Abusos contribuem para sumiços

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Na Paraíba, o número de desaparecimentos de pessoas — considerando crianças, jovens, adultos e idosos — cresceu 20% no ano passado: de acordo com o Ministério da Justiça e da Segurança Pública (MJSP), foram registrados 658 casos, entre janeiro e setembro de 2024, contra 526 contabilizados em 2023. Para enfrentar esse cenário, o estado conta com o Programa de Localização e Identificação de Pessoas Desaparecidas (Plid), coordenado pelo Ministério Público, que cruza dados com um banco nacional para auxiliar nas buscas. Há também o Núcleo Estadual de Enfrentamento do Tráfico e Desaparecimento de Pessoas (NetDP) e o Comitê Estadual de Enfrentamento do Tráfico e Desaparecimento de Pessoas (CetDP), vinculados à Secretaria do Desenvolvimento Humano (Sedh), que atuam na prevenção, na repressão e no combate a casos dessa natureza, buscando fortalecer a rede de proteção e prover uma resposta mais eficaz às ocorrências.

Segundo Mirella Braga, coordenadora do NetDP, em situações de desaparecimento, é indicado que a denúncia seja realizada o quanto antes, por meio de um boletim de ocorrência (B.O.), em uma delegacia da Polícia Civil. “Quanto antes, melhor, pois isso possibilita a busca imediata pela pessoa desaparecida”. A agilidade é ainda mais relevante para paradeiros de crianças e idosos.

Na avaliação de Mirella, o desaparecimento de pessoas acima de 60 anos, a propósito, constitui uma realidade preocupante, agravada por fatores como isolamento e saúde debilitada — cenário que as torna tanto carentes de cuidados especiais como suscetíveis a violações de direitos. “A discriminação etária, somada ao isolamento social, dificulta o acesso a recursos e à proteção contra abusos. Além disso, a fragilidade física e mental os coloca em uma posição de maior vulnerabilidade”, descreve Mirella, chamando atenção para o que deve ser feito para assegurar a integridade e o bem-estar dessa população, contribuindo para reduzir os casos de desaparecimento.

“É essencial que existam políticas públicas eficazes, com o cumprimento do Estatuto do Idoso, além da criação e do fortalecimento de serviços de apoio para essas pessoas”, afirma a coordenadora do NetDP, destacando também a importância de campanhas de conscientização e estímulo à denúncia de abusos. “Os canais formais, como o Disque 100 (nacional) e o Disque 155 (estadual), são fundamentais para que casos de violência e desaparecimento sejam investigados e os idosos recebam a devida proteção”. Além disso, fomentar a socialização auxilia no combate ao isolamento, um dos aspectos mais influentes sobre desaparecimentos. “Desenvolver programas comunitários que incentivem a interação social, com grupos de convivência e atividades culturais e esportivas adaptadas, ajuda a garantir que o idoso tenha uma rede de apoio e uma vida mais ativa”, conclui Mirella.

 

DPU registrou 254 casos de abandono e negligência em 2024

Quando se trata da proteção dos direitos das pessoas idosas, o Núcleo de Atendimento ao Idoso da Defensoria Pública da União (DPU) na Paraíba desempenha um papel fundamental, atuando na orientação jurídica, no acompanhamento de denúncias e na mediação de conflitos familiares envolvendo essa população, além de trabalhar em parceria com Centros de Referência da Assistência Social (Cras), Centros de Referência Especializados de Assistência Social (Creas) e Instituições de Longa Permanência para Idosos (Ilpis).

Segundo as defensoras Rosalba Cavalcanti e Conceição Arcoverde — respectivamente, coordenadora e subcoordenadora do núcleo —, as denúncias têm crescido significativamente no estado, sendo que, em 2024, foram registrados 254 atendimentos voltados a casos de abandono e negligência, crimes previstos no Estatuto do Idoso que podem levar a penalidades civis, administrativas e criminais. “Isso evidencia a necessidade de fortalecer a rede de proteção dessa população”, ressaltam as representantes do órgão, que pode acionar a Justiça para protocolar, por exemplo, ações contra maus-tratos e até solicitações de curatela, visando nomear um responsável para administrar os interesses de um idoso, em situação vulnerável, que não possua representante legal.

Contando com uma equipe multidisciplinar, incluindo assistentes sociais, psicólogos e assessores jurídicos, o Núcleo de Atendimento ao Idoso da DPU busca, dessa forma, “assegurar que o idoso tenha seus direitos garantidos, independentemente de sua condição de saúde ou da presença de familiares”, conforme definem Rosalba e Conceição. “A atuação da Defensoria Pública é essencial para garantir que os idosos tenham seus direitos preservados, promovendo uma vida digna e segura para essa parcela da população”, finalizam as representantes da DPU.

 

Transtorno neurodegenerativo exige acompanhamento intenso

Uma das condições de saúde mais preocupantes a afetarem os idosos, expondo-os a maiores riscos de abandono, abuso e desaparecimento, é a demência, transtorno neurodegenerativo que compromete progressivamente as funções cognitivas do paciente. Para esclarecer o que caracteriza a doença, suas consequências e as formas de cuidado para amenizar seus efeitos, o Jornal A União conversou com a médica geriatra Eveline Barros.

De acordo com a especialista, a demência atinge a memória, o raciocínio e a capacidade de realizar tarefas diárias, minimizando a autonomia do paciente. Geralmente, esse distúrbio manifesta-se depois dos 60 anos de idade e pode apresentar diferentes causas, sendo o mal de Alzheimer a mais comum. “Outras origens incluem vasculopatia cerebral [condição que afeta os vasos sanguíneos do cérebro], demência frontotemporal [morte de células nervosas nos lobos frontal e temporal] e corpos de Lewy [aglomerados anormais de proteína que comprometem os neurônios]”, salienta a geriatra.

É comum que os sintomas da demência sejam confundidos com sinais naturais de envelhecimento fisiológico, mas Eveline aponta as diferenças: no caso deste último, podem ocorrer dificuldades pontuais no aprendizado e lapsos leves de esquecimento, mas sem prejuízo significativo para as tarefas do dia a dia; já a doença neurodegenerativa é marcada pela perda gradativa da funcionalidade do idoso, tornando-o cada vez mais dependente.

Atenção aos indícios

A médica alerta que os familiares de pessoas idosas devem estar atentos a falhas de memória frequentes por parte delas, especialmente quanto a fatos recentes. A repetição constante de perguntas ou de relatos também pode ser um indicativo de demência. “Caso esses sintomas se agravem ao longo dos meses, é essencial buscar avaliação médica”, enfatiza Eveline.

Ela lembra que o problema é caracterizado por etapas de progressão: em estágios iniciais, o paciente pode precisar de monitoramento para evitar riscos ao dirigir ou prejuízos financeiros; na fase moderada, surgem dificuldades para a execução de atividades simples, como abotoar uma camisa; e, na fase avançada, a dependência é total, abrangendo alimentação, higiene pessoal e até as capacidades de locomoção e comunicação. Por isso, pessoas com demência correm riscos de sofrer acidentes domésticos e perder-se ao sair de casa sozinhas. “É fundamental que elas tenham acompanhamento constante e, em estágios mais avançados, um cuidador especializado”, orienta a geriatra.

*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 09 de março de 2025.

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A União

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