Mãe trancista cria projeto no Rio para exaltar a ancestralidade e a beleza negra


Com a maternidade, Edneia Roma deixou o alisamento para trás e, desde cedo, ajudou a filha, de 11 anos, a enxergar a própria beleza. Em 2023, ela decidiu levar a arte da trança, de graça, a outras meninas negras. Trancista leva iniciativa a colégio municipal do Rio que exalta a ancestralidade e a beleza negra
Um dos símbolos do Dia Nacional da Consciência Negra inspirou um projeto no rio que exalta a ancestralidade e a beleza negra.
Uma arte ancestral que exige delicadeza, paciência. Às vezes, é feita a muitas mãos e, quase sempre, mãos femininas, como as da trancista Edneia Roma, que aprendeu a trançar aos 13 anos. Mesmo assim, ela alisou o próprio cabelo por muito tempo.
“Eu queria entrar num padrão. A questão do meu cabelo é que eu tinha que me igualar às minhas amigas. O problema não é o relaxar o cabelo, o alisar o cabelo. É você não se identificar. É você querer matar a sua origem”, define.
Na relação com o próprio cabelo, marcas do racismo vivido na infância e que seguem na memória de Neia:
“Quando eu cheguei na escola, nossa, acabaram comigo. Me chamaram de ‘feia’, ‘cabelo duro’’”, relembra.
Mas a chegada de Evellyn mudou muita coisa, inclusive no visual de Neia, que deixou o alisamento para trás e, desde cedo, ajudou a filha a enxergar a própria beleza. Aos 11 anos, Evellyn Roma sempre usou tranças.
“Para mim, eu sou a menina mais bonita desse mundo”, diz.
Edneia e a filha
Reprodução/TV Globo
Depois de participar de um evento pelo Dia da Consciência Negra da escola de Evellyn, em 2023, Neia teve uma ideia. Ela decidiu levar a arte da trança, de graça, a outras meninas negras, assim como a filha dela.
Inicialmente, ela planejava fazer penteados nas alunas de uma turma da escola municipal em Sepetiba, na Zona Oeste do Rio, mas o projeto cresceu e, com a ajuda de outras duas trancistas, se espalhou pela escola inteira.
Vitória Moraes Peixoto, de 11 anos: Agora, perdi um pouco da vergonha, mas eu tinha muita vergonha de os outros ficarem me zoando, falarem que meu cabelo é muito feio, muito cheio.
Repórter: E, agora, você diz o que para eles se eles disserem isso para você?
Vitória: Eu nem ligo, eu ignoro, porque eu sei que meu cabelo é lindo.
Trancista leva iniciativa a colégio municipal do Rio que exalta a ancestralidade e a beleza negra
Reprodução/TV Globo
A iniciativa ganhou o nome “Somos Todas Dandara” – uma homenagem à líder do Quilombo dos Palmares, um dos maiores centros de resistência de negros escravizados no período colonial brasileiro. Dandara e o marido Zumbi dos Palmares são celebrados nesta quarta-feira (20), no Dia Nacional da Consciência Negra.
“Vejo uma mudança absurda. É o reconhecimento como pessoas pretas que elas são. Quando uma criança ou outra pessoa vai falar: ‘Ah, você é preta’. Ela: ‘Sim! Eu sou preta, com muito orgulho’”, diz a coordenadora pedagógica Evellyn Boaventura.
Ancestralidade e legado: palavras que caminham juntas.
“Agora as meninas tão se sentindo mais, elas tão se vendo de outra forma. Não estão se sentindo: ‘Nossa, meu cabelo é duro’. Não, o cabelo dela é cacheado, crespo”, diz a filha de Neia, Evellyn.
Trancista leva iniciativa a colégio municipal do Rio que exalta a ancestralidade e a beleza negra
Reprodução/TV Globo
Neia: Às vezes, uma palavra que me falavam antigamente, eu achava que ia ser para a vida. Se hoje eu pudesse voltar e falar: ‘Não é para a vida não, Neia!’. E eu falo para ela: não tem medo, não!
Repórter: Dá orgulho ser filha dela?
Evellyn: Muito!
Neia: Para, que a gente está na TV! (risos)
Trancista leva iniciativa a colégio municipal do Rio que exalta a ancestralidade e a beleza negra
Reprodução/TV Globo
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