Ex-prefeito Edson Piriquito faz postagem sugerindo que está de volta, mas ele continua inelegível

O ex-prefeito Edson Piriquito fez uma postagem no Instagram sugerindo que está de volta e que “chegou a hora do povo dos bairros, o povo que aqui mora e que aqui Vive em BC e em Camboriu. Piriquito de Novo é a vez do nosso Povo, o Povo simples que carrega essa cidade nas costas”, mas ele está inelegível, por irregularidade insanável determinada pelo Tribunal de Contas da União (TCU).

Por causa da inelegibilidade, ele já não pode concorrer a deputado estadual na última eleição, e só poderá  se inscrever para prefeito se conseguir decisão favorável em recursos apresentados ao próprio TCU e ao Tribunal Regional Federal da 4a Região.

O advogado Eduardo Ribeiro, que defende Edson Piriquito, confirmou que ele continua inelegível e não arriscou prognóstico sobre o resultado dos recursos, devido à imprevisibilidade de decisões a respeito.

Atualmente Edson Piriquito está filiado ao Republicanos, partido sem expressão política em Balneário Camboriú.

Além dessa dificuldade, as principais lideranças do MDB, seu antigo partido, migraram para a base de apoio do prefeito Fabrício Oliveira.

O que determinou a inelegibilidade  está descrito na decisão do TCU reproduzida abaixo:

ACÓRDÃO

ACÓRDÃO 9091/2021 – PRIMEIRA CÂMARA

RELATOR

BRUNO DANTAS

PROCESSO

006.352/2019-7 launch

TIPO DE PROCESSO

TOMADA DE CONTAS ESPECIAL (TCE)

DATA DA SESSÃO

06/07/2021

NÚMERO DA ATA

23/2021 – Primeira Câmara

INTERESSADO / RESPONSÁVEL / RECORRENTE

3. Recorrente: Edson Renato Dias (XXX.581.209-XX).

ENTIDADE

Município de Balneário Camboriú/SC; Ministério do Turismo.

REPRESENTANTE DO MINISTÉRIO PÚBLICO

Procurador Marinus Eduardo De Vries Marsico.

UNIDADE TÉCNICA

Secretaria de Recursos (Serur); Secretaria de Controle Externo de Tomada de Contas Especial (SecexTCE).

William Ribeiro Goulart (38247/OAB-SC) e outros, representando Edson Renato Dias.

ASSUNTO

Recurso de reconsideração interposto contra acórdão que julgou irregulares as contas do recorrente, imputando-lhe débito e aplicando-lhe multa.

SUMÁRIO

TOMADA DE CONTAS ESPECIAL. NÃO COMPROVAÇÃO DA REGULAR APLICAÇÃO DE RECURSOS TRANSFERIDOS POR MEIO DE CONVÊNIO. NÃO DEMONSTRAÇÃO DO ATINGIMENTO DOS OBJETIVOS DA AVENÇA. CITAÇÃO. REVELIA. CONTAS IRREGULARES. DÉBITO. MULTA. RECURSO DE RECONSIDERAÇÃO. ARGUMENTOS INSUFICIENTES PARA REFORMA DO JULGADO. CONHECIMENTO E NEGATIVA DE PROVIMENTO.

ACÓRDÃO

VISTOS, relatados e discutidos estes autos em que se aprecia recurso de reconsideração interposto por Edson Renato Dias contra o Acórdão 11532/2020-TCU-Primeira Câmara, por meio do qual o Tribunal julgou irregulares suas contas, imputando-lhe débito e aplicando-lhe multa,

ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, diante das razões expostas pelo Relator, em:

9.1. com fundamento nos arts. 32, inciso I, e 33 da Lei 8.443/1992, conhecer e negar provimento ao recurso de reconsideração;

9.2. dar ciência deste acórdão ao recorrente.

QUÓRUM

13.1. Ministros presentes: Walton Alencar Rodrigues (Presidente), Benjamin Zymler, Bruno Dantas (Relator), Vital do Rêgo e Jorge Oliveira.

13.2. Ministro que não participou da votação: Jorge Oliveira

13.3. Ministros-Substitutos presentes: Augusto Sherman Cavalcanti e Weder de Oliveira.

RELATÓRIO

Cuidam os autos de recurso de reconsideração interposto por Edson Renato Dias (peça 226) contra o Acórdão 11532/2020-TCU-Primeira Câmara.

A tomada de contas especial que deu origem a estes autos foi instaurada pelo Ministério do Turismo em face do ora recorrente, Prefeito Municipal de Balneário Camboriú/SC nas gestões 2009-2012 e 2013-2016, em razão da não comprovação da regular aplicação dos recursos repassados pela União, por meio do Convênio 634/2008 (Siafi 635843) , firmado entre o Ministério do Turismo e aquela municipalidade.

A deliberação recorrida apresentou o seguinte teor:

“9.1 com fundamento nos arts. 1º, inciso I, 16, inciso III, alíneas “b” e “c”, e 19 da Lei 8.443/1992, julgar irregulares as contas do Sr. Edson Renato Dias;

9.2. com fulcro no art. 23, inciso III, da Lei 8.443/1992, condenar o responsável designado no item anterior ao pagamento da quantia adiante especificada, com a incidência dos devidos encargos legais, calculados a partir da data correspondente até o efetivo recolhimento, na forma da legislação em vigor:

Data de ocorrência Valor histórico (R$)
20/3/2009 148.224,00

9.3. fixar o prazo de 15 (quinze) dias, a contar da data da notificação, para que o responsável comprove, perante o Tribunal, o recolhimento da referida quantia aos cofres do Tesouro Nacional, atualizada monetariamente e acrescida dos juros de mora, nos termos do art. 23, inciso III, alínea “a”, da Lei 8.443/1992 c/c o art. 214, inciso III, alínea “a”, do Regimento Interno do TCU (RI/TCU) ;

9.4. aplicar ao Sr. Edson Renato Dias a multa de R$ 13.500,00, com fulcro no art. 57 da Lei 8.443/1992:

9.5. fixar o prazo de 15 (quinze) dias, a contar da data da notificação, para que o responsável comprove, perante o Tribunal, o recolhimento da aludida quantia aos cofres do Tesouro Nacional, atualizada monetariamente desde a data do presente acórdão até a do efetivo recolhimento, se for paga após o vencimento, nos termos do art. 23, inciso III, alínea “a”, da Lei 8.443/1992 c/c o art. 214, inciso III, alínea “a”, do Regimento Interno do TCU (RI/TCU) ;

9.6. autorizar a cobrança judicial das dívidas, caso não atendidas as notificações, nos termos do art. 28, inciso II, da Lei 8.443/1992;

9.7. autorizar, desde já, caso venha a ser solicitado, o parcelamento das dívidas em até 36 (trinta e seis) parcelas mensais, nos termos do art. 217 do RI/TCU, com a incidência sobre cada parcela dos devidos encargos legais até o efetivo pagamento, esclarecendo que a falta de pagamento de qualquer parcela importará no vencimento antecipado do saldo devedor (§ 2º do art. 217 do RI/TCU) ;

9.8. dar ciência desta decisão ao Sr. Edson Renato Dias, ao Ministério do Turismo, à Prefeitura e à Câmara Municipal de Balneário Camboriú – SC e ao Procurador-Chefe da Procuradoria da República no Estado de Santa Catarina, neste caso, nos termos do art. 16, § 3º, da Lei 8.443/1992 c/c o art. 209, § 7º, do Regimento Interno do TCU, para adoção das medidas que entender cabíveis.”

Admitido o processamento do recurso, porquanto preenchidos os requisitos previstos nos arts. 32, inciso I, e 33 da Lei 8.443/1992, conferi efeito suspensivo aos itens 9.1, 9.2, 9.4 e 9.6 do acórdão recorrido em relação ao recorrente (peça 231) .

Instruído o presente feito, faço reproduzir, com os ajustes que julgo pertinentes, o exame técnico e o encaminhamento oferecidos pela Secretaria de Recursos deste Tribunal (peça 248) , que contou com a anuência do corpo diretivo da unidade (peça 249) e do Ministério Público junto ao TCU (peça 250) :

HISTÓRICO

2. Trata-se originalmente de tomada de contas especial instaurada pelo Ministério do Turismo em razão da não comprovação da regular aplicação dos recursos repassados pela União, por meio do Convênio 634/2008 (Siafi 635843) , firmado entre o Ministério do Turismo e o Município de Balneário Camboriú/SC, cujo objeto era ‘qualificar profissionais do setor de turismo para a melhoria da qualidade no atendimento aos turistas do Município de Balneário Camboriú/SC’ (peça 26, p. 1) .

3. Para a consecução do empreendimento foi previsto o aporte de R$ 185.280,00, sendo R$ 148.224,00 à conta do concedente e o restante correspondente à contrapartida do convenente (peça 26, p. 7) . A União repassou a integralidade dos recursos de sua alçada (peça 31) . A avença teve vigência de 27/6/2008 a 31/12/2011 (peça 166) .

4. Na fase interna da tomada de contas especial, a concedente verificou que o Município de Balneário Camboriú/SC não apresentou elementos fáticos comprobatórios para a aprovação da prestação de contas relativa ao Convênio 634/2008, inviabilizando a apuração do alcance do objeto da avença (peça 158, p.18) .

5. Após a notificação de Rubens Spernau, na condição de prefeito municipal (gestão 2005-2008) , sem o saneamento das inconsistências levantadas, o Ministério do Turismo deu prosseguimento à tomada de contas especial e, ao final, concluiu que houve prejuízo no valor original de R$ 148.224,00, atribuindo responsabilidade ao referido gestor (peça 183) .

6. Submetidos os autos a esta Corte de Contas, a unidade técnica entendeu, em juízo preliminar, que a responsabilidade pelo débito deveria ser imputada a Edson Renato Dias, prefeito municipal nas gestões de 2009-2012 e 2013-2016, sob o argumento de que ele foi, efetivamente, o gestor dos recursos federais recebidos (peça 192, p. 2-8) . O ministro relator aquiesceu da proposta (peça 195) .

7. Após citação acerca das irregularidades apontadas no Convênio 634/2008, o responsável se manteve silente, operando-se a revelia. Dessa forma, o Tribunal, por meio do Acórdão 11532/2020-TCU-Primeira Câmara (peça 210) , relatado pelo Ministro Benjamin Zymler, julgou irregulares as contas de Edson Renato Dias, imputando-lhe débito e aplicando-lhe multa, na forma transcrita na introdução acima.

8. Insatisfeito, Edson Renato Dias interpôs o presente recurso de reconsideração (peça 226) , requerendo (peça 226, p. 8-9) :

a) O recebimento do presente Recurso de Reconsideração, com o seu processamento;

b) O acolhimento da preliminar de cerceamento de defesa pela ausência de citação válida na fase inicial da Tomada de Contas em relação ao Recorrente Edson Renato Dias, devendo ser anulado o processo desde então;

c) O reconhecimento da preliminar de prescrição da pretensão punitiva, tendo em vista a ocorrência do transcurso de mais de 10 (dez) anos entre a ocorrência da suposta irregularidade e a citação válida do Recorrente, devendo o processo ser extinto e eximida a responsabilidade do Recorrente em relação a multa e a imputação de débito aplicada do acórdão, ora recorrido;

d) Quanto ao mérito, a procedência do Recurso para reformar a decisão, declarando a inexistência de irregularidades na prestação de contas e na execução do convênio sub examine, eximindo o Recorrente de qualquer responsabilidade.

ADMISSIBILIDADE

9. Reitera-se o exame preliminar de admissibilidade (peça 227) , ratificado pelo relator, ministro Bruno Dantas (peça 231) , que concluiu pelo conhecimento do recurso, suspendendo-se, ao recorrente, os efeitos dos itens 9.1, 9.2, 9.4 e 9.6 do Acórdão 11532/2020-TCU-Primeira Câmara, relator ministro Benjamin Zymler, eis que preenchidos os requisitos processuais aplicáveis à espécie.

MÉRITO

10. Delimitação

10.1. Constitui objeto do recurso verificar se:

a) houve prejuízo à ampla defesa e ao contraditório (peça 226, p. 4) ;

b) houve a prescrição (peça 226, p. 4-5) ;

c) houve regularidade na prestação do objeto (peça 226, p. 5-8) .

11. Prejuízo à ampla defesa e ao contraditório.

11.1. O recorrente afirma que houve comprometimento à ampla defesa e ao contraditório, em razão dos seguintes argumentos:

a) o recorrente não foi notificado na fase interna da tomada de contas especial, uma vez que o órgão instaurador entendeu que a responsabilidade deveria recair sobre Rubens Spernau (peça 226, p. 4) ;

b) a notificação na fase interna teria possibilitado a demonstração do cumprimento e da regularidade do objeto e a sua prestação de contas naquela fase prévia (peça 226, p. 4) ;

c) a notificação tardia do recorrente prejudica de forma objetiva a ampla defesa, pois, após mais de dez anos, ele não teria condições de produzir, razoavelmente, provas a seu favor em tempo tão exíguo (peça 226, p. 4) .

Análise

11.2. Observa-se que, de fato, o recorrente não foi notificado pelo Ministério do Turismo na fase interna do processo de TCE. Isso ocorreu porque o entendimento, naquela oportunidade, era de que a responsabilidade pelos atos inquinados deveria recair sobre o prefeito signatário do ajuste, Rubens Spernau (peça 183, p. 2-3) .

11.3. Instaurado o processo de TCE no âmbito dessa Corte de Contas, constatou-se que a gestão dos recursos esteve a cargo de Edson Renato Dias. Por essa razão, foi excluído o nome de Rubens Spernau do polo passivo da tomada de contas especial, dando-se prosseguimento à apuração do prejuízo ao erário, considerando-se como responsável Edson Renato Dias (peça 192, p. 4) .

11.4. A despeito da ausência de notificação de Edson Renato Dias na fase interna da presente TCE, necessário consignar que, nessa fase, em que se coletam evidências para fins de apuração dos fatos e das responsabilidades, não há uma relação processual constituída. A garantia ao direito de defesa, desse modo, deve ocorrer na fase externa da TCE, com a citação válida do responsável, o que se encontra atestado às peças 203 e 204.

11.5. Vale ressaltar que a jurisprudência pacífica do TCU é no sentido de que a inexistência de contraditório na fase interna da TCE não traz qualquer mácula ao processo, uma vez que o responsável poderá exercer seu amplo direito de defesa na fase externa (Acórdão 4938/2016-TCU-Primeira Câmara, relator ministro Bruno Dantas; 874/2016-TCU-Plenário, relator ministro Benjamin Zymler; 3.487/2010 – 1ª Câmara, relator ministro Walton Alencar) . Observou-se, nessa toada, que o responsável teve a oportunidade de se manifestar por ocasião da realização da sua citação (peças 203 e 204) e na presente fase recursal (peça 226) .

11.6. No que concerne a alegação de que notificação tardia do recorrente prejudica de forma objetiva a ampla defesa, observa-se que a jurisprudência do TCU é no sentido de que o prejuízo à ampla defesa e ao contraditório decorrente da citação tardia deve ser efetivamente demonstrado pelo responsável com a indicação do obstáculo ou dificuldade concreta que implicou em prejuízo à defesa, não sendo suficiente sua mera alegação (Acórdão 1304/2018-TCU-Primeira Câmara, relator ministro Bruno Dantas; 444/2016-TCU-2ª Câmara, relator ministro Augusto Nardes; 1.509/2015-TCU-Plenário, relator ministro Walton Alencar Rodrigues; 6.990/2014- TCU-1ª Câmara, relator ministro Walton Alencar Rodrigues) . No presente caso, não foram apesentados quaisquer obstáculos concretos ao exercício do contraditório e da ampla defesa.

11.7. Assim, não houve violação ao contraditório e à ampla defesa, uma vez que o responsável teve a oportunidade de se manifestar por ocasião da realização da sua citação e na presente fase recursal e que não foram apesentados quaisquer obstáculos concretos ao exercício do contraditório e da ampla defesa.

12. Ocorrência da prescrição

12.1. O recorrente afirma que houve prescrição, com esteio nos seguintes argumentos:

a) o Acórdão 1441/2016-TCU-Plenário, relator ministro Benjamin Zymler, que uniformizou a jurisprudência acerca dessa questão, subordina-se ao prazo geral de prescrição indicado no art. 205 do Código Civil, que é de dez anos, contado da data de ocorrência da irregularidade sancionada, nos termos do art. 189 do Código Civil, sendo este prazo interrompido pelo ato que ordenar a citação, a audiência ou a oitiva do responsável (peça 226, p. 5) ;

b) ocorreu a prescrição da pretensão punitiva, uma vez que a suposta irregularidade sancionada ocorreu em 20/3/2009 e o ato de ordenação da citação ocorreu em 13/03/2020, ou seja, há mais de dez anos, sendo incabível a manutenção da presente decisão (peça 226, p. 5) .Análise

12.2. No exame da prescrição, a Serur tem adotado os entendimentos detalhados na peça 247, que contêm, respectivamente, estudo e pronunciamento anteriores da secretaria sobre o tema. Nessas manifestações estão desenvolvidas as seguintes premissas, que serão utilizadas no presente exame:

a) ao julgar o RE 636.886, o STF conferiu nova interpretação ao art. 37, § 5º, da Constituição Federal, fixando a tese de que ‘é prescritível a pretensão de ressarcimento ao erário fundada em decisão de Tribunal de Contas’;

b) as pretensões punitiva e de ressarcimento devem observar o mesmo regime na atividade de controle externo, dado o objetivo comum da prescrição, de fixar prazo para o Tribunal de Contas agir, para caracterizar o ilícito, identificar seu autor, dimensionar as consequências da conduta e impor os efeitos legais, independentemente de tais efeitos terem natureza punitiva ou ressarcitória;

c) até que sobrevenha norma específica, entende-se que a prescrição das pretensões punitiva e de ressarcimento, no processo de controle externo, deve observar o regime Lei 9.873/1999, na linha dos recentes pronunciamentos do STF a respeito. Assim, sem prejuízo de se realizar o exame da prescrição também segundo o prazo decenal previsto no Código Civil, o critério adotado, na formulação da proposta de encaminhamento, será o da Lei 9.873/1999.

12.3. Com essas explicações adicionais, passa-se à análise da prescrição no caso em exame, considerando-se as premissas indicadas anteriormente.

Análise da prescrição segundo os critérios do Acórdão 1441/2016-TCU-Plenário.

12.4. No que se refere à pretensão punitiva, o TCU tem tradicionalmente aplicado os critérios definidos no Acórdão 1441/2016-TCU-Plenário, que, em incidente de uniformização de jurisprudência, orientou-se pela aplicação do Código Civil. Por este acórdão, em linhas gerais, a prescrição subordinar-se-ia ao prazo geral de dez anos (CC, art. 205) , contado a partir da data da ocorrência do fato e interrompido pelo ato que ordenar a citação, a audiência ou a oitiva da parte.

12.5. Entre outras razões que justificaram a adoção desse critério, destaca-se que o citado dispositivo constitui uma cláusula geral a ser empregada sempre que a pretensão for prescritível, mas a lei não estabelecer um prazo específico, como na hipótese.

12.6. Aplicando-se essas balizas ao caso em exame em relação à recorrente, verifica-se que entre o dia seguinte ao término do prazo final para entrega da prestação de contas, 1º/3/2012 (peça 166) , e a data do despacho que autorizou a citação do recorrente (interrupção) , 2/8/2019 (peça 195) , passaram-se pouco mais de sete anos. Dessa última data até os dias atuais, não se passaram ainda dois anos.

12.7. Considerando a premissa de que as pretensões punitiva e de ressarcimento se submetem ao mesmo regime, conclui-se pela possibilidade de aplicação de multa e de condenação ao ressarcimento, por não estarem prescritas, caso fossem adotados, para ambos os fins, os parâmetros definidos no Acórdão 1441/2016-TCU-Plenário.

Análise da prescrição pelo regime da Lei 9.873/1999 (MS 32.201) .

12.8. Adotando-se as premissas fixadas na Lei 9.873/1999 ao caso em exame, observa-se que também não teria ocorrido a prescrição. Para tanto, é preciso considerar os seguintes parâmetros:

a) Termo inicial:

12.9. A Lei 9.873/1999, art. 1º, parte final, traz previsão expressa a respeito do início do prazo em se tratando de infração de caráter permanente ou continuado. Nesta hipótese, a prescrição começa a correr não da data de cada fato, e sim ‘do dia em que tiver cessado’ a permanência ou a continuidade.

12.10. Na hipótese em exame, estão presentes os requisitos típicos de uma infração permanente. É certo que a aplicação dos recursos pode ser fiscalizada a qualquer tempo pelo concedente e, se algum ilícito for constatado nesse acompanhamento, já surge a possibilidade de agir e, portanto, a prescrição da reparação do dano. Se o ilícito não foi constatado antes, contudo, há um momento certo para aferição do cumprimento das obrigações do proponente, que se dá exatamente com a prestação de contas. Logo, enquanto não exaurido o prazo para a aplicação dos recursos e a correspondente prestação de contas, não flui prazo prescricional (CC, art. 199, II) .

12.11. O termo inicial de cálculo da prescrição é o dia 26/4/2012, considerando que a prestação de contas foi apresentada de forma intempestiva nessa data (peça 50) e que os atos de apuração das irregularidades são posteriores.

b) Prazo:

12.12. A Lei 9.873/1999 apresenta um prazo geral, de cinco anos (art. 1º) , e um prazo especial, previsto no art. 1º, § 2º, a saber: ‘quando o fato objeto da ação punitiva da Administração também constituir crime, a prescrição reger-se-á pelo prazo previsto na lei penal’. Entretanto, essa hipótese não se aplica ao caso em exame.

c) Interrupções por atos inequívocos de apuração dos fatos:

12.13. No regime da Lei 9.873/1999, a prescrição se interrompe ‘por qualquer ato inequívoco, que importe apuração do fato’ (art. 2º, II) , como por exemplo, sindicâncias, processo administrativo disciplinar, auditorias, ocasião em que são apurados a legalidade dos atos e, constatando irregularidades, desencadeiam as providências ressarcitórias e punitivas cabíveis. Com esse fundamento, de acordo com os documentos constantes dos autos, verificou-se que a prescrição foi interrompida:

a) em 4/6/2014, com o Parecer Técnico de Análise de Prestação de Contas 18/2014 – CGQC/DCPAT/SNPDTur/MTur (peça 151) ;

b) em 29/2/2016, com a Nota Técnica de Análise Financeira 302/2016 (peça 157) ;

c) em 2/3/2016, com o Relatório de TCE 160/2008 (peça 183) ;

d) em 29/11/2018, com o Relatório de Auditoria 1.206/2018, da Controladoria Geral da União (peça 184) ;

e) em 26/3/2019, com a autuação do presente processo de TCE, visando a apuração de irregularidades.

d) Interrupções pela citação dos responsáveis:

12.14. A prescrição também é interrompida ‘pela notificação ou citação do indiciado ou acusado, inclusive por meio de edital’, nos termos do art. 2º, I, da Lei 9.873/1999. E, no regime dessa lei, a interrupção se dá pela citação ou audiência propriamente dita, e não pelo despacho que a ordena. O responsável foi notificado da citação em 23/10/2019 (peça 198) .

e) Interrupção pela decisão condenatória recorrível:

12.15. A prescrição também se interrompe ‘pela decisão condenatória recorrível’ (art. 2º, III, da Lei 9.873/1999) , ocorrida na data sessão virtual de julgamento do acórdão condenatório que foi em 13/10/2020 (peça 210) .

f) Da prescrição intercorrente:

12.16. Nos termos do art. 1º, § 1º, da Lei 9.873/1999, opera-se a prescrição intercorrente se o processo ficar paralisado por mais de três anos, aguardando ‘julgamento ou despacho’.

12.17. Note-se que há uma correlação entre essa hipótese e as causas de interrupção da prescrição do art. 2º. Com efeito, uma vez praticada a infração à legislação ou interrompida a prescrição por alguma das hipóteses do art. 2º, o processo não pode ficar inativo, sem qualquer inovação processual relevante, por mais de três anos.

12.18. Trata-se de prazo específico, não se aplicando nem o prazo geral de cinco anos nem o prazo especial, da lei penal (§ 2º) . A finalidade da prescrição intercorrente, com seu prazo próprio, é a de assegurar a eficiência e celeridade nas apurações administrativas. Seria contrário a essa finalidade a paralisação injustificada do processo por período maior que o triênio estabelecido para a hipótese.

12.19. A extrapolação do prazo de três anos, sem inovação relevante no processo, pode configurar negligência. Por isso, além de se operar a prescrição, deve-se promover a ‘apuração da responsabilidade funcional decorrente da paralisação, se for o caso’.

12.20. Especificamente quanto a esta TCE, não se passou três anos entre a sua autuação e o acórdão recorrido, além de terem sido realizados diversos despachos – providências internas e externas que importaram em impulso processual (peças 192, 195, 206 e 209) , de forma que não houve incidência da prescrição intercorrente prevista naquela lei.

g) Conclusão:

12.21. Observa-se, pelos eventos indicados, que em nenhum momento transcorreu prazo suficiente para se operar a prescrição (nem mesmo ao se considerar o prazo geral de cinco anos) , tomando-se como referência a Lei 9.873/1999, tida pelo STF como norma regente da prescrição da pretensão punitiva pelo TCU.

12.22. Partindo-se da premissa de que a pretensão reparatória segue as mesmas balizas, enquanto não houver norma específica a respeito, a demonstração de que não se operou a prescrição punitiva impõe, como consequência, a conclusão de que também é viável a condenação ao ressarcimento do prejuízo apurado nos autos.

12.23. Assim, qualquer que seja a premissa adotada (da imprescritibilidade, da prescritibilidade pelo regime do Código Civil ou da prescritibilidade pelo regime da Lei 9.873/1999) , verifica-se que, em nenhuma hipótese, o prazo extintivo foi extrapolado.

13. Regularidade na prestação do objeto.

13.1. O recorrente afirma que houve regularidade na prestação do objeto, inexistindo prejuízo à União quanto a aplicação dos recursos, com fundamento nos seguintes argumentos:

a) o curso objeto do Convênio 634/2008 foi ministrado de 27/09/2010 a 15/12/2010. Sua realização é incontestavelmente demonstrada pelas fotos do evento (que retratam as aulas, as formaturas, os city tours, etc.) , pelas listas de presença assinadas pelos alunos, pelos controles de frequência, pelos relatórios de atividades elaborados pela empresa contratada (feitos quinzenalmente e acompanhados de fotos) e pelas notícias veiculadas na mídia (peça 226, p. 6) ;

b) Embora o curso tenha sido efetivamente realizado, o Ministério, com base no Parecer Técnico 18/2014/DCPAT/SNPDTur, entende que toda a verba relativa à contratação dos professores – a quantia de R$ 102.060,00 – deve ser devolvida. Isso porque, no seu entender, o município não logrou comprovar a contratação desses profissionais. Ora, a contratação dos professores é atestada pela própria realização do curso, sobejamente demonstrada por todas as provas anexas (relatórios de atividades, listas de presença, fotos, notícias etc. – peça 226, p. 7) ;

c) a Nota Técnica do Ministério menciona as fotos das aulas, porém sustenta que ‘não se pode afirmar’ que se referem ao convênio porque ‘as fotos não apresentam nenhuma identificação da logomarca do Ministério do Turismo, tampouco mencionam o número do Convênio, portanto, a Convenente deverá ressarcir o valor repassado de R$ 102.060,00. É evidente que todas as fotos apresentadas advêm da execução do convênio, até porque quase sempre retratam alunos que estão trajando justamente a camiseta confeccionada pela empresa contratada – branca, com os dizeres ‘Qualidade no Atendimento ao Turista – Balneário Camboriú – Capital Catarinense do Turismo’ e/ou painéis/telões que contém o nome do curso (peça 226, p. 7) ;

d) a ausência dos contratos individuais dos professores, reclamada pelo Ministério, tampouco pode ser motivo para rejeição das contas. Como visto, o município não contratou os professores diretamente, mas sim a ADRVale, a empresa que se sagrou vencedora na licitação. Os custos com os professores constam das notas fiscais emitidas pela própria empresa (n. 268, 269, 271, 273, 275, 276 e 283 – peça 226, p. 7-8) ;

e) a ação judicial 50186743720164047208 movida pelo município em face da União já foi transitada em julgado e deu ganho de causa ao município. Nessa ação constam todos os documentos e justificativas que comprovam a regularidade na prestação do objeto do Convênio e as justificativas em relação as eventuais inconsistências na prestação de contas, inexistindo prejuízo à União quanto à aplicação dos recursos (peça 226, p. 8) .

Análise

13.2. Conforme apresentado no Parecer Técnico de Prestação de Contas 18/2014 – CGQC/DCPAT/SNPDTur/MTur (peça 151) , foram observadas diversas irregularidades na execução do objeto do Convênio 634/2008 para além daquelas informadas pelo recorrente, quais sejam:

a) ausência da relação dos treinados (listagem relacionando o quantitativo, nome, telefone, cpf, endereço dos alunos que foram capacitados, devidamente assinada pelo responsável técnico) ;

b) não fixação da logomarca do Ministério do Turismo nos folders produzidos, bem como nas camisetas confeccionadas para o projeto;

c) ausência de instrumento que comprove a contratação dos professores responsáveis pela instrutória dos conteúdos do curso, acompanhada de recibo referentes as horas trabalhadas, bem como respectivos currículos;

d) ausência de informação sobre os segmentos turísticos contemplados, o número total de alunos matriculados, desistentes, bem assim os capacitados no curso ‘Qualificação no Atendimento ao Turista’;

e) ausência dos contratos firmados para a locação dos espaços, Faculdade Avantis, Centro Educacional Municipal Vereador Santa e Batalhão da Polícia Militar, acompanhados de recibos de pagamento;

f) quantitativos de alunos por turma superior ao estabelecido no Termo de Referência aprovado;

g) utilização de apostila de propriedade de Intelectus – Instituto de Desenvolvimento, a despeito de o MTur ter repassado recursos para confecção de apostila;

h) ausência dos comprovantes referentes ao material de consumo;

i) insuficiência da comprovação e da justificativa dos preços contratados da alimentação;

j) ausência da fixação da logomarca do Ministério do Turismo no material de divulgação;

k) ausência de nota fiscal e de exemplar do uniforme do curso;

l) pagamento de itens despesas não previstas no Plano de Trabalho aprovado.

13.3. O recorrente não apresentou quaisquer documentos que pudessem dirimir as irregularidades que constaram do Parecer Técnico de Prestação de Contas 18/2014 – CGQC/DCPAT/SNPDTur/MTur (peça 151) . Embora informe, na presente fase processual, que encaminhou fotos dos eventos realizados, verifica-se que essa documentação, por não conter elementos que demonstrassem nexo entre o convênio e o serviço prestado, não pode ser aceita pelo concedente (peça 151, p. 17) .

13.4. Ademais, importa destacar que no Plano de Trabalho do Convênio 634/2008 constou a informação de que, desde o ano de 1997, a Secretaria de Turismo e Comércio do município realiza o Curso de Turismo e Qualidade no Atendimento para qualificação dos profissionais que atuam no receptivo da cidade (peça 8, p. 2) . Desse modo, a distinção da ação realizada com recursos provenientes do Convênio 634/2008, daquelas realizadas com recursos do próprio município, dependia da identificação do concedente, nos termos previstos na Cláusula Terceira, inciso II, alínea ‘g’ do Convênio 634/2008 (peça 26, p. 3-4) .

13.5. Com efeito, observa-se a baixa força probatória de fotografias, porquanto retratam uma situação, mas não demonstram o nexo entre os recursos federais transferidos e as despesas realizadas na execução do objeto. Nesse sentido são os Acórdão 2258/2017-TCU-Primeira Câmara, relator Ministro Walton Alencar Rodrigues; 2.886/2017-TCU-2ª Câmara, relator Ministro Augusto Nardes; e 842/2017-TCU-Plenário, relator Ministro Benjamin Zymler.

13.6. Do mesmo modo, as listas de presença não permitiram aferir se os alunos que ali foram registrados participaram do curso, uma vez que não apresentaram o endereço ou o telefone dos participantes para que fosse feita a checagem (peça 151, p. 16) .

13.7. No que concerne às professoras supostamente contratadas, observou-se que não existiu comprovação de que a sua eventual contratação tenha ocorrido para atender aos desígnios do Convênio 634/2008, uma vez que não foram apresentados contratos ou recibos pelos serviços prestados pelo município ou pela empresa por ele contratada (peça 151, 11) .

13.8. Na parte relacionada à ação judicial de apelação cível 5018674-37.2016.4.04.7208, o recorrente não demonstra a similaridade da ação judicial com os presentes autos, uma vez que o dispositivo da decisão apenas tratou da inscrição do município no cadastro de inadimplentes antes do julgamento da TCE pelo TCU, conforme Acórdão de 3/9/2019, in verbis:

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento ao recurso de apelação para o fim de declarar a ilegalidade da inscrição do ente municipal nos cadastros de inadimplentes antes do julgamento da Tomada de Contas Especial instaurada em face do Convênio MTur/PM 634/08, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

13.9. Importa observar, outrossim, que a existência de decisão supostamente favorável ao responsável na esfera judicial não derroga a prerrogativa de o TCU, no exercício de sua competência constitucional privativa, analisar a matéria, em face do princípio da independência de instâncias que vigora em nosso ordenamento jurídico (art. 935 do Código Civil) , especialmente porque a questão de fundo tratada na apelação cível 5018674-37.2016.4.04.7208 não versa sobre sentença penal absolutória negando a existência do fato ou da autoria, duas únicas exceções à regra (Acórdão 3690/2021-TCU-Segunda Câmara, ministro relator André de Carvalho; 741/2021-TCU-Plenário, ministra relatora Ana Arraes; 784/2021-TCU-Plenário- ministro relator Vital do Rêgo; 6.897/2021-TCU-Segunda Câmara, ministro relator Bruno Dantas) .

13.10. Desse modo, o recorrente não comprovou a regularidade na prestação do objeto, tendo em vista que não encaminhou quaisquer documentos que pudessem afastar as conclusões consubstanciadas no Parecer Técnico de Prestação de Contas 18/2014 – CGQC/DCPAT/SNPDTur/MTur.

CONCLUSÃO

14. Das análises anteriores, conclui-se que:

a) não houve violação ao contraditório e a ampla defesa, uma vez que o responsável teve a oportunidade de se manifestar por ocasião da realização da sua citação e na presente fase recursal e que não foram apesentados quaisquer obstáculos concretos ao exercício do contraditório e da ampla defesa;

b) não se operou a prescrição do débito nem a prescrição da pretensão punitiva, qualquer que seja a premissa adotada (da imprescritibilidade, da prescritibilidade pelo regime do Código Civil ou da prescritibilidade pelo regime da Lei 9.873/1999) ;

c) não houve comprovação da regularidade na prestação do objeto, tendo em vista que não encaminhou quaisquer documentos que pudessem afastar as conclusões consubstanciadas no Parecer Técnico de Prestação de Contas 18/2014 – CGQC/DCPAT/SNPDTur/MTur.

15. Com base nessas conclusões, propõe-se o não provimento do recurso, uma vez que os argumentos ofertados pelo recorrente não tiveram o condão de elidir as irregularidades inquinadas e nada adicionam aos arrazoados já rejeitados pelo Tribunal, perdurando válidas as razões de decidir consubstanciadas no acórdão atacado.

PROPOSTA DE ENCAMINHAMENTO

16. Ante o exposto, com fundamento nos artigos 32, inciso I; e 33, da Lei 8.443/1992, submetem-se os autos à consideração superior, com posterior encaminhamento ao Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União e ao Gabinete do Relator, propondo:

a) conhecer do recurso interposto e, no mérito, negar-lhe provimento;

b) comunicar a deliberação que vier a ser proferida por esta Corte ao recorrente, ao Ministério do Turismo e aos demais interessados.”

É o relatório.

VOTO

Em julgamento, recurso de reconsideração interposto por Edson Renato Dias, ex-prefeito de Balneário Camboriú/SC (gestões 2009-2012 e 2013-2016, contra o Acórdão 11532/2020-TCU-Plenáriorimeira, por meio do qual o Tribunal julgou irregulares suas contas, imputando-lhe débito e aplicando-lhe multa, em razão da não comprovação da boa e regular aplicação dos recursos recebidos por meio do Convênio 634/2018 (Siafi 635843) , firmado entre aquela municipalidade e o Ministério do Turismo (MTur) .

O objeto do convênio consistia em “qualificar profissionais do setor de turismo para a melhoria da qualidade no atendimento aos turistas” do município, tendo vigência entre 27/6/2008 a 31/12/2011.

Conforme constam dos autos, na fase interna da TCE, o MTur entendeu pela impugnação total dos valores repassados, tendo em vista a não comprovação da execução do objeto, imputando a responsabilidade a Rubens Spernau, prefeito de Balneário Camboriú/SC durante a gestão 2005-2008.

No âmbito desta Corte, concluiu-se que Edson Renato Dias, ora recorrente, também deveria integrar o processo, por ter sido o prefeito municipal que efetivamente geriu os recursos repassados pela pasta ministerial. Dessa forma, decidiu-se pela exclusão da responsabilidade de Rubens Spernau nestes autos, imputando-a integralmente ao seu sucessor.

Nesta oportunidade, o recorrente alega preliminarmente que teria ocorrido a prescrição e que teria havido prejuízo ao seu exercício da ampla defesa e do contraditório. No mérito, aduz que os documentos por ele apresentados seriam suficientes para comprovar a regularidade na prestação do objeto conveniado.

Após examinar as razões recursais, a Secretaria de Recursos concluiu que não foram trazidos elementos suficientes para alterar a deliberação recorrida, razão pela qual, com a concordância do Ministério Público junto ao TCU, propõe o conhecimento e o não provimento do apelo recursal.

Preliminarmente, ratifico o despacho exarado no sentido de que o presente recurso merece ser conhecido, porquanto preenche os requisitos de admissibilidade previstos nos arts. 32, inciso I, e 33 da Lei 8.443/1992.

Quanto ao mérito, concordo com a análise empreendida pela secretaria especializada, transcrita no relatório precedente, a qual enfrentou e afastou com propriedade cada um dos argumentos apresentados pelo recorrente, razão pela qual incorporo seus fundamentos às minhas razões de decidir, sem prejuízo das seguintes considerações.

A jurisprudência desta Corte é no sentido de que o fato de o responsável não ter sido notificado na fase interna da tomada de contas especial não invalida os atos processuais adotados no âmbito do TCU. A ausência de notificação do responsável na fase interna do processo de tomada de contas especial não implica vício, porquanto a fase interna constitui procedimento inquisitório de coleta de provas, assemelhado ao inquérito policial, e a fase externa, que se inicia com a autuação do processo no TCU, é que garante o direito à ampla defesa e ao contraditório. (Acórdão 5791/2020-TCU-Primeira Câmara e 653/2017-TCU-Segunda Câmara)

Nesse sentido, não há que se falar em prejuízo ao contraditório e à ampla defesa. Verifica-se nos autos que o ora recorrente foi regularmente citado, tendo-lhe sido dada oportunidade de apresentar suas alegações de defesa e demonstrar a execução do objeto conveniado.

Bem se sabe que prestar contas, com a devida e correta comprovação da boa e regular aplicação dos valores públicos, é dever de todos aqueles a quem sejam confiados recursos federais, por força do art. 70, parágrafo único, da Constituição de 1988 e do art. 93 do Decreto-Lei 200, de 25 de fevereiro de 1967 (v.g.: Acórdão 2439/2010-TCU-Plenário, Acórdão 5929/2011-TCU-Primeira Câmara, e Acórdão 1544/2008-TCU-Segunda Câmara) .

Dessa maneira, a ausência de comprovação da boa e regular aplicação dos recursos recebidos configura ofensa às regras legais e, ainda, aos princípios basilares da administração pública, uma vez que o gestor deixa de prestar a devida satisfação à sociedade sobre o efetivo emprego dos recursos sob sua responsabilidade.

O gestor deve provar a boa e regular aplicação dos recursos federais e, não o fazendo, há presunção de dano, obrigando esse gestor a restituir os valores aos cofres públicos.

A jurisprudência deste Tribunal é pacífica no sentido de a omissão no dever de prestar contas constituir grave irregularidade. Aliás, a omissão no dever de prestar contas ocorre em razão da violação de dispositivos explícitos dos ajustes, bem como da sua legislação de regência (Constituição Federal, Decreto 93.872, instruções normativas e portarias) .

Ou seja, a omissão revela um comportamento com grave inobservância do dever de cuidado, caracterizando culpa grave. Essa conduta omissiva é considerada erro grosseiro, portanto, passível de aplicação de penalidade (v.g. Acórdãos 6.257/2021-TCU-Primeira Câmara, 1.703/2021-TCU-Segunda Câmara e 5.245/2020-TCU-Primeira Câmara) .

Além disso, saliento que, de acordo com vasta jurisprudência desta Corte, para se concluir pela regular aplicação de recursos públicos transferidos por meio de convênio ou instrumentos congêneres, não basta a comprovação da execução do objeto do convênio, mas também é preciso fazer prova do nexo de causalidade entre os valores repassados e as despesas incorridas. Cito alguns acórdãos:

“A comprovação da boa e regular aplicação de recursos públicos transferidos mediante convênio e outros instrumentos congêneres evidencia-se mediante a execução física e a execução financeira da avença, acompanhada do nexo de causalidade entre uma e outra. A transferência de recursos da conta específica do convênio para outra conta ou a emissão de cheques nominais à própria entidade ou a outrem, que não seja o fornecedor do bem ou serviço, impede o estabelecimento do necessário nexo entre os recursos repassados e o objeto avençado.” (Acórdão 597/2019-TCU-Segunda Câmara)

“A prestação de contas deve demonstrar não só a execução do objeto pactuado no convênio, mas também o nexo de causalidade, por meio do vínculo estrito entre os recursos federais repassados e as despesas incorridas para a consecução do objeto conveniado, sem o que não há comprovação da boa e regular aplicação dos recursos públicos.” (Acórdão 997/2015-TCU-Plenário)

Destarte, cabe ao gestor, além da demonstração do fiel cumprimento do objeto pactuado (execução física) , demonstrar o regular emprego dos recursos públicos na execução desse objeto (execução financeira) , em especial o nexo causal entre a execução e os documentos de despesa apresentados pelo gestor dos recursos, o que não se verifica nos documentos apresentados pelo recorrente.

Consequentemente, a ausência do nexo de causalidade entre as despesas efetuadas e o objeto pactuado por conta de recursos de convênio e outros instrumentos congêneres importam na irregularidade das contas do gestor responsável.

Cumpre lembrar que é pacífico no âmbito deste Tribunal o entendimento de que, em processos de prestação ou tomada de contas, ainda que especial, o ônus da prova do regular emprego das verbas públicas é imputado ao responsável pela utilização dos valores repassados pela União, à luz do disposto no art. 70, parágrafo único, da Constituição Federal e do art. 93 do Decreto-lei 200/1967. Assim, a não comprovação dessa obrigação pelo gestor é suficiente para que se conclua pela ocorrência de prejuízo ao erário.

Ademais, a responsabilidade pela comprovação da boa e regular aplicação dos recursos públicos é pessoal do gestor, de modo que eventuais dificuldades na obtenção dos documentos, incluindo as derivadas de ordem política, se não resolvidas administrativamente, devem ser levadas ao conhecimento do Poder Judiciário por meio de ação própria. É nesse sentido a jurisprudência deste TCU, como se observa nos Acórdãos 21/2002, 3.357/2016 e 1838/2019, da Primeira Câmara; 115/2007 e 437/2008, da Segunda Câmara; e 1.322/2007, do Plenário.

Por fim, no que tange à questão da prescrição do débito, entendo que a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) no Recurso Extraordinário 636.886/AL deverá ensejar a revisão da jurisprudência deste Tribunal.

Todavia, há que se reconhecer que ainda não é possível a imediata aplicação da nova decisão da Suprema Corte com o mínimo de segurança. Com efeito, ainda existem lacunas acerca de questões essenciais, como o prazo prescricional, o início da contagem e as hipóteses de interrupção. Ademais, não está claro quais serão os processos efetivamente alcançados pela modificação do entendimento, visto que ainda estão pendentes de julgamento os embargos de declaração opostos para requerer, inclusive, a modulação temporal dos efeitos.

Dessa forma, por enquanto, tenho me curvado à compreensão dos meus pares pela manutenção do entendimento consolidado pelo TCU e pelo próprio STF no sentido de considerar imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário.

Quanto à pretensão punitiva do Tribunal, à luz do parâmetro delineado pelo Acórdão 1441/2016-TCU-Plenário, a sanção administrativa a ser aplicada ao responsável não estaria prejudicada pelo manto prescricional, uma vez que a ocorrência desencadeadora da presente tomada de contas especial foi a não comprovação da execução física da Meta 1 do objeto do convênio, se consumou em 31/1/2012, com o encerramento do prazo para a prestação de contas, e o ato que ordenou a citação ocorreu em 2/8/2019 (peça 195) .

Portanto, o lapso de tempo entre a irregularidade e o ato que interrompeu o prazo prescricional é inferior ao decêndio considerado no referido decisum.

Sendo assim, ante a ausência de elementos capazes de alterar o juízo anteriormente formulado, não é possível reformar o julgado, como pretende o recorrente.

Feitas essas considerações, entendo que se deve conhecer e negar provimento ao recurso, mantendo-se inalterada a deliberação ora combatida.

Ante o exposto, voto por que o Tribunal adote o Acórdão que ora submeto à deliberação deste Colegiado.

TCU, Sala das Sessões Ministro Luciano Brandão Alves de Souza, em 22 de junho de 2021.

Ministro BRUNO DANTAS

Relator

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