Das páginas para a tela

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As aproximações do cineasta paraibano Marcus Vilar com a literatura são frequentes. Ele acalenta há alguns anos mais um projeto, que também adapta um texto literário: Rita no Pomar. Hoje o realizador apresenta e discute o roteiro não filmado da obra na Mostra Cine Prosa, promovida pelo Ministério da Cultura (MinC) e pelo Centro Cultural Banco do Nordeste (CCBNB), com apoio da Empresa Paraibana de Comunicação (EPC), no Campus 1 da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), na capital, às 17h. Em seguida, o evento gratuito exibirá filmes, entre eles a cópia restaurada de A Hora da Estrela (1985).

A mesa “Cinema e romance: a roteirização de Rita no Pomar” trará, além de Marcus, o roteirista Vinícius Rodrigues e a pesquisadora Allyne de Oliveira Andrade, que ficará encarregada da mediação. A adaptação parte do livro de Rinaldo de Fernandes, maranhense radicado da Paraíba. Ele também acompanha de perto a iniciativa de Marcus e Vinícius.

“Quando li o livro pela primeira vez, eu via todas as imagens na minha frente. É uma narrativa de fluxo contínuo, e isso me fascina muito”, afirma o diretor.

“São obras independentes. Se eu assistir a um filme sem ter lido o livro de origem, a obra audiovisual tem de falar por si mesma”
– Marcus Vilar

Comentando sobre o início da empreitada, Marcus relembra que o roteiro começou a ser escrito por volta de 2010. “Depois de pronto, passamos a submetê-lo a editais de fomento. ‘Batemos na trave’ em um deles, promovido pelo MinC há alguns anos: de 700 projetos, ficamos entre os 20, mas havia apenas 15 vagas”, rememora.

No ano de 2023, em nova tentativa, o projeto foi aprovado e autorizado para captar recursos. No encontro desta quinta-feira, todo esse processo, da ideia à seleção em edital, será discutido junto ao público.

A obra de Rinaldo é ambientada na Praia do Pomar, no município de Conde: a personagem principal se muda com seu cachorro para esse local, por uma razão que é mantida em segredo até o fim. Ela passa a conversar com frequência com o seu pet, que se torna seu único confidente no novo lar.

“Tanto no livro quanto no filme, a gente brinca com a passagem do tempo, com isso de voltar ao passado dela, em São Paulo. Isso, inclusive, torna a produção mais complicada”, asseverou. 

Ao longo da sua carreira no cinema, Marcus já participou de outros debates sobre seus filmes — mas, em todas as ocasiões, eles já estavam prontos. Essa será a primeira vez que o realizador conversará com o público sobre um projeto que ainda não saiu do papel.

“Vai ser meio inusitado, mas é instigante. Vai ser necessário nos articularmos para defendermos nossas ideias para esse longa. Ficamos mais tranquilos porque Rinaldo, o autor do livro, gostou muito do que fizemos no roteiro”, aponta.  

Todos os curtas-metragens de ficção dirigidos por Marcus se baseiam em obras literárias: o premiado A Canga (2001) é baseado em livro de W.J. Solha; A Árvore da Miséria (1997), adaptação de um conto popular; O Meio do Mundo (2005), baseado em texto do sergipano Antônio Carlos Viana.

“Tem gente que assiste a uma adaptação e diz: ‘Ah, gosto mais do texto literário’. Isso para mim não existe, são obras individuais, cada uma é independente. Se eu assistir a um filme sem ter lido o livro de origem, a obra audiovisual tem de falar por si mesma”, declara.

O diretor avalia que a literatura paraibana é rica em obras que podem ser adaptadas para as grandes telas. Ele mesmo tem um novo projeto para transpor outro livro, que mantém, por ora, em segredo. Mas revela que já tem pronta, há anos, uma nova incursão em A Canga, mas desta vez para um longa-metragem.

“Novamente, esse roteiro foi escrito por Solha, a partir da integridade do livro. O texto dele é um soco no estômago, mas, da primeira vez, trouxemos apenas uma parte”, finaliza.

 Macabéa em 4K

Três filmes serão exibidos no Cine Prosa após o debate com Marcus e sua equipe: Redemunho, dirigido por Marcélia Cartaxo; Adão, Eva e o Fruto Proibido, de R. B. Lima; e A Hora da Estrela, realizado por Suzana Amaral — este numa cópia restaurada em resolução 4K que esteve em cartaz em João Pessoa no Cine Bangüê.

Redemunho estreou em 2016: os atores Daniel Porpino e Eleonora Montenegro interpretam os sobreviventes de uma família marcada por tristezas. Ele, um homem amargurado após a partida da esposa; ela, uma mãe que não consegue dar vazão ao luto.

Adão, Eva e o Fruto Proibido, de R. B. Lima, também um curta-metragem, é o quinto capítulo de uma saga do Projeto Ashley de la Veiga, desenvolvido pelo diretor. Nesse longa, a protagonista, vivida por Danny Barbosa, é uma mulher trans que tenta se reconectar com o filho, de quem se distanciou há mais de uma década. Ao passo que ela tenta se encontrar no papel de mãe, o filho busca um laço forte com alguém que não conhece. 

Fotos: Divlgação

A Hora da Estrela, título famoso da filmografia brasileira, estreou renovado nos cinemas em 2024, a partir do trabalho da pesquisadora Débora Butruce. Com 23 anos de experiência no cinema, ela tem atuado no resgate de filmes brasileiros desde 2006.

“Um restauro recente que vale a pena citar foi o de Rainha Diaba, dirigido por Antônio Carlos da Fontoura em 1974. Teve bastante repercussão. Ficamos entre as 10 melhores restaurações do mundo em 2023, de acordo com a revista Film Comment”, relembra.

A fonte utilizada para esse processo de renovação foram os negativos originais do filme, preservados pela Cinemateca Brasileira, mas foi necessário comparar esses itens com outros 40 rolos de filmes positivos (utilizados em salas de projeção).

“É sempre importante termos uma referência base para a cor. Por isso, também lançamos mão de cópia original da época, preservada pelo Centro Técnico Audiovisual do Rio de Janeiro (CTAv). Precisávamos verificar qual seria o melhor resultado a partir do escaneamento do celuloide”, detalha. 

Depois dos processos citados — os mais trabalhosos, segundo a restauradora —, as demais etapas seguiram tranquilas, com o apoio de laboratórios que conheciam a importância do título. Segundo Débora, toda a potencialidade estética, artística e histórica do longa de Suzana Amaral foi resgatada.

“Fiquei muito feliz com o resultado. Além disso, o filme fez muito sucesso nas salas de cinema durante 2024. Percebemos também novas gerações indo assistir A Hora da Estrela. Esses projetos causam certa comoção e impulsionam o público a ir pela primeira vez ou mais uma vez prestigiar a obra”, conclui.   

PROGRAMAÇÃO HOJE E AMANHÃ

HOJE
17h – Debate: “Cinema e romance: a roteirização de Rita no Pomar”, de Rinaldo Fernandes, com o cineasta Marcus Vilar e o educador e roteirista Vinícius Rodrigues.
18h30 – Exibições: Redemunho (2016), de Marcélia Cartaxo; Adão, Eva e o Fruto Proibido (2021, 20 min), de R. B. Lima; A Hora da Estrela (1985, 1h36), de Suzana Amaral.

AMANHÃ
17h – Debate: “Cinema e quadrinhos: o processo criativo de adaptação de Carniça, de Shiko, para cinema”, com a cineasta Renata Pinheiro e o quadrinista Shiko.
18h30 – Exibições: Lavagem (2011, 20 min), de Shiko; O Azul Indiferente do Céu (em finalização), de Carlos Dowling; Onde Borges Tudo Vê (2012, 1h17), de Taciano Valério.

– Entrada franca
– No Cine Aruanda (CCTA, Campus 1, UFPB, Castelo Branco, João Pessoa)

*Matéria publicada originalmente na edição impressa do dia 19 de dezembro de 2024.

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A União

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