatória, é regulatória.

Mas o governo inverteu essa ordem, não?
Exato. O que aconteceu foi o inverso: “gente, precisamos arrecadar. Tem um tal de IOF aqui que se a gente aumentar, vamos arrecadar mais.” O governo colocou a arrecadação como objetivo primário, quando deveria ser secundário. Estão precisando mexer em fluxo de capitais? Não estão.

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Neofeed

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